Cabra marcado para mártir

(*) Ipojuca Pontes –

ipojuca_pontes_15Escrevi recentemente que os comunistas, em suas distintas siglas, se tornaram especialistas na fabricação de falsos mártires (venerados, depois de mortos, como heróis mitológicos “sacrificados” em combate pelo “porvir de um mundo melhor”, sendo alguns, em seguida, vendidos como semideuses pela agitação de uma colossal máquina de propaganda partidária).

No sujo contexto da guerra cultural que os comunistas travam pela ampliação do poder, citava o caso do “Che” Guevara, assassino psicopata que fracassou miseravelmente em tudo em que meteu a mão: na órbita familiar, à frente de ministério e banco, mas especialmente como guerrilheiro, quando, no Congo, em 1965, açoitado por desmoralizante diarreia, fugiu covardemente do acosso dos mercenários do Coronel irlandês Mike Hoare.

Em particular, citava o caso do venezuelano Simon Bolívar, tido como “libertador visionário” e inspirador da revolução bolivariana do século XXI, herói que, segundo o próprio Karl Marx (outro charlatão de marca), não passava de aventureiro vulgar, escroque e contrabandista de armas a serviço do império britânico – um tipo, enfim que, além de covarde e traidor, tinha como objetivo único tornar-se ditador da América do Sul.

Em âmbito nacional, mencionava a figura de João Pedro Teixeira, um “quadro” assalariado do Partido Comunista, incensado como líder e mártir das Ligas Camponesas de Sapé, na Paraíba, no conflituoso início dos anos 1960. À época, João Pedro e outros ativistas das Ligas, segundo Antonio Dantas, um dissidente do PCB na região, eram mantidos pelo ouro da KGB, a partir, sabe-se hoje, de remessas repassadas pelo Serviço de Inteligência da Polícia Comunista Tcheca (STB), braço estratégico de Moscou para manter acesa a “guerra revolucionária”, via Cuba, no Brasil e outros países da América Latina. (De resto, as denúncias de Antonio Dantas sobre a atuação da KGB no Nordeste, confirmadas pela recente divulgação do vasto acervo do Instituto para Estudos dos Regimes Totalitários da República Tcheca, encontram-se à disposição dos interessados, na Internet, em vídeos do YouTube).

Os métodos utilizados por João Pedro Teixeira à frente das Ligas Camponesas de Sapé eram, para dizer o mínimo, brutais. Por exemplo: se o trabalhador rural tinha sua terrinha, dava-se bem com o patrão e não queria saber das Ligas, o ativista glorificado, junto com seus asseclas, para forçá-lo a entrar na associação, enfiava uma canga de bode ou um chocalho de boi no pescoço do indefeso. Em seguida, para desmoralizá-lo publicamente, arrastava-o estrada afora às vistas de sua família e para apupos da horda debochada.

Outro método diabólico, disseminado nos manuais de Mao para dobrar o proprietário rural, consistia em ocupar suas terras, durante meses, pela prática de improvisados “mutirões”. O ativista das Ligas, ao lado de 100 ou 200 liderados, todos de foice em punho, aparecia numa fazendola e dizia ao proprietário que precisava de suas terras, sem remuneração, para colher uma agricultura de subsistência. Muitos fazendeiros, acuados, aceitavam a ocupação; outros não. Daí eclodia o conflito, quase sempre sangrento.

(Um desses conflitos, o da Fazenda Miriri, resultou numa carnificina braba, com a morte de camponeses e policiais, um deles trucidado a golpes de foice pelos invasores).

Hoje, no entanto, de modo sistemático, tais fatos, corriqueiros na guerra rural promovida pelas Ligas Camponesas financiadas pelo comunismo internacional, são todos sonegados pela tendenciosidade interpretativa da camarilha acadêmica, por historiadores engajados e pela incontável legião de comentaristas catequizados pela sanha ideológica marxista.

De minha parte, entendo que João Pedro Teixeira é o caso perfeito da estratégia comunista para fabricar a história segundo seus propósitos de dominação: depois de doutrinado, o “quadro” do PC de Sapé foi conscientemente jogado às feras e transformado em mártir para gáudio dos seus mentores ideológicos.

Para consagrá-lo, foram escritos dezenas de livros, teses universitárias, programas de televisão e até filmes. Um deles, “Cabra Marcado Para Morrer”, do marxista Eduardo Coutinho, obra de pura propaganda, elevou o ativista das Ligas à categoria de pranteado santo. Mas o fato concreto é que o documentário não passava, formalmente, de uma mistura dos filmes posados do primitivo cinema mudo do Recife, feitos por Jota Soares e Gentil Roiz, e das reportagens do Globo Repórter dos anos 70, chupadas canhestramente do telejornalismo da CBS News. De fato, Coutinho não sabia filmar. Os seus filmes de ficção – por exemplo, “ABC do Amor” (episódio) e “Faustão” – foram retumbantes fracassos de público e crítica. Quem duvidar é só checar.

(*) Ipojuca Pontes, ex-secretário nacional da Cultura, é cineasta, destacado documentarista do cinema nacional, jornalista, escritor, cronista e um dos grandes pensadores brasileiros de todos os tempos.