A infâmia como ilegítima defesa

    (*) José Nêumanne Pinto
    (08.08.2012)

    A desqualificação do procurador-geral e de um ministro do Supremo por grupos políticos ligados aos réus do mensalão é uma prática comunista levada entre nós a exagero inusitado

    No contexto da explanação lógica, informativa e lúcida do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, na primeira sessão de julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), houve tal profusão de informações sobre os réus e os delitos de que são acusados que não se deu a devida atenção a uma revelação feita por ele. “Em 30 anos de carreira no Ministério Público Federal, completados no dia 12 de julho último, jamais enfrentei, e acredito que nenhum procurador-geral anterior, nada sequer comparável à onda de ataques grosseiros e mentirosos de caudalosas diatribes e verrinas, arreganhos de toda espécie, por variados meios, por notórios magarefes da honra que não possuem”, reclamou.

    Não foi propriamente uma novidade, pois grande parte das tentativas de desmoralizar o acusador já havia sido reproduzida no território livre da infâmia na rede mundial de computadores e até mesmo em meios de comunicação. Tentou-se misturar o caso do mensalão (Ação Penal 470, uma ova!) com o momentoso propinoduto de Carlinhos Cachoeira. Insinuações aleivosas a respeito da recusa do chefe do Ministério Público Federal (MPF) em acusar o ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) chegaram ao ponto de incluir no noticiário sua mulher, que também é colega de carreira.

    Mas é um absurdo! Pois a acusação contra os réus do escândalo foi feita por seu antecessor, Antônio Fernando de Souza. E ambos foram nomeados e reconduzidos ao posto, um por Lula e o outro por Dilma, não havendo por que acusá-los de vezo oposicionista.

    À véspera do início do julgamento, a revista CartaCapital acusou em reportagem de capa um dos julgadores, o ministro Gilmar Mendes, de ter recebido propina do mensalão dito mineiro, que teria sido a iniciação do operador Marcos Valério Fernandes na prática. As informações foram inseridas no verbete sobre o membro do STF na enciclopédia virtual Wikipedia, cujos editores se recusaram a retirá-las, obrigando a vítima a recorrer aos préstimos da Polícia Federal (PF). Um descalabro!

    O emprego da maledicência como arma de persuasão política foi uma das criações da ditadura comunista de Lenine e Stalin na extinta União Soviética e passou a ser uma arma retórica importante de seus seguidores pelo mundo afora. A tentativa de desqualificar um acusador de ofício e um dignitário da mais alta Corte de um país que se pretende uma democracia como o nosso é de uma ousadia inusitada. Em nosso caso quem difama conta com a impunidade que os figurões da política usufruem e querem manter a qualquer custo. A decisão do STF sobre o esquema de compra de votos terá papel fundamental nisso.