Ao restabelecer indulto sem perdão para “colarinho branco”, Barroso editou um decreto dentro de outro

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu na segunda-feira (12), de forma monocrática, restabelecer em partes o decreto de indulto natalino editado pelo presidente Michel Temer no final de 2017, mantendo de fora os apenados pelos crimes de colarinho branco, leia-se corrupção.

O decreto foi suspenso em dezembro passado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, durante o recesso do Judiciário, após pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que arguiu inconstitucionalidade. A decisão foi mantida posteriormente por Barroso, relator da ação, que pediu então que o assunto fosse pautado em plenário.

Como a ação não foi inserida na pauta do Supremo de março e abril, Barroso resolveu estabelecer por conta própria os critérios que julgou adequados para a concessão do indulto, que é prerrogativa exclusiva do presidente da República, prevista na Constituição, de dar perdão judicial a pessoas condenadas por alguns crimes e consideradas algumas condições.

Luís Roberto Barroso justificou sua postura, de não aguardar o plenário, levando em consideração manifestações de diversas defensorias públicas dos estados, que relataram a situação de tensão nas prisões devido ao fato do decreto não ter sido aplicado em nenhuma hipótese até o momento, uma vez que as varas de execução penal de todo o País aguardam definição do STF.

Regras

Barroso reiterou, no despacho em que restabeleceu o indulto, considerar inconstitucionais as regras originais do decreto editado por Temer, que previa, por exemplo, a concessão do indulto mesmo a quem não pagou as multas previstas em suas penas ou àqueles que tivessem cumprido somente 20% do tempo de prisão a qual foram condenados. Tais regras acabaram “transmitindo à sociedade um sentimento de impunidade e até mesmo uma certa descrença nas instituições públicas”, escreveu o ministro.


Entre os principais pontos da decisão de Barroso publicada nesta segunda-feira está o restabelecimento de um terço do cumprimento mínimo da pena para que o condenado seja agraciado com o indulto, limite que vigorava em decretos de anos anteriores e fora recomendado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.

O ministro também impôs o limite de oito anos de pena como o máximo ao que o detento pode ter sido condenado para poder receber o indulto. O decreto original não trazia limite para a condenação.

Ingerência deliberada

Estabelece a Constituição Federal que os três Poderes devem existir de forma harmoniosa e independente, ou seja, é preciso evitar ingerências na seara alheia. O que Luiz Roberto Barroso fez ao tomar a mencionada decisão foi uma aberração jurídica, pois trata-se da edição de novo decreto dentro de outro anterior.

A qualquer ministro do STF não cabe a prerrogativa de indultar apenados, podendo o magistrado, ou até mesmo a Corte, declarar a inconstitucionalidade do decreto presidencial e suspender os respectivos efeitos. Modificar um decreto presidencial é reforçar mais uma vez a insegurança jurídica que embala o Brasil, provocando a desconfiança de todos os cidadãos nacionais ou estrangeiros, a começar pelos investidores.

A pressa com que Barroso decidiu a questão, sem que o processo fosse avaliado pelo plenário da Corte, revela o descontrole do seu condenável ativismo político. Longe da inexistente perseguição ao presidente Michel Temer – tese que o emedebista tenta emplacar –, há por parte de alguns setores do Estado certa picuinha com o chefe do Executivo federal.

É preciso que a legislação seja respeitada em sua inteireza, pois do contrário o País corre o sério de dar largos passos na direção de um regime de quase exceção. Esse cenário ameaça diuturnamente a democracia e o direito dos cidadãos. Ou cobra-se o incondicional respeito às leis, ou admite-se que o Brasil foi pelos ares.

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