Temer não percebeu que o Brasil precisa do “Corvo” de Carlos Lacerda, não de um professor de Direito

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Não há duvidas de que acaricia os ouvidos um governante que fala bem e usa todos os recursos gramaticais ao se expressar. Afinal, em tese, todo cidadão tem o dever de falar corretamente o próprio idioma. Mas não é isso que acontece no Brasil, país onde os analfabetos funcionais são uma avalanche.

Quando o presidente interino Michel Temer fez seu primeiro discurso como ocupante do principal gabinete do Palácio do Planalto, sobraram críticas dos adeptos do linguajar bizarro, como se o bom discurso fosse crime. A “mosquita” e o “ensacar vento” deu lugar às mesóclises, tão bem colocadas por Temer, mas pouco utilizadas pelos nascidos nessa barafunda chamada Brasil.

Michel Temer mostra-se bem intencionado, isso já ficou claro, até porque não há outra saída no momento, mas é preciso muito mais ação do que retórica. Antes de falar bem e corretamente, o interino precisa acertar muito mais do que errar. E até agora as confusões têm dado o tom. Por enquanto dois ministros foram apeados dos respectivos cargos porque falaram demais e aquilo que não deveriam.

Longe de um oráculo da Grécia Antiga, o Brasil busca alguém que reverta o caos que se instalou na economia e tenha coragem para encostar a cimitarra no pescoço da corrupção. Até então, Temer disse de forma repetida que ninguém do Executivo interferirá no andamento da Operação Lava-Jato, mas não é isso que acontece nos bastidores do poder, onde sobram conjecturas para esvaziar as investigações que derrubaram o maior esquema de corrupção de todos os tempos.


Luiz Inácio da Silva, o lobista-palestrante Lula, mostrou ser um alarife profissional quando o assunto é corrupção, mas tem a seu favor o fato de saber falar para o povo. Michel Temer, por sua vez, não é um anjo barroco perdido nas plagas terrenas, até porque foi “sócio” do PT no governo durante alguns bons anos, mas precisa deixar a fala eclética de lado e dirigir-se à população de forma clara e didática. O Palácio do Planalto não é a alcova do ladrão da esquina, mas de igual modo não é a tribuna da Academia Brasileira de Letras. Falar “bonito” soa bem, mas não resolve a crise, não acaba com o desemprego e muito menos paga as contas atrasadas de milhões de brasileiros.

Se da interinidade atual à efetividade eventual a distância é de aproximadamente quatro meses, quando espera-se que o Senado decida o destino da presidente afastada, o peemedebista Michel Temer não tem tempo e muito menos espaço para errar. E acertar é a única opção que lhe resta. É verdade que na política muitas vezes o imponderável domina a cena na esteira da surpresa, mas os brasileiros querem não apenas ações propositivas, mas a garantia de que o mal não terá direito a retorno.

De tal modo, fica a sugestão para Michel Temer pensar nos momentos de folga ou enquanto voa entre Brasília e São Paulo. Considerando o cenário de terra arrasada deixado pelo governo afastado, o País precisa muito mais, no momento, do “Corvo” do Carlos Lacerda do que um professor de Direito do Largo São Francisco. Afinal, mar de lama é o que não falta para que o Palácio da Alvorada, refúgio da afastada Dilma, seja cercado, a exemplo do que ocorreu no getulista Palácio do Catete.

Ou seja, que o presidente convoque os meios de comunicação e disseque a herança maldita que recebeu. Do contrário, será visto como coautor da tragédia. Em suma, Michel Temer, mesmo sendo situação, precisa ser oposição.

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