As flores do recesso

(*) Carlos Brickmann –

carlos_brickmann_09É Carnaval, e isso explica muita coisa. O Senado suspendeu os trabalhos no final no dia 11 e volta a funcionar no dia 23 – é o milagre da multiplicação dos dias, comemorando-se o Tríduo Momesco quatro vezes em seguida. O Petrolão aguarda o fim do Carnaval. Os meios de comunicação precisam de notícias. É a hora das Flores do Recesso, notícias que surgem para ocupar tempo e espaço.

Impeachment, por exemplo. Não tem sentido para o PMDB, partido dos três substitutos eventuais de Dilma, porque afastar a presidente antes da metade do mandato exige novas eleições para substituí-la. Não tem sentido para o PSDB, pois tirá-la do cargo pode dar ao PT a aura de vítima “da zelite”. Mas, já que não há notícias, por que políticos profissionais se privariam de aparecer, só porque o que dizem não tem sentido? Então, tome impeachment, como se fosse a sério.

Só que as palavras têm força. E política, mais até que futebol, é uma caixinha de surpresas. Política e palavras exigem responsabilidade. Imaginemos que, em 15 de março, haja grandes manifestações em favor do impeachment. As flores do recesso, frágeis e passageiras por natureza, podem ganhar força e perenidade. Os parlamentares serão prisioneiros de seu próprio discurso, que imaginavam vazio, e da pressão das ruas. É preciso ser estadista para contradizer o próprio passado e, mais ainda, se opor à opinião majoritária. Mas cadê os estadistas? E o PT, como reagirá à possibilidade de perder o poder? Impeachment hoje é só uma palavra. Um sonho, ou pesadelo.

Se passar disso, pesadelo vira sonho. Ou vice-versa.

O silêncio é de ouro

O ministro aposentado Joaquim Barbosa não segue a regra de ouro dos magistrados, de só falar nos autos. Pena: evitaria as brigas por destempero com outros ministros, jornalistas, advogados. Evitaria ataques como o que fez ao ministro aposentado Maurício Correia, sem saber que ele era advogado. E evitaria que tentasse interferir no Governo, como agora, exigindo que Dilma demita o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

Este colunista acha que qualquer Governo fica melhor sem Cardozo, mas daí a permitir que um magistrado aposentado (e sem votos) queira mandar na presidente eleita há muita diferença. E, pior, depois de tantos meses de silêncio desde a aposentadoria, nem crise ele consegue gerar.

Cadê os brasileiros?

Um dos maiores escândalos financeiros internacionais de todos os tempos, a ajuda do braço suíço do HSBC a cerca de cem mil correntistas interessados em fugir do Fisco de seus países, tem muito a ver com o Brasil: segundo o banco, são quase nove mil brasileiros que ocultaram algo como US$ 7 bilhões em contas secretas na Suíça. No entanto, embora a lista completa seja conhecida de pelo menos um jornalista brasileiro, só dois nomes foram citados até agora: o de Pedro Barusco, aquele gerente da Petrobras que fez delação premiada e prometeu devolver US$ 97 milhões recebidos como propina (foi ele mesmo quem se incluiu na lista, em confissão ao Ministério Público); e o falecido banqueiro Edmond Safra.

É estranho: Edmond Safra era dono do Republic, que vendeu ao HSBC, e não faria sentido recorrer aos compradores, já que era dono também de outros bancos internacionais. Mas, estando morto há mais de 15 anos, sem poder defender-se, é fácil atacá-lo. E os outros? A ICIJ, Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, que levantou o caso, só liberou a lista para um repórter. Por que só para um? Considerando-se que entre os envolvidos estão o rei da Jordânia, Abdullah 2º, David Bowie, Tina Turner, Fernando Alonso, serão os envolvidos brasileiros ainda mais notáveis do que os internacionais?

Cadê a lista?

É Carnaval!

Mais um nome sensacional no propinoduto do Petrolão: nos últimos dez anos, a lendária Rolls-Royce molhou mãos para fornecer turbinas às plataformas marítimas de petróleo. Só Pedro Barusco, que nem diretor era, diz ter recebido US$ 200 mil. A Rolls-Royce pagou, mas disse que não tolera esse tipo de coisa e tomará todas as medidas necessárias para evitá-lo.

Em suma, rigoroso inquérito.

Árvores no chão

Nota publicada nesta coluna revelou que parte da mata nativa, numa área de proteção de mananciais, na Serra da Cantareira, SP (exatamente onde fica a represa da qual depende boa parte do abastecimento de água de São Paulo), estava sendo derrubada. A Secretaria estadual do Meio-Ambiente enviou-nos a seguinte nota: “A área em questão é um empreendimento da empresa Belvedere da Cantareira Ltda., para construção de uma escola, autorizado pela Cetesb (autorização nº 128895/13, alvará 128854/13, processo 158004/11) e pela Prefeitura de Mairiporã (processo nº 164620/13, alvará de construção nº 58/1). O local está inserido em Área de Proteção de Mananciais, mas não é Área de Preservação Permanente, sendo o licenciamento de responsabilidade da Cetesb e da Prefeitura. A autorização é para corte e movimentação numa área de dois hectares, que está sendo obedecida, de acordo com a última verificação pela Polícia Militar Ambiental, feita em 13 de fevereiro.”

Registrado. Mas faz sentido derrubar parte da mata da área de proteção de mananciais, seja para o que for, com autorização de quem quer que seja?

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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