Bolsonaro desistiu de participar de manifestações para não incorrer em crime de responsabilidade

Engana-se quem pensa que o presidente Jair Bolsonaro desistiu de participar das manifestações do próximo domingo (26) por “respeito pelo cargo e por suas responsabilidades”. Se há no País alguém que não respeita a Presidência da República, esse atende pelo nome de Jair Messias Bolsonaro, que de igual modo dá de ombros para a democracia e para o Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro ensaia nos bastidores, a exemplo do que há muito anuncia o UCHO.INFO, um “cavalo de pau” para se manter no poder. Esse movimento, que atenta contra a democracia e as liberdades, passa obrigatoriamente por um plano criminoso que prevê a instalação no País de um “fascismo tropical”.

Para quem ainda não percebeu ou prefere ignorar, o presidente pretende estabelecer uma linha direta com o povo, alijando os outros dois Poderes constituídos – Legislativo e Judiciário. O que explica seu incentivo às manifestações, convocadas para salvar um governo pífio que começa a esfarelar cinco meses após a estreia.

A estratégia começou a ficar evidente com a publicação, no final de semana, de um vídeo em que pastor congolês Steve Kunda, fundador de igreja evangélica na França, afirma em entrevista que Bolsonaro foi “escolhido por Deus para comandar o Brasil”. É importante frisar que Jair Bolsonaro foi escolhido pelos eleitores, não por Deus. E misturar política com religião é recurso típico de quem está por um fio.

O pastor Kunda tem o direito de se manifestar, mesmo que suas declarações sejam fruto de devaneio, mas é extremamente grave difundir a ideia de que Bolsonaro é um enviado divino. Essa afirmação, tosca e oportunista, cria a falsa ideia de que todos que forem contra Bolsonaro são contra a vontade do Senhor. Em suma, o que o presidente da República intenta é, a reboque da sua conhecida incompetência, promover um anátema emoldurado pelo revanchismo ideológico, quando o verdadeiro herege no campo da democracia é o próprio Bolsonaro.

Como se não bastasse o episódio dantesco do pastor congolês, o bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, orou por Bolsonaro e pediu para que o Criador “remova” aqueles que se opõem ao governo.

“Vamos orar pelo nosso país. Quando se levanta um político querendo ajudar, os bandidos, ladrões, safados, salafrários se unem para derrubá-lo. Mas o Senhor conhece aqueles que são justos, que querem ajudar o seu povo. Então te peço, meu Pai, por esta nação: nós elegemos Bolsonaro, então seja justo com ele, meu Pai”, discursou Edir Macedo, em vídeo transmitido ao vivo pelo Facebook.

A azáfama para salvar Bolsonaro e seus desastrado governo não parou por aí. Na terça-feira (21), em evento religioso no Palácio do Planalto (ato de consagração do Brasil a Jesus Cristo por meio do Imaculado Coração de Maria), o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Floriano Peixoto, pediu ajuda espiritual para os Poderes Legislativo e Judiciário.

“Nossos irmãos do STF, irmãos do legislativo que têm pautas importantes, esperamos que todas se concretizem para o bem do Brasil a curto prazo”, disse Peixoto.

Bolsonaro não fez qualquer declaração durante a celebração católica comandada pelo padre Oscar Pilloni, mas não custa lembrar o velho adágio popular “quem cala, consente”. E o presidente da República trabalha nos bastidores para minar o Legislativo e o Judiciário, mesmo que em público diga o contrário.

Jair Bolsonaro é um populista de quinta categoria que recorre insistentemente à fanfarronice para impedir que a massa ignara perceba o óbvio ululante: ele é mais do mesmo. Por isso seu desejo incontrolável de participar das manifestações do próximo domingo.


Crime de responsabilidade

Aconselhado por assessores palacianos e ministros, Bolsonaro foi obrigado a desistir de participar dos atos, pois do contrário incorreria em crime de responsabilidade, como prevê a Constituição Federal em seu artigo 85, inciso II.

Art. 85 – São crimes de responsabilidade os atos do Presidente que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação”.

A participação de Jair Bolsonaro nas manifestações configuraria crime de responsabilidade, o que, de chofre, abriria caminho para pedido de impeachment, como estabelece a Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, também conhecida como “Lei do Impeachment”.

A referida Lei, no artigo 6º, não deixa dúvidas a respeito do crime de responsabilidade no caso de eventual participação de Bolsonaro nas manifestações em seu favor e contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.

Art. 6º – São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos poderes legislativo e judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados:

1 – tentar dissolver o Congresso Nacional, impedir a reunião ou tentar impedir por qualquer modo o funcionamento de qualquer de suas Câmaras;

2 – usar de violência ou ameaça contra algum representante da Nação para afastá-lo da Câmara a que pertença ou para coagí-lo no modo de exercer o seu mandato bem como conseguir ou tentar conseguir o mesmo objetivo mediante suborno ou outras formas de corrupção;

5 – opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário, ou obstar, por meios violentos, ao efeito dos seus atos, mandados ou sentenças;

6 – usar de violência ou ameaça, para constranger juiz, ou jurado, a proferir ou deixar de proferir despacho, sentença ou voto, ou a fazer ou deixar de fazer ato do seu ofício”.

O presidente já deveria ser alvo de pedido de impeachment, pois em pelo menos quatro ocasiões incorreu em crime de responsabilidade: 1) Quando divulgou vídeo com cenas pornográficas durante o carnaval; 2) Ao ordenar às unidades militares que comemorassem os 55 anos do golpe militar de 1964; 3) Ao propor à CIA a invasão militar da Venezuela; 4) Ao incentivar o turismo sexual no País.

Fosse o Brasil um país minimamente sério, com autoridades respeitadoras da letra fria da lei, Jair Bolsonaro já estaria respondendo a processo de impeachment. Isso só não aconteceu ainda porque o Congresso Nacional é conivente com essa pasmaceira.