As vítimas no poder

(*) Carlos Brickmann –

carlos_brickmann_11Parece destino – um cruel destino de que nós, brasileiros, não conseguimos livrar-nos. Na ditadura, os especialistas em interrogatório (também conhecidos como “torturadores”) da Escola das Américas, instituição americana com sede no Panamá, vieram ao Brasil ensinar o que sabiam aos militares brasileiros. Os torturados, os mortos, os mutilados fazem parte de seu legado. E que é que fizeram os atuais governantes petistas, também vítimas dos instrutores internacionais?

Fizeram denúncias fortes, duras, muitas delas comprovadas. E, no poder, trouxeram ao Brasil os mercenários da Blackwater, sucessores privados da Escola das Américas. A Blackwater – que hoje, para tentar desvencilhar-se da fama das barbaridades cometidas no Afeganistão e Iraque, mudou de nome para Academi – foi contratada pelo Governo Federal petista para treinar os grupos especiais de Polícia que devem garantir a segurança da Copa. O pessoal da Blackwater, ou Academi – ou United Secret Services International, outro nome que usa – deve ser competente. A dúvida é: em que área reside sua maior competência? A turma da Escola das Américas era também macabramente competentíssima.

A Blackwater, seu antigo nome, mereceu um interessante livro, A ascensão do exército mercenário mais poderoso do mundo, do repórter Jeremy Scahill. No livro aparecem as ligações da Blackwater com a CIA e com a Halliburton, empresa do ramo petrolífero pertencente à família de Dick Cheney, secretário da Defesa e, mais tarde, vice-presidente da República. A Halliburton opera no Brasil.

O nome das coisas

Blackwater, água negra. Halliburton, ouro negro. Petrobras, águas turvas.

Descendo a ladeira 1

Em frente à catedral do Rio, uma receita quase infalível de crise: grupos de invasores de imóveis, despejados de um prédio que haviam ocupado, acamparam cercando as entradas da igreja e obrigando o cardeal-arcebispo do Rio, d. Orani Tempesta, a suspender as comemorações de Páscoa que ali se realizariam. O objetivo dos manifestantes foi atingido: chamar atenção. Mas talvez tenham chamado mais atenção do que gostariam. Boa parte da população do Rio é católica, e prejudicar os festejos de uma das principais datas cristãs soa como provocação que, no mínimo, irá envenenar os ânimos. Talvez não haja revide imediato, mas a irritação se acumula: mexer com coisas terrenas é uma coisa, mexer com o culto a Jesus Cristo, ainda mais no Domingo da Ressurreição, é outra – e perigosa.

Descendo a ladeira 2

Numa só garagem, 34 ônibus incendiados em São Paulo. Por que? Por nada. Os bandidos que vêm destruindo um dos principais meios de transporte da população não dizem por que agem. Talvez não seja errado ligar essa onda de incêndios a ônibus com as notícias de que o Governo pretende colocar dois líderes presos do PCC, Marcola e Barbará, no duro Regime Disciplinar Diferenciado, em que ficariam isolados e seriam obrigados a permanecer na cela pelo menos 22 horas por dia.

O jornalista João Alckmin, que acompanha de perto a crônica policial (e por isso já sofreu dois atentados, sem que ninguém tenha sido preso por eles), faz uma pergunta que embute a própria resposta: por que os bandidos sempre incendeiam ônibus, e nunca vans? Terá isso algo a ver com as informações de que parte substancial das vans de transporte clandestino pertence ao PCC, o Primeiro Comando da Capital, braço mais forte do crime organizado?

Socializando o prejuízo

O caro leitor alguma vez viu pingar em sua conta alguma parcela dos lucros da indústria automobilística, nos tempos em que carros e caminhões, com substanciosos estímulos fiscais, tinham números exuberantes de vendas? Pois é: agora que as vendas caíram, a indústria automobilística está procurando um jeitinho de compartilhar os prejuízos. A proposta é que, durante a crise de vendas, os operários sejam temporariamente licenciados; e o Governo – nome pomposo dado a seu bolso, caro leitor – pague boa parte de seus salários, com verba do seguro-desemprego e do FAT, Fundo de Amparo ao Trabalhador.

E as empresas que investiram pesadamente, acreditando que o mercado cresceria o tempo todo, sem nenhum recuo? Seu rico dinheirinho, caro leitor, ajudará a mantê-las no azul.

Vargas vai…

O PT reclama, diz que o deputado paranaense André Vargas prometeu renunciar, para não desgastar o partido, e não renunciou. E ameaça convocar a Comissão de Ética do partido (existe, claro que existe) para julgá-lo, condená-lo e expulsá-lo. Se a Comissão for convocada, não haverá outro resultado possível, já que Vargas cometeu a maior infração possível à ética partidária: foi apanhado.

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, do PMDB, diz que, renuncie ou não, Vargas será julgado no Conselho de Ética da Casa, onde, com voto aberto, não tem qualquer chance de escapar da cassação de mandato e da perda de direitos políticos por oito anos. Serão duas eleições que não poderá disputar.

…Vargas vem

Como nada tem a perder, André Vargas até agora se recusou a renunciar. Talvez até conte quem lhe prometeu apoio e o deixou sozinho. E se contar tudo?

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.