Carne Fraca: se investigados optarem pela delação premiada, alguns políticos não terão o que explicar

Quando as autoridades decidiram investigar as denúncias de adulteração de alimentos no setor de proteína animal, dando início à Operação Carne Fraca, o objetivo era identificar os servidores do Ministério d Agricultura que vinham cobrando propina para não fiscalizar de forma adequada frigoríficos e empresas do setor. O foco inicial era o combate à corrupção, mas com o avanço das investigações descobriu-se crimes contra a saúde pública, algo que o governo prefere negar.

A atuação criminosa de alguns fiscais vem de longo tempo, pelo menos uma década, o que sugere a prática de fraudes nesse período. Tanto é assim, que na passagem do governo de FHC para o de Luiz Inácio da Silva alguns políticos atuaram nos bastidores para que alguns fiscais agropecuários fossem mantidos nos cargos de superintendentes do Ministério da Agricultura em alguns estados da federação. Isso significa que o esquema de cobrança de propina e distribuição do dinheiro sujo entre políticos não é novidade.

O melhor exemplo da ação longeva dessa quadrilha surgiu coma prisão de Roberto Brasiliano da Silva, que no passado foi assessor do então deputado federal José Janene (PP-PR), falecido em outubro de 2010 e mentor intelectual do esquema de corrupção conhecido como Petrolão. Para quem conhece a trajetória de Janene a prisão de Brasiliano não causou surpresa. Afinal, o então deputado foi um dos que defenderam junto ao governo do PT a permanência de Daniel Gonçalves Filho, também preso na Carne Fraca, na Superintendência do Ministério da Agricultura no Paraná.

Horas depois da deflagração da Carne Fraca, em 17 de março, o governo do presidente Michel Temer apressou-se em afirmar que a ação da Polícia Federal foi irresponsável e comprometeria a exportação de carne, como se os cidadãos fossem obrigados a financiar corruptos e a consumir produtos com suspeita de adulteração.


O negócio de exportação de carne sofreu alguns reveses nos primeiros dias, mas caminha na direção da normalidade após países importadores serem convencidos, através de laudos periciais, de que os produtos brasileiros são confiáveis e respeitam a legislação sanitária.

Vencida a confusão no setor de exportação de carnes, a preocupação do governo agora está na possibilidade cada vez maior de os alvos da Operação Carne Fraca aderirem à delação premiada. Se isso acontecer, o desastre será monumental, pois alguns políticos, conhecidos pelo recorrente protagonismo em escândalos de corrupção, terão dificuldades para se explicar.

Uma eventual delação de Daniel Gonçalves Filho e de Roberto Brasiliano provocaria um estrago considerável na vida de alguns políticos que ainda não tiveram os nomes mencionados, mas insistem em aparecer como paladinos da moralidade.

A imprensa decidiu, de forma equivocada, crucificar o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, que nada tem a ver com o escândalo, enquanto alguns dos envolvidos no esquema continuam incólumes. Um desses supostos honestos, que comanda importante ministério, há muito está sem dormir. Isso porque se Roberto Brasiliano decidir soltar a voz não restará pedra sobre pedra. O tal ministro (não o da Justiça) telefonava com frequência ao então estafeta de José Janene para solicitar ajuda financeira, que era viabilizada com dinheiro da corrupção. E usava sempre a mesma frase: “Não me deixe morrer na praia”.

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