Capitalismo e ocultação: onde está a verdade?

(*) Rizzatto Nunes

As redes sociais são democráticas. E, pelo bem ou pelo mal, permitem que possamos refletir sobre o mundo que nos rodeia e sobre muitas ocorrências do mundo inteiro.

Está difícil saber o que é verdade e o que é fake?

Talvez seja melhor assim. Antes eram poucos os canais que comunicavam os fatos. Agora, são milhares. Sei que gera um certo desconforto, mas, pelo menos, opções de circunstâncias para pensarmos não faltam.

A sociedade em que vivemos gerou mesmo uma melhor vida para as pessoas? Estamos mais equipados para viver bem? O consumo melhorou de qualidade? E o planeta está sendo destruído por conta disso tudo? É culpa do sistema de produção e consumo?

Sem querer opinar sobre as respostas neste momento, um fato é constatável: o consumo no planeta é desequilibrado. Se a forma de consumo dos países desenvolvidos se estendesse a todos os cantos da Terra, certamente a devastação seria maior do que a que já existe.

Será que estamos conscientes disso? Não sei. Aos poucos vão surgindo ilhas de conhecimento e esperança aqui e ali.

Meu amigo Outrem Ego, sempre muito preocupado com essas questões, contou-me essa história recebida de um conhecido. Disse ele que, logo depois da abolição das sacolas plásticas pelos supermercados, que eram oferecidas de graça e, com isso, as novas, biodegradáveis, passaram a ser cobradas, uma professora aposentada foi fazer compras num supermercado e estranhou que tivessem cobrado dela o valor de meia dúzia de sacolinhas. O caixa, talvez cansado com o expediente, não foi muito simpático com ela e disse:

“A senhora deveria trazer suas próprias sacolas para as compras. Não damos mais sacolas de plástico, pois elas estragam o ambiente.”

A professora pediu desculpas e falou:

“Não havia essa onda verde no meu tempo.”

O caixa continuou no mesmo tom:

“Minha senhora, esse é o nosso problema hoje. As gerações passadas… A sua geração não se preocupou o suficiente com o nosso meio ambiente.”

Ela, então, humildemente, falou:

“Você está certo. Nossa geração não se preocupou adequadamente com o meio ambiente. Naquela época, as garrafas de leite, garrafas de refrigerante e de cerveja eram devolvidas à loja. A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes.”

“Realmente, não nos preocupamos com o ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhávamos até a padaria, ao invés de usar o nosso carro, a cada vez que precisamos ir a dois quarteirões de casa.”

“Não nos preocupávamos com o ambiente. Até as fraldas de bebês eram lavadas: não havia fraldas descartáveis. A secagem era feita por nós mesmos, não nestas máquinas secadoras elétricas. A energia solar e eólica é que realmente secavam nossas roupas.”

“Os filhos menores usavam as roupas que tinham sido de seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas.”

“Mas é verdade: não havia preocupação com o ambiente, naqueles dias. Naquela época tínhamos somente um aparelho de tevê ou um rádio em casa, e não uma tevê em cada cômodo. E a tela era de 14 ou no máximo 20 polegadas; e não um telão do tamanho de um estádio; que depois será descartado, sabe-se lá como.”

“Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia batedeiras elétricas, que fazem tudo por nós. Quando enviávamos algo frágil pelo correio, usávamos jornal velho como proteção, e não plástico bolha ou pellets de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar.”

“Naqueles tempos não se usava motor a gasolina para cortar a grama; era utilizado um cortador de grama que exigia músculos. O exercício era extraordinário, e não se precisava ir a uma academia e usar esteiras que também funcionam à eletricidade.”

“Recarregávamos nossas canetas com tinta inúmeras vezes ao invés de comprar outra. Amolávamos as navalhas, ao invés de jogar fora aparelhos descartáveis, quando a lâmina perdia o corte.”

“Havia só uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos. E não precisávamos de GPS para receber sinais de satélites no espaço para encontrar a pizzaria mais próxima.”

“Meu caro, não é mesmo incrível que a atual geração, a sua geração, fale de meio ambiente, mas nem pense em viver um pouco como na minha época?”

(*) Luiz Antônio Rizzatto Nunes é professor de Direito, Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP); Livre-Docente em Direito do Consumidor pela PUC-SP e Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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