Bolsonaro precisa tirar o “salto alto” de certos colaboradores para evitar que o governo “quebre a perna”

Em qualquer lugar do planeta, política é um jogo que exige paciência, sabedoria e noções de estratégia por parte de quem joga. Além de humildade, porque em muitas ocasiões o recuo pode representar um avanço importante. Ao longo da campanha de Jair Bolsonaro, muitas foram as vezes em que o UCHO.INFO alertou para o perigo que representavam os discursos radicais e marcados pelo ódio e pela intolerância, principalmente os dedicados aos adversários.

O problema que enxergávamos não estava apenas na esfera da corrida presidencial, mas também e principalmente depois da eleição. Com um palavrório carregado de promessas que passam a léguas de distância daquilo que a legislação vigente permite, o próximo presidente da República e muitos dos que se elegeram de carona foram fisgados pela soberba. Eis o pecado capital para quem ingressa no meio político.

O índice de renovação no Congresso foi maior do que o esperado e surpreendeu muitos dos que acompanham há anos o cotidiano do Parlamento federal, mas é importante reconhecer que por lá permanecerão muitos políticos experientes, alguns acusados de corrupção e outros crimes, que ainda detêm poder. Nesse cenário complexo é preciso ter habilidade para lidar também com os trêfegos que se escondem debaixo de mandatos eletivos.

Após quase três décadas na Câmara dos Deputados, esperava-se que Bolsonaro conhecesse como as regras do jogo político e soubesse como funciona o Congresso Nacional, que está longe de ser uma reunião monástica.

É difícil afirmar se o presidente eleito conhece ou não as regras, mas ele pode estar inebriado com o triunfo, o que explica sua eventual desatenção com o que está acontecendo à sua volta. No vácuo desse descuido, alguns dos seus “homens de confiança” estão agindo com irresponsabilidade e petulância, apenas porque o chefe não sabe dar ordens como manda o figurino. Não faz muito tempo, Bolsonaro mandou Paulo Guedes, o “Posto Ipiranga”, fechar a boca, em especial quando o assunto é política.

Aparentemente encantado com a proximidade de ver o sonho de ser ministro – e poderoso – se transformar em realidade, Guedes continua a meter os pés pelas mãos. Na terça-feira (6), quando o entourage de Jair Bolsonaro chegou ao Congresso para participar da sessão solene em comemoração aos 30 anos da Constituição, Paulo Guedes tratou de acender o pavio da bomba que estourará no colo do próximo governo.


Petulante, como se fosse o derradeiro gênio da economia planetária, Paulo Guedes foi recebido pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que em seu gabinete perguntou ao economista qual eram as preocupações de Bolsonaro em relação ao Orçamento de 2019, que precisa ser aprovado antes do recesso do final do ano.

Sem qualquer dose de humildade ou sinal de gentileza, Guedes respondeu que sua preocupação não era com o Orçamento, porque “qualquer coisa, será alterado”. Ressaltou o economista que a prioridade do momento é a aprovação da reforma da Previdência.

Ainda destilando soberba, Paulo Guedes afirmou que no caso de a reforma da Previdência não ser aprovada, a responsabilidade por eventual “volta do PT” ao governo na próxima eleição seria “de vocês” – Eunício Oliveira e alguns senadores, que atônitos contemplavam o histrionismo do economista.

Horas depois, Guedes, que demonstrou ser tão hábil na política quanto um orangotango em loja de cristais, sugeriu uma “prensa” para que o Congresso votasse com rapidez a reforma da Previdência. Não bastasse o estrago matutino, a lambança vespertina foi a cereja do bolo.

A possibilidade de a reforma da Previdência ser aprovada ainda em 2018 é remota, mas o presidente do Senado mostrou a Paulo Guedes como se joga na política. Nesta quarta-feira (7), o plenário da Casa aprovou, de forma simbólica, aumento de 16% no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e dos membros da Procuradoria-Geral da República (PGR). Considerando o efeito cascata, a decisão do Senado provocará uma elevação de gastos de aproximadamente R$ 4 bilhões por ano nas contas públicas.

Jair Bolsonaro precisa urgentemente tirar o “salto alto” de alguns dos seus colaboradores, antes que o estrago seja maior. Do contrário, muitos saltos ainda hão de quebrar e o governo terá de estrear com pelo menos uma perna quebrada.