Demissão do secretário da Receita escancara descompasso da equipe econômica na reforma tributária

O ministro da Economia, Paulo Guedes, demitiu nesta quarta-feira (11) o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, por conta do posicionamento do Congresso Nacional frente à proposta de reforma tributária, que inclui a criação de novo tributo nos moldes da extinta CPMF.

De acordo com os planos da pasta, a proposta da chamada “nova CPMF” prevê alíquotas de 0,2% e 0,4%, incidentes sobre meios de pagamento, inclusive para depósito e saque de dinheiro em instituições bancárias. A proposta foi antecipada pelo secretário-adjunto da Receita, Marcelo Silva, o que teria contrariado o ministro da Economia em função da repercussão negativa.

Em razão da reação dos parlamentares, que preveem sérias dificuldades para a proposta avançar no Congresso, a permanência de Marcos Cintra à frente da Receita ficou insustentável. Guedes já tinha comunicado a interlocutores que o agora exonerado secretário da Receita não conseguisse viabilizar a criação da “nova CPMF”, ele não teria condições de continuar como negociador da reforma tributária.

A decisão de demitir Marcos Cintra ainda é nebulosa e esconde muitos detalhes, alguns dos quais que passam pela seara da vaidade. Tirar de Cintra o status de negociador da proposta de reforma tributária do governo, sem que ao menos tenha sido apresentada oficialmente ao Parlamento, é querer esconder algo muito mais grave.

Quando lançou sua candidatura ao Palácio do Planalto, o agora presidente Jair Bolsonaro sabia dos problemas que enfrentaria caso vencesse a disputa nas urnas. Ato contínuo, Bolsonaro apresentou o ministro Paulo Guedes à opinião pública como sendo o “vice-salvador da pátria” (o primeiro é ele próprio), mas entre o discurso e a prática há uma longa e aterrorizante distância.

Em 19 de setembro de 2018, Bolsonaro, em postagem no Twitter, negou a recriação da CPMF, alegando que, se eleito, agiria diferentemente dos antecessores. O tempo passou a o brasileiro precisa reconhecer que o atual presidente da República é “mais do mesmo”.


“Nossa equipe econômica trabalha para redução de carga tributária, desburocratização e desregulamentações. Chega de impostos é o nosso lema! Somos e faremos diferente. Esse é o Brasil que queremos!”, escreveu Bolsonaro, que agora aceita passivamente o retorno do malfadado tributo.

No momento, tramitam no Congresso duas propostas de reforma tributária – uma no Senado, outra na Câmara dos Deputados. Não se sabe se por preciosismo ou por vaidade, o governo quer enviar uma terceira proposta. Na verdade, a equipe econômica deveria sugerir alguns pontos de interesse do governo para que fossem incorporados às propostas em tramitação, encurtando o tempo para a aprovação da matéria.

Uma das propostas, endossada pelo presidente do Senado, David Alcolumbre (DEM-AP), é de autoria do ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) e já foi aprovada pela Comissão Especial da Câmara e aguarda votação em plenário. A segunda, apresentada pelo deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP), é de autoria do economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e está em discussão na comissão especial.

Querer culpar Marcos Cintra pelo descompasso da equipe econômica no âmbito da reforma tributária é um misto de covardia e deslealdade, já que todos tinham ciência do tamanho do problema que trava a economia nacional.

A grande questão é que Jair Bolsonaro, que eleitoralmente surfou na onda antipetista, prometeu aquilo que sabia ser impossível de cumprir, enquanto parcela da sociedade acreditou naquilo que foi prometido.

Em outro vértice dessa lufada de falso messianismo, Paulo Guedes recebeu do presidente a alcunha de “Posto Ipiranga”, mas até agora não mostrou a que veio. Como na política inexiste operador de milagre, em especial na área econômica, Bolsonaro e os brasileiros que se preparem para tempos difíceis.