A biruta doida e a bússola descontrolada

    (*) Marli Gonçalves –

    De que lado vem, e vai, vem vindo, o vento? Do Sudeste, uma boa lambida e o dedinho indicador para cima, voltadinho para o vento, tenta identificar, procurar o Norte. Ou melhor será o Sul? A luz se apagou no Nordeste, mas isso talvez ilumine uma verdade. No Centro-Oeste, o abrigo de soluções, com maracutaias e segredos, lado a lado dos profetas de templos futuristas. Mais parece uma biruta.

    Biruta, sim. Aquele negocinho com a forma de um coador de café, que indica o vento. Biruta que virou palavra-emoção e serve também para definir como acabamos chacoalhados por tanta informação circulando e tão pouco tempo para processá-la. Saudade daqueles galos do tempo, em cima dos telhados. Girando, girando. Davam um ar rural, como quando ainda conseguíamos ouvir os sinos das igrejas, as badaladas precisas. Badaladas também é palavra, mas palavra-ação. E tem sido bem usada, ou melhor, puxada, em sacos.

    Nariz para cima, sentidos aguçados, farejamos o ar em busca de respostas, de perguntas, inspirações, ideias que não tenham ainda sido usadas. Ou aproveitamos a posição para lançar o esperançoso olhar para o céu de todas as religiões. Alguém estará lá no infinito olhando mesmo tudo isso?

    Se a gente desenhar, é capaz de ser acusado de plágio da realidade pelos bonequinhos animados que estão de plantão no playground do Condomínio Brasil. Agora, sob nova direção. Dizem que a síndica é linha-dura. Pegue-os todos, escolha os bonequinhos que você acompanha até porque não tem outro jeito, e leve para sua imaginação, vendo-os como peças de
    PlayMobil.

    Pegou seu punhado deles? Agora sente no chão, espalhe-os como fazia quando era criança. Ah! Olha! Soltou o bigodinho de três deles e uma toguinha! Reponha no lugar para não perder nenhum detalhe. Pode trocar a peruca acaju pela negraasasdagraúna daquele ali que está fazendo um esforço danado, um sacrifício pessoal por você, para continuar em cena. Mandando até na luz.

    Arrume-os ou jogue-os de novo – mesmo só que mentalmente, é uma delícia esse pequeno exercício vingativo. Repare que é melhor do que embaralhar cartas. Onde quer que eles caiam, esses espertos bonequinhos encontram seus pares, combinam entre si, negociam termos, formam trincas, quadras, quadrilhas e quinas. As roupinhas de cores partidárias também são trocáveis. Cada um desfila na escola de samba do outro. O vermelho, no azul e amarelo, o preto e vermelho com verde, tucano eu misturo com estrela, com árvores, com peixinho, e o meu samba vai sair assim… Os opostos se atraem.

    Cansou desses? Pegue outros. Que tal alguns da tevê, misturados com “criadores geniais” de propagandas e ações de marketing, mais dois ou três jornalistas e promotores focados em “celebridades”, que agora tudo mudou de nome. Se bobear, vai ver um bando de bonequinhos vestidos de frango, se dirigindo a uns fornos, indo assar; e ainda com gente que paga para ver isso. BBBestas. Se for domingo, perigas brincar de disputar audiência com duas loiras, uma comprida, outra curta, um ex-gordinho que mantém o nome aumentado, um Piu-Piu que trocou de casa, um ex-infeliz proprietário de um banco, abençoado por Deus em suas dívidas.

    Não tenta melhorar o jogo, misturando peças finas. Vai ter de sair caçando pela casa os dez gatos-pingados que já estão quase roucos de alertar para a mesmice e falta de valor, contra a estupidez humana, e contra essa irresistível mania de políticos e governantes acharem que, como eu mesma já disse outro dia, somos todos otários.

    Não há Casa de Alice, Castelo de Barbie, que consiga traduzir certas semanas, tipo mais essa que passou. O setor energético foi rifado e interrompido. Palhaço bota banca de educador. Palavras ao vento abrem sessões, que votam pelos mesmos comandantes. Quem pintou a cara, cara a cara, sorri. Quem desceu a rampa, enxotado, se impõe. Ex-mulher faz ex-marido silenciar, diante da platéia. Senador e deputado marcam encontro em ringue. Para brincar. Eu sei quantos quilos a presidente engordou e o nome de sua costureira. O preso italiano virou osso, disputado raivosamente por vários coiotes. Os outros, presos, formam uma massa só. Fora as múmias. Inclusive as lá do Egito. Que mais?

    Lambo a ponta do indicador, que levanto novamente em busca de saber a direção do vento. Quero voltar-me para esta direção, tentando largar o corpo para ir sendo levada, espero que suavemente, e em busca do que imagino ousar se aproximar das barreiras.

    Procuro a direção. Mas cada vez que me mexo, a danada da bússola mexe-se também.

    E eu fico biruta.

    Fevereiro sem frevo, no eixo, São Paulo de 2011

    (*) Marli Gonçalves é jornalista. Adora se perder. Adora se achar. E ser achada. Aliás, é bom você começar a andar com lupa também. Ajuda a enxergar as letras pequenininhas.

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