Tragédia com avião da Chapecoense completa um ano; busca por responsáveis continua

Eram 21h58 (horário local) do dia 28 de novembro de 2016 quando o voo 2933 da empresa boliviana LaMia caiu no morro El Gordo, a 35 quilômetros do aeroporto de Medellín, na Colômbia. A bordo estavam 77 passageiros de um voo fretado pela Associação Chapecoense de Futebol, a Chape. A equipe do interior do estado catarinense acabava de realizar uma façanha: disputaria a final da Copa Sul-Americana contra o Atlético Nacional, de Medellín. A partida seria disputada na quarta-feira (30), no primeiro jogo pelo título.

A alegria dos jogadores, comissão técnica e jornalistas a bordo deu lugar ao horror. Na escuridão da noite o avião bateu de barriga no alto do morro, capotou e despedaçou encosta a baixo, deixando literalmente um rastro de destruição.

Quando as equipes dos bombeiros voluntários da cidade de La Unión conseguiram chegar ao local, quase uma hora depois, apenas sete pessoas ainda estavam vivas. Três eram jogadores do time: o goleiro Jackson Follman, o zagueiro Helio Zampier Neto e o lateral Alan Ruschel. Dos 20 jornalistas, apenas o locutor da Radio Oeste de Chapecó, Rafael Renzi, estava vivo. Os outros dois sobreviventes eram tripulantes: a comissária de bordo Ximena Suárez e o técnico de voo Erwin Tumiri. O sétimo passageiro encontrado com vida era o goleiro titular Marcos Danilo Padilha, que chegou a ser encaminhado para o hospital, mas não resistiu aos ferimentos e faleceu no dia seguinte.

Piloto perdido

Minutos antes da queda, o piloto Miguel Quiroga avisou a torre de controle do aeroporto de Rionegro que estava com problemas elétricos e pediu as coordenadas para um pouso de emergência. O avião estava a menos de cinco minutos da cabeceira da pista, mas no dramático diálogo com a torre ficou gravada a desorientação de Quiroga.

O piloto parecia não saber ao certo sua posição e não compreendia as instruções da controladora Yaneth Molina que, por sua vez, não conseguia ver a aeronave no radar. Quando finalmente Quiroga admitiu que estava sem combustível, a torre perdeu o contato.

Avisada por moradores que ouviram o barulho da queda, a Polícia Nacional da Colômbia acionou o modesto grupamento de bombeiros voluntários de La Unión que, em pouco mais de meia hora, conseguiram chegar ao Cerro El Gordo e iniciaram a busca por sobreviventes.


Plano de voo errado

Enquanto as equipes de resgate vasculhavam os destroços em busca de sobreviventes, as autoridades aeronáuticas no Brasil, Colômbia e Bolívia começavam a procurar respostas para as circunstâncias do acidente. E as primeiras informações vindas da Bolívia, de onde o voo 2933 havia decolado, eram desconcertantes.

O avião tinha saído do aeroporto de Santa Cruz de la Sierra com um plano de voo que, segundo a funcionária da Administração de Aeroportos e Serviços Auxiliares de Navegação Aérea (AASANA), Celia Castedo, “estava errado”. O tempo de voo até Medellín – 4 horas e 22 minutos – correspondia exatamente à autonomia de combustível da aeronave. Isso não dava a margem de segurança necessária para uma situação inesperada. Celia assegura que avisou o problema ao despachante da LaMia, que morreu no acidente.

Em seu depoimento, Célia Castedo afirmou que o despachante ignorou o alerta e o avião decolou, desrespeitando as regras internacionais de aviação. Celia, que pediu abrigo ao governo brasileiro, ainda se defende da acusação de homicídio culposo na Justiça boliviana. E se justifica: “Minha função era apenas checar o preenchimento do plano de voo e avisar sobre alguma irregularidade, mas eu não tinha autoridade para impedir a decolagem”.

Para os investigadores do acidente, o avião jamais poderia ter levantado voo. O que deixa uma nova pergunta sem resposta: por qual razão o piloto decidiu voar diretamente para Medellín, no limite de segurança do combustível, se poderia ter feito uma escala para abastecimento?

Companhia aérea suspeita

O Avro RJ85 é um avião equipado com quatro motores que proporcionam autonomia de voo de até 3 mil quilômetros, segundo dados da fabricante British Aerospace. Pode transportar com segurança até 112 passageiros e nove tripulantes. O aparelho tinha sido fabricado em 1999 e comprado por uma empresa americana, que o vendeu em 2007 para a City Jet, companhia irlandesa de linhas regionais.

Em 2013, o avião foi vendido para a LaMia (Línea Aérea Merideña Internacional de Aviación), empresa regional fundada em 2010 na Venezuela pelo empresário Ricardo Albacete Vidal. Antes de ingressar no ramo da aviação civil, Albacete teve empresas nos setores metalúrgicos e petrolíferos e sempre esteve envolvido em política, chegando a ser senador. Ele convidou o lobista chinês Sam Pa, para se associar à LaMia, mas não foi um bom negócio: em 2011 Sam Pa foi preso na China, levando Albacete a dissolver a empresa.

A LaMia ressurgiu em 2013, com o nome de Línea Aerea Margarita, mas usando o mesmo logotipo e com foco em voos internacionais. Sua estratégia para conquistar o mercado foi agressiva, oferecendo preços até 40% mais baratos do que a concorrência. Desse modo, a nova empresa acabou atraindo uma clientela muito lucrativa: os times de futebol que viajavam pelo continente durante os campeonatos continentais. Informalmente, a LaMia passou a ser a transportadora preferida da Confederação Sul Americana de Futebol (Conmebol), entidade movida a escândalos de corrupção e decisões canhestras.

Quando o voo 2933 caiu na Colômbia, Albacete Vidal negou que o avião fosse da sua LaMia, que teria arrendado seus aviões para a LaMia boliviana. Ele só não mencionou que a LaMia boliviana tinha sido criada por ele próprio, em sociedade com o piloto Miguel Quiroga, que comandava o fatídico voo que vitimou boa parte da Chape e estarreceu o Brasil. (Com ABr)

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