“Crônica na contramão”

(*) Carlos Brickmann –

carlos_brickmann_09Como Chico Buarque não diria desta vez, foi bonita a festa, pá. No país inteiro, centenas de milhares de cidadãos (ou alguns milhões, depende da conta) se manifestaram pacificamente, sem confusão, sem tumulto, contra o Governo.

Contra o Governo? Mais do que isso: contra a corrupção, mais especificamente. No fundo, contra tudo o que está aí – o que inclui os políticos. Corrupção não é só enfiar ilegalmente a mão no pudim; é também locupletar-se legalmente, pegando cada migalha como se fosse a última, esquecendo-se da situação do país. É o aumento desproporcional de salários para deputados, senadores, ministros do Supremo, procuradores, com efeito cascata aumentando despesas em todos os níveis; é a história de carros oficiais à vontade, de dezenas de assessores, de despreocupação com os gastos públicos. É mais um prédio para o Congresso, desta vez até com shopping center; são edifícios suntuosos para tribunais. São Ministérios a perder de vista, com gastos a perder de vista. A falta de vergonha, enfim.

Mas por que o alvo foi Dilma, e não os outros? Dilma encarnou o rosto do Brasil que não queremos. Sua autossuficiência a transformou no símbolo do país que não funciona. Mas tirá-la, mesmo dentro da lei, será um erro: ela, só ela, está na posição de, num gesto de grandeza, chamar os adversários (e alguns aliados, como Lula) e aconselhar-se. Não precisa humilhar-se, desculpar-se, mas precisa corrigir os rumos do Brasil. Tirá-la, seja como for, e considerando-se o apoio incondicional de que ela, Lula e o PT dispõem, perpetuaria uma divisão ruim para o país.

E criaria uma nova mártir cujo escolhido venceria as eleições seguintes.

O diálogo…

É claro que será preciso convencer Dilma de que diálogo não significa que, a qualquer frase que diga, o adversário tenha de responder com um “sim, senhora”.

… e o respeito

Claro, não haverá diálogo nenhum enquanto houver, no comando oficial, seres como os dois ministros que falaram após as manifestações. Um deles, certamente recrutado no bar de Guerra nas Estrelas – 4, depreciou o movimento, porque, a seu ver, só havia ali eleitores de oposição. Óbvio, ricos, brancos, elite, de olhos azuis, coxinhas, empadinhas, esfihas, reaças. Mas não é assim que se dialoga: nem chamando petista de petralha, nem os adversários de fascistas.

E não há alternativa: ou se conversa ou se briga. É bem melhor conversar.

Quem é quem?

De qualquer forma, é bom planejar direito o diálogo. Voltar àquela conversa mole de reforma política e pacote de combate à corrupção, por parte do Governo, é inútil. E a oposição, que é que pretende propor? Qual o projeto do PSDB, exceto cada cacique pensar na melhor maneira de prejudicar seus companheiros?

O fato é que os partidos, de tanto se multiplicarem para aproveitar o dinheiro do Fundo Partidário e o tempo de TV, nada mais representam. Há muito cacique vivendo desses fundos.

É legal; e é por isso que o país chegou a essa confusão.

Numeralha

Milhares de protestos contra os cálculos que negam a presença de mais de um milhão de pessoas na avenida Paulista. Bobagem: não cabe um milhão de pessoas na avenida Paulista. A avenida tem dois quilômetros de extensão por 60 metros de largura. Se não houvesse nenhum obstáculo – entradas de Metrô, o entulho da destruição do canteiro central pelo prefeito Fernando Haddad, bancas de jornais, floreiras, postes – se fosse tudo área livre, caberiam 720 mil pessoas, magrinhas, considerando-se seis por metro quadrado. Seis pessoas por metro quadrado é muito: o máximo tolerável em metrôs lotados.

Como não é tudo área livre, como a aglomeração não era tamanha – tanto que havia carrinhos de bebê, manifestantes com cachorros, carros de som – caberiam no máximo 400 mil pessoas, a quatro por metro quadrado, descontando os obstáculos. É muito! Mas isso não é importante e não vale a briga: importante é saber que a avenida estava coberta de manifestantes, que havia gente pra caramba (esta é uma coluna de família), muito mais que na manifestação da CUT, dois dias antes. O resto é o resto.

O preço do Petrolão

Nota da coluna virtual de Lauro Jardim, de ontem, 17: “De acordo com dados da abertura da Nasdaq de hoje, a Petrobras está valendo 33 bilhões de dólares. Vale somente 12,2% do que valia em 27 de setembro de 2010, quando foi feita a megacapitalização da estatal (…)”

O nome da escorcha

Há um setor em que o PSDB e seus dirigentes são imbatíveis: a escolha de novos termos para substituir aqueles que podem causar má impressão. Os exércitos tucanos, por exemplo, nunca fogem, nem batem em retirada: eles buscam novas posições localizadas aquém das linhas atuais para reorganizar as tropas. Também não se rendem: diante da superioridade numérica e estratégica do inimigo, avançam na direção de seus campos de prisioneiros, onde tomarão novas posições. Falar assim é coisa de tucano.

Diz a agenda do governador paulista Geraldo Alckmin que Sua Excelência “assina decreto que reorganiza as obrigações tributárias no setor (…)”.

É o novo nome para exorbitante aumento de impostos

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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