Caso do misturador de voz palaciano mostra que imprensa trata com deboche os capítulos da crise política

Fazer jornalismo sério e com responsabilidade não é tarefa fácil, mas quando o principal ingrediente deste nobre ofício é o deboche, pode-se dizer que estamos diante de algo desprezível, isso porque parte da imprensa brasileira, no rastro do que consome a opinião pública nacional, vem atuando de forma debochada em alguns casos, talvez na maioria deles.

Usar a fanfarronice como mola propulsora do noticiário, apenas para turbinar a ‘audiência’, em nada contribui para a formação de uma sociedade melhor, responsável e realista. A mais nova epopeia desse fuzuê em que se transformou o jornalismo verde-louro é o misturador de voz instalado no gabinete do presidente Michel Temer, no Palácio do Planalto.

Setores da imprensa trataram o assunto como mais um desplante do governo atual, como se tudo o que se fala no gabinete presidencial pudesse ser público. Não se trata de defender conversas escusas e nada republicanas, pelo contrário, mas de cobrar que a classe política passe por um necessário e profundo processo de depuração. Afinal, o País não mais suporta os velhacos da política, cada vez mais acintosos quando o assunto é avançar sobre o dinheiro público.

Para comentar tal assunto com responsabilidade e equilíbrio é preciso compreender o Estado como um todo, mesmo que esse seja permeado por delinquentes com mandato. Qualquer governo guarda segredos de Estado, os quais são estratégicos para o País e importantes para o futuro da nação.


Há quem defenda que um governo precisa ser transparente e tudo e o que no seu âmbito for tratado deve ser público. Em tese isso é verdadeiro é dá prazer defender esse modelo, mas enfrentamos uma questão cultural que não permite esse tipo de situação inerente nações cujos cidadãos são cônscios de seus direitos e obrigações.

O melhor exemplo dessa necessária blindagem é o episódio de e-mails da Presidência da República que foram acessados pela Agência Nacional de Segurança (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, assim como ocorreu com vários governantes ao redor do planeta.

Ademais, no momento em que o Brasil vive uma crise política sem precedente, com direito a uma insana briga pelo poder, sem contar a queda de braços entre os Poderes constituídos, qualquer medida que vise à segurança é aceitável. Sem contar as gravações e grampos realizados de forma criminosa e sob encomenda de um ou outro Poder. O Brasil se apresenta ao mundo como a salvação do planeta, enquanto a classe política existe como uma organização criminosa, sempre com pompa e circunstância.

O problema que ronda o objeto desta matéria está em dois pontos distintos: 1) o misturador de voz foi instalado no vácuo dos escândalos provocados pela bizarra delação da JBS, após gravações tão ilícitas quanto comprometedoras. 2) quem ordenou a instalação do equipamento – ou quem sugeriu – não tem moral para tanto.

O Brasil está longe de ser um país minimamente sério, ao contrário do que tentam defender algumas autoridades. Na verdade, o Brasil é um enorme improviso que aparentemente deu certo, mas no final das contas o estrago provocado pelo tal “jeitinho” acaba no bolso do cidadão. Por outro lado, a população existe na toada do manto tropical do vale tudo, como se esse status quo não tivesse um preço alto. A imprensa, que deveria indicar o norte para a sociedade, prefere faturar à sombra do jornalismo debochado. Enfim…

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