O Brasil não é butim dos vitoriosos

(*) Percival Puggina –

(Foto: Nádia Raupp Meucci)
(Foto: Nádia Raupp Meucci)
Não mesmo! Impeachment não é golpe. Golpe é o que foi aplicado no eleitorado e no patrimônio público. Golpista será toda tentativa de impedir manifestações populares ordeiras em favor do trâmite de um processo de impeachment. Golpes ocorrem fora do ordenamento jurídico. Impeachment, ao contrário, é um procedimento constitucional, demorado e ponderado, regulamentado em lei específica. É um instrumento previsto porque necessário ao presidencialismo.

Tampouco é coisa “da direita”, como alguns com mais preconceitos do que conceitos têm sugerido. Essa afirmação, aliás, é tiro no pé. É acusação maldosa à própria esquerda pois significaria que perdeu o senso moral. O processo de impeachment de que hoje tanto se fala no Brasil tem a ver com crime de responsabilidade, com ações e omissões que lesam o país. Por outro lado, o único processo de impeachment que produziu efeitos no Brasil, embora a renúncia de Collor tenha interrompido sua tramitação, resultou de mobilização promovida pela esquerda, notadamente através da UNE e da CUT. Prefiro crer que ainda exista boa intenção e reta conduta em certos setores da esquerda brasileira. As pessoas conscientes, independentemente de alinhamentos ideológicos, estão estarrecidas com a liberdade de ação concedida aos que transformaram a administração federal direta e indireta em butim dos vencedores.

Não estou exagerando. No período de 2005 a 2014, enquanto a Ação Penal 470 (Mensalão) tramitava e as penas eram impostas aos réus, a pilhagem da Petrobras se mantinha em livre curso, como se nada estivesse acontecendo. E tudo se dava em benefício dos mesmos partidos da base do governo! Descobriu-se, assim, que em muita gente a cobiça supera o medo, seja ela engravatada ou descamisada. Tal é o móvel de boa parte dos crimes cotidianos.

O Dr. Ives Gandra, em recente parecer, mostrou que as condições jurídicas para um processo de impeachment estão dadas. Não é necessário que haja dolo. Basta a culpa. E desta, a dose fornecida é abundante. Ora, se já houve culpa em alta dose, poucas coisas importarão mais ao bem nacional e à probidade dos atos de governo do que a viabilização das condições políticas que decorrem da pressão social, como bem reconheceu o novo presidente da Câmara dos Deputados. Não imagino que afeição partidária possa se sobrepor, nas consciências bem formadas, à boa imagem do país, ao bem nacional e à retidão das condutas. Uma nação que, com justa razão, queixa-se da impunidade geral, não pode endossar o que está acontecendo no Brasil.

(*) Percival Puggina é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de “Crônicas contra o totalitarismo”; “Cuba, a Tragédia da Utopia” e “Pombas e Gaviões”. Integrante do grupo Pensar+ e membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

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