Semana foi marcada por discurso moralista da Igreja, que ignora o escândalo do Banco Ambrosiano

Papo furado – Considerando o enorme contingente de cidadãos brasileiros esparramados pelo País, do Oiapoque ao Chuí, a semana termina com a pequena participação da sociedade em manifestações contra a corrupção. O movimento, que ganhou as ruas na última quarta-feira, 12 de outubro, aterrissou nos discursos dos religiosos cristãos que falaram aos seus fiéis no dia dedicado à Padroeira do Brasil.

No palavrório do clérigo não faltaram críticas à corrupção e mensagens de incentivo ao combate do maior problema da nação, algo que ganhou força depois da chegada do petista Luiz Inácio da Silva ao poder central, em 2003. Quem puxou a onda de discursos moralistas foi o presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNDBB), dom Raimundo Damasceno, também arcebispo de Aparecida.

A sociedade deve, sim, cobrar ações imediatas para frear a escalada da corrupção, mas a Igreja Católica não pode ser a mola propulsora desse movimento. Não se trata de questionar as doutrinas de uma ou outra religião, muito pelo contrário, mas é preciso manter a coerência inclusive na seara da fé. E a Igreja Católica não é o melhor exemplo de combate à corrupção, a começar pela Santa Sé.

Há décadas sob o controle da Opus Dei, facção ultradireitista do catolicismo, o Vaticano foi alvo, no início da década de 80, de um dos maiores e mais sórdidos escândalos de corrupção da história. Ao chegar ao cargo máximo da Igreja Católica, o cardeal italiano Albino Luciani, o papa João Paulo I, tentou em vão acabar com o fim da corrupção que grassava na Praça São Pedro e envolvia o Banco Ambrosiano. Acabou morto 33 dias após ser escolhido papa. O serviço de comunicação do Vaticano informou que Luciano fora alvo de um infarto, mas a história da Medicina não tem qualquer registro sobre a aparência esverdeada de uma pessoa após ataque cardíaco.

A cadeira papal foi logo ocupada pelo polonês Karol Józef Wojtyła, o papa João Paulo II, que desavisado tentou a mesma empreitada do antecessor. Liquidar as relações criminosas entre o Banco Ambrosiano, a loja maçônica Publicittà Due (P2) e a máfia turca. Inocente, João Paulo II foi alvejado, em plena Praça São Pedro, por tiros disparados pelo turco Mehmet Ali Agca. Na esteira do escândalo do Banco Ambrosiano alguns dos envolvidos acabaram mortos ou se suicidaram.

Deixando de lado a sede da Igreja Católica, o Brasil também não é um bom exemplo de retidão daqueles que foram escolhidos como prepostos de Cristo. Em São Paulo, maior cidade brasileira, padres de diversas igrejas, em especial nas regiões mais nobres, se envolvem de maneira bisonha com fornecedores e prestadores de serviços para casamentos e outras cerimônias religiosas. Recebem desses profissionais propinas de toda ordem, que vão desde dinheiro vivo até um carro novo todos os anos. Longe dos bastidores, esses integrantes da prelazia do Senhor.

Ademais, não se pode esquecer os inúmeros casos de pedofilia cometidos por integrantes do clérigo, sem contar os que não chegam ao conhecimento público por causa do desconhecimento e do medo das vítimas.

Longe de querer colocar em xeque a retidão de Dom Raimundo Damasceno, mas é preciso um olhar mais amplo e abrangente para falar de combate à corrupção e transgressões, algo que o Brasil tanto precisa.