Bolsonaro ainda não se instalou no Palácio do Planalto, mas seus pupilos já iniciaram a “caça às bruxas”

Eleito presidente da República, Jair Bolsonaro, em seu discurso da vitória, disse que respeitará a Constituição, defenderá a liberdade de expressão e conviverá pacificamente com as divergências. Se isso é verdade não se sabe, até porque sua campanha foi baseada em discurso oposto, mas é preciso agir como São Tomé, que num primeiro momento não acreditou que Jesus aparecera para outros discípulos.

Apesar da fala de Bolsonaro, seus discípulos estão a seguir os ensinamentos da campanha, levando adiante o discurso da intolerância e do ódio, na tentativa de fazer prevalecer uma vontade uma e que atende os anseios do retrocesso.

Deputada estadual eleita pelo PSL de Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo parece desconhecer o mais raso conceito de democracia, assim como ignora o texto constitucional, que no artigo 1º (Estado Democrático de Direito) garante no inciso V o “pluralismo político”.

No artigo 3º, a Constituição de 1998 estabelece no inciso IV, como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Ou seja, a parlamentar eleita está a desrespeitar a lei máxima do País, apenas porque continua acreditando que o discurso da intolerância que prevaleceu na campanha ainda está em marcha.

Não obstante, Carta Magna é clara no artigo 5º, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, ao garantir:

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.

Na noite de domingo (28), Ana Caroline pediu aos estudantes catarinenses que denunciem professores que façam “queixas político-partidárias em virtude da vitória do presidente [Jair] Bolsonaro”.


“Muitos professores doutrinadores estarão inconformados e revoltados. Muitos não conseguirão disfarçar sua ira e farão da sala de aula uma audiência cativa para suas queixas político-partidárias em virtude da vitória do Presidente Bolsonaro”, escreveu, em sua página no Facebook, pouco depois de confirmada a eleição do presidenciável.

A seguidora de Jair Bolsonaro, que está agindo à sombra do “achismo”, pediu aos estudantes que filmem ou gravem eventuais manifestações, encaminhando os registros à sua equipe, com o nome do professor, da escola e da cidade onde ocorreu a aludida transgressão (sic).

Ana Caroline Campagnolo é professora e historiadora e defensora do movimento “Escola sem Partido”, movimento contrário à doutrinação partidária e ideológica por parte de professores. O presidente eleito Jair Bolsonaro é crítico desse movimento.

O argumento central é a busca da neutralidade em sala de aula, em favor da qualidade da educação. No contraponto, críticos alegam que a proposta é autoritária e limita a pluralidade de ideias e a liberdade de expressão.

Professores e profissionais da educação reagiram à postagem de Campagnolo, afirmando que a medida “incita a coação dos professores em sala de aula” e “promove o desrespeito aos educadores”, segundo nota do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte) de São José (SC). A nota é assinada por uma diretora filiada ao PSTU e que foi candidata ao governo de Santa Catarina.

Para a deputada eleita, a doutrinação ideológica e partidária nas escolas é um problema grave, que contribui para o baixo desempenho dos alunos brasileiros, na comparação com a média global. Tal afirmação é absurda, pois o baixo rendimento escolar no Brasil vem da má qualidade da educação de base.

Ana Caroline tem o direito de defender o projeto “Escola sem Partido”, mas não lhe cabe liderar uma patrulha contra aqueles que discordam da sua opinião e de muitos que rezam pela cartilha de Bolsonaro. Considerando que o Estado Democrático de Direito ainda está vigente, a deputada eleita deve respeitar o contraditório e recorrer à lei para fazer valer seus direitos. Qualquer movimento fora desse espectro é um convite à ditadura, não importando de quem parta o convite.