A hora dos profissionais

(*) Carlos Brickmann

Há alguns anos, numa das periódicas ondas de preocupação sobre a tomada do poder pelo comunismo, perguntaram ao deputado pernambucano Thales Ramalho quem seria o chefe da revolução se os comunistas fossem vitoriosos. Thales, que conhecia como poucos a política, respondeu: “O chefe militar, não sei. Mas o primeiro-ministro será Marco Maciel”. Maciel era hábil, bom de manobra, sem inimigos –gente do ramo, como os que hoje botam a cabeça de fora. Só que era leal e honesto.

O tufão Bolsonaro provocou renovação de quase 50% na Câmara e de 85% dos que disputaram vaga no Senado. Mas, entre os que ficaram, estão os profissionais que conhecem o caminho das pedras. Deles depende muita coisa: por exemplo, o destino da reforma da Previdência, a mãe de todas as reformas, a chave que abrirá (ou fechará) o cofre dos investidores. E a sorte de Flávio Bolsonaro, importantíssima: se a questão for mal resolvida, ou o presidente ficará sob fogo ou correrá o risco de perder Sérgio Moro, seu aval. Talvez não ocorra nenhuma das hipóteses – mas vale a pena correr o risco de ter a seu lado um Sergio Moro que deixou de ser Sergio Moro?

O regime militar tinha um profissional como Petrônio Portela para negociar com os profissionais da oposição – Thales, Tancredo, Montoro – a anistia e a redemocratização. Onyx Lorenzoni está longe de ser um deles. Sem gente sua, Bolsonaro está nas mãos dos profissionais do Congresso.

Buscando a liberdade

E, já que falamos no regime militar, uma lembrança: nesta última terça, 29 de janeiro, um episódio tocante de solidariedade e competência fez 40 anos. Neste dia, os advogados Orlando Maluf Haddad, Ivo Galli, Gérson Mendonça Neto e José Francisco Martins Jr. venceram a batalha contra a ditadura uruguaia (e a brasileira) e conseguiram libertar o jornalista Flávio Tavares, que havia sido sequestrado por militares uruguaios e estava preso ilegalmente já por 200 dias.

A história como ela foi: logo após a deposição de João Goulart, Tavares, colunista de O Estado de S.Paulo, foi preso por ligações com Leonel Brizola. Saiu logo e passou à luta armada. Foi preso, torturado por longo período e condenado em 1967. Em 69, integrou o grupo libertado em troca do embaixador americano Charles Burke Elbrick.

Foi para o México, onde trabalhou no jornal Excelsior e no Estadão – aí com o pseudônimo de Julio Delgado. Mudou-se para a Argentina. No dia em que visitou Montevidéu, foi sequestrado, torturado e enviado para local desconhecido por militares uruguaios. Orlando Maluf Haddad, Martins, Galli e Mendonça o localizaram. Estadão e Excelsior iniciaram campanha por sua libertação, até que a ditadura uruguaia concordou em soltá-lo e expulsá-lo do país, a pedido do Brasil. Não podia voltar a nosso país, por ter sido banido em 1969; foi então para Portugal, via Argentina.

Final feliz

Em mensagem enviada agora a Orlando Maluf, Tavares lembra que foi acompanhado o tempo todo por ele – seria perigoso deixá-lo sozinho. Maluf também cuidou de seu filho Camilo, de seis anos. Em Buenos Aires, mais um risco: interrogaram-no sobre “as armas que levava”. Não havia nada. Todos, esposa, advogados, o embaixador de Portugal, o levaram até o avião. Hoje, aos 84 anos, Flávio Tavares vive (e escreve) em Porto Alegre.

Está no Talmud: quem salva uma vida salva o mundo inteiro.

A Vale e o Vate

Os romanos atribuíam aos poetas (vates) o dom de prever o futuro (vaticínios). Não é à toa que dominaram o mundo por mil anos: sabiam das coisas. Eis um poema de Carlos Drummond de Andrade, Lira Itabirana, que saiu em 1984 no jornal O Cometa Itabirano, de sua cidade, Itabira:

“I – O rio? É doce. / A Vale? Amarga. / Ah, antes fosse/mais leve a carga.
II- Entre estatais/ E multinacionais/ Quantos ais!
III- A dívida interna. / A dívida externa/ a dívida eterna.
IV- Quantas toneladas exportamos/ De ferro? / Quantas lágrimas disfarçamos/ Sem berro?”

Palpite infeliz

Do presidente da Vale, Fábio Schvartsman, explicando por que a sirena de alarme não soou: porque estava submersa pela lama. Ou seja, quando a sirene não toca, é sinal de perigo, pois ela pode estar submersa. Quando toca, fique mais tranquilo: se há enchente, não deve ser tão grande assim.

Imaginemos: que diria Dilma a esse respeito?

Inovando

De vez em quando, há inovação: uma loja de carros de luxo (vendas e oficina), Carelli Multimarcas, há pouco aberta em São Paulo, usa a Internet para que os clientes sigam seu trabalho. Nem é preciso saber o endereço: o carro é apanhado e devolvido em casa, orçamento e conserto estão no site. Também se pode pedir um carro em casa para estudar a compra.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.