Por 68 votos a favor e 10 contrários, plenário do Senado aprova a indicação de Augusto Aras à PGR

Após a Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) aprovar o nome de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República e decidir pelo regime de urgência para que o plenário da Casa votasse a indicação do subprocurador, o plenário deu 68 votos favoráveis àquele que comandará o Ministério Público Federal (MPF) nos próximos dos anos. Dez senadores votaram contra a indicação de Aras.

Que as respostas de Augusto Aras soariam como música nos ouvidos dos senadores durante a sabatina na CCJ era algo esperado, até porque ninguém é incensado ao cargo adotando postura de confronto e contrariando interesses e convicções da classe política.

Diferentemente do que foi anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro durante o processo de escolha de um nome para a PGR, Aras disse que atuará com independência e criticou temas de interesse do Palácio do Planalto.

O novo PGR teceu elogios à Lei de Abuso de Autoridade, que teve dezoito vetos presidenciais derrubados pelo Congresso Nacional na terça-feira (24), alegando que “pode produzir um bom efeito”. Aras manifestou-se favorável ao compartilhamento de informações entre o extinto Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – agora Unidade de Inteligência Financeira (UIF) – e o Ministério Público, o que contraria decisão liminar do STF.

“Como é que vamos ignorar a doutrina clássica? Nós temos o dever de denunciar, de comunicar os ilícitos porventura existentes. Os auditores fiscais por isso estariam no dever de comunicar as eventuais irregularidades”, disse Aras ao ser questionado pelos senadores sobre as investigações do Coaf. Porém, se o novo PGR continuar defendendo o respeito à Constituição Federal, como fez na abertura da sabatina, esse compartilhamento dependerá sempre de autorização judicial, quando os dados não forem genéricos, mas amplos.

Mesmo assim, o tema é espinhoso para o presidente da República, que nos últimos tempos atuou intensamente nos bastidores para blindar o filho, Flávio Bolsonaro, senador pelo PSL do Rio de Janeiro, que está encalacrado no escândalo que tem o ex-assessor Fabrício Queiroz na proa.

Operação Lava-Jato

O sabatinado foi questionado diversas vezes sobre a Operação Lava-Jato, mas, mantendo o discurso anterior, defendeu as investigações, ao mesmo tempo em que criticou o chamou de “excessos”.

“Talvez tenha faltado nessa Lava Jato a cabeça branca, para dizer que tem certas coisas que pode, mas tem muitas outras coisas que nós não podemos”, afirmou Aras.

O subprocurador defendeu também a possibilidade de estender o modelo da Lava-Jato aos estados, sempre respeitando o princípio da impessoalidade. “Nós poderíamos fazer tudo como ele (Deltan Dallagnol) fez, mas com menos holofote, com menos ribalta”, disse.


Como esperado, Aras foi perguntado sobre o fato de seu nome não constar da lista tríplice, ignorada pelo presidente da República, algo que causou desconforto aos integrantes do Ministério Público Federal. O novo PGR criticou o corporativismo entre procuradores, alegando que se o “sistema” não estivesse contaminado pelo “fisiologismo, clientelismo e o toma lá dá cá” da lista, jamais haveria a hipótese de o Ministério Público “pensar” em criar uma fundação para controlar recursos recuperados pela Lava-Jato.

As críticas à Lava-Jato foram recebidas de maneira dual pelos membros da CCJ do Senado. Enquanto alguns senadores concordavam com Aras – como Renan Calheiros, Eduardo Braga e Cid Gomes –, parlamentares da chamada bancada “lavajatista” mostraram-se contrariados com as declarações. Um dos contrariados com as críticas de Aras à Lava-Jato é o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que há muito tenta emplacar a CPI da Lava-Toga, sem sucesso.

As críticas pontuais à Lava Jato agradaram senadores da oposição e parte da base do governo no Senado. Enquanto fazia ponderações sobre a atuação de Dallagnol, os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Renan Calheiros (MDB-AL) e Cid Gomes (PSB-CE) acenaram em sinal de concordância. Calheiros, alvo de inquéritos no Supremo, disse que a escolha do procurador-geral foi “a melhor decisão” do presidente Jair Bolsonaro.

Ao discordar do novo procurador-geral, Vieira disparou: “Concordo com a importância da experiência, mas citando o patrono desta casa, Rui Barbosa, não se deve deixar se enganar pelos cabelos brancos porque os canalhas também envelhecem”.

É importante salientar que não se pode defender a transgressão da lei por parte de agentes públicos, o que em muitos casos configura crime, em nome do combate à corrupção. Há no Brasil um movimento que despreza a aplicação da lei em sua inteireza e dentro dos próprios limites, mas favorável ao “justiçamento” a qualquer preço, o que difere de justiça.

Augusto Aras também criticou a proposta constante do pacote anticrime, de autoria do ministro Sérgio Moro (Justiça), que contempla o “excludente de ilicitude”, isenção de pena para policiais que provocarem mortes no exercício da função, o que na prática, considerando a realidade brasileira, é uma licença do Estado para matar.

“A excludente de ilicitude já estava prevista no Código Penal. Me parece que não teria maior necessidade do novo regramento, mas o júri político há de prevalecer”, disse o sabatinado.

Por outro lado, Aras defendeu uma proposta apresentada por Moro, a que prevê a prisão após condenação em segunda instância. Contudo, que é necessário que o processo “não suprima o direito a recursos e ao habeas corpus”.

Nesse ponto, Aras vai contra o próprio discurso em defesa do respeito à Constituição, que no artigo 5º, inciso LVII, estabelece que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

De tal modo, se a Carta Magna é a lei máxima do País, o que impede que interpretações ou malabarismo interpretativos abram caminho para que o texto constitucional seja reescrito de acordo com a conveniência do momento, a prisão em segunda instância é uma aberração jurídica que conta com a complacência de alguns operadores do Direito.