Voa, dinheiro! E o dinheiro voa

(*) Carlos Brickmann

Um presidente da República, na opinião de seus aliados, não pode se submeter à humilhação de um voo com escalas. Foi isso que Lula alegou para não usar um excelente jato da Embraer, que até serviria de propaganda para a indústria brasileira, e preferiu o Airbus conhecido como AeroLula. E Temer alega o mesmo motivo para alugar um Boeing 767: pode fazer viagens 2.500 km mais longas sem o incômodo de pousar para reabastecer.

No Interior de São Paulo, onde nasceram este colunista e Michel Temer, dir-se-ia: “Que frescura!” Ou, no caso de Lula e de Temer, talvez não seja frescura. Afinal, quem paga não são eles, somos nós. Eles só desfrutam.

Esquisitice: o AeroTemer é alugado de uma empresa, a Colt Transportes Aéreos, proibida de voar. Seu Certificado de Empresa de Transporte Aéreo foi suspenso há nove meses, pelo mesmo Governo que alugou o avião, entre outros motivos “por deficiência (…) de execução de tarefas de manutenção”. Outra empresa do grupo, a Colt Táxi Aéreo, teve a licença cassada pelo Governo por, segundo o jornalista Igor Gielow, da Folha de S.Paulo, que descobriu o caso, “problemas técnicos e trabalhistas”. Mas alguém no Governo tem bons motivos para confiar neles.

A Colt ganhou a licitação para alugar o Boeing até 2019 por US$ 19,77 milhões; o preço inclui manutenção e logística (o que a FAB poderia fazer com perícia) e seguro. No pagamento estão incluídos nossos impostos.

Pague, pague

O presidente dos Estados Unidos tem 377 pessoas trabalhando a seu lado. O presidente do Brasil tem 3.800, segundo levantamento do jornalista Cláudio Humberto (www.diariodopoder.com.br). A Justiça americana tem um carro de representação: o de uso do presidente da Suprema Corte. Os demais magistrados americanos não têm carro de representação. No Brasil, a partir da segunda instância, os magistrados (800, aproximadamente) têm carro de representação, com motorista, combustível, tudo por conta do Tesouro – ou, falando claro, por nossa conta. Os EUA, com população 50% maior que a do Brasil, têm 78 deputados federais a menos. E, com 50 Estados, têm cem senadores. O Brasil, com 27 Estados, tem 81 senadores.

Pague mais, pague mais

Os magistrados americanos têm salário parecido com o dos brasileiros. Mas não têm os penduricalhos, como auxílio-moradia, auxílio-escola e gratificações diversas. Por lei, nenhum servidor público brasileiro pode ganhar mais que um ministro do Supremo, uns R$ 34 mil mensais. Mas há desembargadores com subsídios mensais de R$ 200 mil. Em média, segundo levantamento de O Estado de S.Paulo, em 2016 o desembargador mineiro ganhava pouco mais de R$ 56 mil mensais; o paulista, cerca de R$ 52 mil. Parlamentares brasileiros ganham mais que os canadenses, ingleses, japoneses, alemães, noruegueses, israelenses, suecos, franceses. Ainda têm plano ilimitado de saúde, apartamentos funcionais, auxílios diversos. E têm algo de valor inestimável: pagadores de impostos que sustentam tudo isso.

Fingindo, fingindo

Agora vai: o presidente Michel Temer decidiu enviar 800 homens da Força Nacional de Segurança para melhorar a segurança pública no Rio. Com isso, o Rio terá um total de mil homens do Governo Federal na área.

O Rio tem 46 mil soldados na Polícia Militar. Mais mil não são um reforço considerável. O Rio, por lei, deveria ter 60.471 PMs; e não tem. No Brasil, há um policial para 473 habitantes, diz o IBGE; parâmetros internacionais recomendam um policial para 250 habitantes. E, de preferência, bem armados, bem protegidos, bem pagos. Não devem precisar aguardar o colega para usar o mesmo colete à prova de balas. Nem devem morar na favela, submetendo-se às ordens de traficantes ou morrendo.

Terror, terror

Quando o presidente Michel Temer anunciou o envio de mais 800 soldados ao Rio, a Linha Vermelha, que liga o centro da cidade à Zona Sul e à Baixada Fluminense, foi interditada pela 15ª vez neste ano (na média, mais de duas vezes por mês), porque havia tiroteios na região. Quando o trânsito para, há arrastões. Enquanto isso, assaltantes pesadamente armados tomaram tudo de pacientes na fila do Instituto Estadual de Diabetes. E que faziam eles na fila? Aguardavam – o laboratório não estava funcionando.

De novo, de novo

O juiz Sérgio Moro marcou o interrogatório de Lula (em outro processo, o do sítio de Atibaia) para 13 de setembro. Não, Lula não terá de explicar os R$ 9 milhões que tinha aplicado num plano de previdência privada (a menos que o interrogatório se desvie da rota normal). Será, provavelmente, replay do interrogatório sobre o apartamento triplex na praia do Guarujá.

Mais interessantes serão as preliminares: Marcelo Odebrecht, no dia 4, e Antônio Palocci, no dia 6. Palocci, especialmente, pode trazer surpresas.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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