Sopas de letrinhas que dizem tudo

    (*) Marli Gonçalves –

    Ufa, vou sentar um pouco para descansar, relaxar, jogar conversa fora. Aliás, conversa, não: letras, letrinhas e letreiros. Siglas, acrônimos, abreviaturas, códigos. Horror dos horrores. Fora as senhas que “nêgo” agora quer, para serem aceitas, que a gente use letras e números, sem repetição, mais de 8. Tudo bem. Sem repetição; até mesmo porque nunca mais a gente lembra qual foi a finalmente aceita pela maquininha.

    QAP. TKS. QRU. Permaneça na escuta. Obrigado. Você tem algo para mim? Quem não fica irritado (ou mesmo curioso) quando passa pelos grandalhões dos seguranças – de caras amarradas e olhar de “esgueia” – e os vê segurando radinhos que fazem bips ardidos com caras de agentes 007 e falando em forma de letrinhas? Será que estão dando alguma ordem para matar? Estarão falando mal de mim? SOS.

    Estamos rodeados delas. Parece conspiração para que nunca mais nos entendamos entre nós, QSL? Pior é que nesta nova avalanche virtual em que vivemos elas se enfronharam de vez em nossas vidas e algumas resolvem se casar com números.

    Cada site quer uma combinação para registro e cada um tem normas próprias. Se for de banco, acrescente-se ITokens e/ou cartões com centenas de mais números.

    Charles, Alfa, Roma, Alfa, Charles, Alfa. Caraca. Esse é um código fonético que usa palavras chave para você soletrar claramente e não confundir alhos com bugalhos ou coisas piores. A gente até faz isso normalmente, mas sem grandes decorebas. Vamos já de O, de Ovo; P, de Pato; M, de Maria e N, de Nair, a coitada que acaba sempre entrando na história, e por aí afora, dependendo da criatividade do indivíduo. Na oficial os caras sofisticam: T, de Tango; P, de Papa; o O é de Oscar. Os pilotos usam muito.

    Já os “Qs” são de um código internacional instituído em 1959, em Genebra, Suíça.

    Agora é tudo sigla ou acrônimo. Sigla é um sinal gráfico, e o mais comum é que seja a primeira letra daquilo que se quer ganhar tempo. Acrônimo é a mesma coisa, mas você fala tudo junto. Entendeu? Tipo PAC (pronuncia-se “páque”). Para nunca ser normal, tem uns que as pessoas usam dos dois jeitos, dependendo de quanto querem parecer melhores. ONGs, por exemplo. Tem uns azedos que falam O, N, G, “oenegê”, enchendo a boca.

    Por sua vez, funcionários públicos adoram uma abreviatura, faltam gozar com elas. Principalmente se forem salariais DA-4, DA-5. Também amam dizer que trabalham nelas, as letras. O cara trabalha no Instituto de Catadores de Pipas nas Ruas e enche o peito: vira ICPR. Temo que os serviços públicos nunca funcionem direito por conta dessas porrinhas, dessas letrinhas. Só os Correios, de códigos postais, se contei direito, tem 161 combinações de duas letras. Algumas, diferentes, mas para designar as mesmas coisas. Tipo Objeto Internacional (EF, EG,EU,EV,EX, CD,CE, algumas delas).

    Já que comecei a reclamar, vou seguir. Já reparou que ninguém mais faz mais “mestrado”? É MBA (pronuncia-se emibiei), sempre dito com cara de importante, esfregado no interlocutor, como quem diz que é mais inteligente. Cada setor de mercado inventa também um monte delas, as palavrículas, e viram todos diferenciados. Tem sigla para falar em rádios amadores. Aliás, tem gírias. “O Botina Branca vai Bater poeira” (O médico vai tomar banho). O Capacete está vendo Caixa de Abelha” (O sogro está vendo televisão). Se alguém te oferecer um Chá de Urubu, aceite. É café. Copiou? (Escutou?)

    Brincando com esse assunto descobri umas coisas bem legais, além de todo esse linguajar. Sabia que tem sites e mais sites de siglas? Tem um, o www.siglas.com.br, onde você pode pesquisar, até para entender do que é que estão falando, e que fica o tempo inteiro variando, mostrando uma sigla a cada segundo!Completíssimo. Andei por locais que a razão desconhece: sites de caminhoneiros (cowboys do asfalto, como se intitulam), sites para pessoas e instituições ligadas à segurança no trabalho (354 diferentes). Uma ZDI, Zona de Defesa Interna.

    Tem siglas de informática, de exportação, de doenças. Siglas de unidades organizacionais (!), de saúde, de educação. Nasceram de alguma forma de tentativas de simplificação? Pior, grande parte delas é apenas só junta algumas com certo significado, ou sem vogais, ou corruptelas, como no caso do TKS (thanks, obrigado).

    Englobando tudo isso, tem mais as siglas partidárias, sindicais e/ou qualquer coisa que não queira exatamente se identificar: PT, PSD, PMDB, PTB, PSDB, PDT, PSTU, UGT, CUT, UNE. OB. Ops, OB não. É marca de absorvente. Maxi, midi, mini.

    OBS: imaginem que lembrei agora de umas férias de julho, do ginásio, da tenra adolescência. Tínhamos, acho que no segundo ano, um professor de Química horrível, carrasco, brucutu. Ele andou se irritando com a classe e não teve dúvidas. Nas férias daquele ano nos obrigou a fazer todas as combinações da Tabela Periódica de Elementos, uma a uma, na mão. Um “cobre”, se é que me entendem. Um a um. Um com cada um de todos os outros, seus números e massas atômicas. O Polônio (Po) com o Mendelévio (Md), o Magnésio (Mg) até dar diarréia, e o Bismuto (Bi) até encontrar com o amigo Laurêncio (Lw). O Rutherfórdio (Rw) com o Promécio (Pm).

    Bullying! O que deve ter tido de gente que, só de vingança, se inspirou e tirou o nome do filho dessas combinações!

    São Paulo, 2011, criptografada, com jargão, em tempos de DNIT

    (*) Marli Gonçalves é jornalista. ASASP (o mais rápido possível), QRV (estarei à sua disposição). A propósito, QSL é Entendido, confirmado. QSL?

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