Planalto pressiona governadores de estados endividados por apoio à reforma da Previdência

Durante a campanha presidencial, Jair Bolsonaro, que como qualquer candidato recorreu ao discurso visguento e megalômano, prometeu acabar com o “toma lá, dá cá”, troca de recursos públicos e cargos na administração federal por apoio no Congresso Nacional. Essa relação espúria entre Executivo e Legislativo foi batizada ao longo dos anos como presidencialismo de coalizão, nome pomposo para camuflar a prática do escambo rasteiro.

É sabido que nenhum candidato cumpre, depois de eleito, aquilo que prometeu durante a campanha, mas é preciso doses rasas de coerência para não cair na vala do descrédito, algo que começa a ameaçar o governo Bolsonaro, mesmo que de maneira disfarçada.

No afã de aprovar a reforma da Previdência, cujo texto a ser enviado ao Congresso ainda não está definido e depende do aval do presidente da República, o governo está disposto a trocar apoio ao projeto por ajuda financeira a estados da federação que enfrentam dificuldades financeiras. Não há novidade alguma nessa prática, mas para quem prometeu acabar com o “toma lá, dá cá”, Bolsonaro é uma ode à mesmice política.


Esse escambo arquitetado pelo governo será oficializado na proposta de reforma da Previdência, já que a equipe econômica liderada pelo ministro Paulo Guedes poderá incluir no texto a antecipação de receitas futuras. A ideia é permitir que governos regionais possam antecipar recursos ao repassar a terceiros as receitas que têm a receber por meio de Fundos de Participação (FPE), créditos tributários – inclusive ICMS, IPVA e Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD) – e dívida ativa.

Contudo, há a obrigação por parte dos governos estaduais de destinar os mencionados recursos a fundos previdenciários, que deverão ser criados para garantir o pagamento de aposentadorias e pensões.

Há nessa proposta ao menos uma questão preocupante a ser considerada: muitos governos estaduais têm dívidas atrasadas no âmbito de aposentadorias e pensões, o que poderia, no curto prazo, comprometer a proposta. Isso porque o problema, como um todo, continuaria existindo, uma vez que o rombo previdenciário seria empurrado para o futuro.

Por outro lado, a proposta, que empareda os governadores, que por sua vez terão de pressionar as respectivas bancadas no Congresso, mostra que o Palácio do Planalto continua patinando em termos de articulação política. Há uma diferença enorme entre a necessidade de um governador e a relação de um parlamentar com sua base eleitoral. Na maioria das vezes, o segundo cenário é o que prevalece.