Rio Doce: lama será monitorada por 120 dias; 8 toneladas de peixes mortos já foram recolhidas

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De acordo com a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que fez um sobrevoo da foz do rio na tarde desta segunda-feira, 23, no município de Linhares, com o governador capixaba Paulo Hartung, o impacto da lama que desceu o Rio Doce e chegou ao mar do norte do Espírito Santo é “muito expressivo” e precisa continuar a ser monitorado “em tempo real”. Ela ainda afirmou que essa é prioridade no momento, e determinou que esse monitoramento continue a ser feito pelas agências do governo por pelo menos mais 90 a 120 dias.

A ministra ressaltou que “o acidente não acabou”. Izabella lembrou que muita lama está retida rio acima, e que a temporada de chuvas está apenas começando, o que significa que muitos sedimentos ainda vão escoar para o mar. “Só quando terminar o período de chuvas eu poderei ter uma avaliação concreta do fim do acidente e das medidas efetivas que precisam ser tomadas, além das emergenciais, para a restauração do Rio Doce”, declarou.

Próximo ao epicentro do desastre, em Minas Gerais, projeções iniciais baseadas em imagens de satélite indicam que mais de 900 hectares de terra foram diretamente impactos pela enxurrada de lama causada pelos rompimentos das barragens da mineradora Samarco (que pertence às gigantes Vale e BHP) em Mariana, no início deste mês. O desastre deixou 8 mortos já identificados e ainda há 11 pessoas desaparecidas. “A emergência ainda está em curso”, reforçou Hartung.

Outra prioridade indicada pelas autoridades foi a de aumentar os esforços de levar informações sobre o acidente às populações ribeirinhas, especialmente relacionadas à qualidade da água – que, conforme as análises iniciais, não é tóxica. “Tem muita gente afobada, muito desencontro de informações”, afirmou a ministra. “As pessoas estão nervosas, estão inquietas estão abaladas; e têm que estar abaladas mesmo, porque o acidente é grave”, continuou.

A onda de lama percorreu quase que toda a extensão do Rio Doce até chegar ao mar, formando uma grande mancha de água marrom no oceano. A previsão feita por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ) na semana passada era de que a mancha de lama mais grossa impactaria uma área de 9 quilômetros de costa – incluindo parte da Reserva Biológica de Comboios, que protege uma praia usada para desova de tartarugas marinhas ameaçadas de extinção.

“Infelizmente não há nada mais que se possa fazer aqui para impedir a lama de chegar no mar”, disse ao Estado o chefe da reserva biológica, Antônio de Pádua Almeida. “Mas rio acima, sim”, completou ele, chamando atenção para a necessidade de reduzir a quantidade de lama acumulada nas cabeceiras, para que elas não sejam arrastadas pelas chuvas para o oceano.

Até esta segunda-feira, não havia sido detectada nenhuma tartaruga diretamente afetada pela lama, mas a praia está sendo monitorada todas as noites pelo projeto Tamar para realocar os ovos que são depositados ali para outros locais. Uma análise visual da praia indicava que a lama não estava “grudando” na areia, mas que os sedimentos mais finos estão se acumulando alguns centímetros abaixo da superfície.

Com base no que viu durante o sobrevoo, Izabella disse que a projeção de dispersão da lama no mar por enquanto está correta, com a mancha mais espessa concentrada em uma área de aproximadamente 10 quilômetros ao longo da costa e avançando 1,5 km mar adentro. Havia relatos de extensões maiores, mas que, segundo ela, referem-se a uma pluma de sedimentos mais finos, que tendem a se dispersar mais superficialmente e não são a preocupação principal.

“O monitoramento está sendo feito; se vai ampliar a mancha, nós vamos saber”, garantiu a ministra, repetindo que não há previsão de que os sedimentos chegarão ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no sul da Bahia. A dispersão dos sedimentos é diretamente afetada pelos ventos, que empurram as massas de água para uma ou outra direção.

Novos dados de monitoramento levantados pela Agência Nacional de Águas (ANA) foram enviados à UFRJ para que o modelo de previsão possa ser atualizado. Segundo o governador Hartung, é preciso “mais ciência e menos achismo” na resposta ao desastre.

Vale ressaltar que ao longo da calha principal do Rio Doce, peixes mortos continuam a aparecer, principalmente nos trechos mais próximos a Minas Gerais, que foram impactados há mais tempo. Cerca de 8 toneladas de peixes mortos já foram recolhidas.

De Colatina para baixo, próximo à foz do Rio Doce, ainda não havia mortandade generalizada, porém pesquisadores acreditam ser apenas uma questão de tempo para que isso ocorra, pois a concentração de sedimentos na água é tão grande que “entope” as brânquias dos animais, além de exterminar o plâncton, crustáceos e outros organismos dos quais eles se alimentam.

O pesquisador José Augusto Senhorini, do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Peixes Continentais (Cepta-ICMBio), disse que pode haver um intervalo de vários dias entre a chegada da lama e a morte dos peixes – que depois de mortos ainda levam dois a três dias para boiar. Os efeitos cumulativos do desastre sobre a fauna aquática do rio, portanto, só poderão ser mensurados com o passar do tempo.

A única boa notícia, por enquanto, é que há um grande reservatório de água na represa de Aimorés, na divisa de Minas Gerais com o Espírito Santo, que não foi contaminado pela lama e está cheio de peixes e, portanto, poderá servir como um reservatório de vida para o repovoamento do rio mais adiante.

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