Decisão do Supremo sobre prisão em segunda instância restabelece as fronteiras entre os Poderes

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de, seguindo o que estabelece a Constituição Federal, barrar a prisão após condenação em segunda instância serviu para, pelo menos momentaneamente, estabelecer o equilíbrio entre os Poderes da República, em especial o Judiciário e o Legislativo, aviltados de forma constante pelo discurso de ódio e pela defesa do justiçamento a qualquer preço.

Alguns afoitos, que usam o conhecimento jurídico para, posando de derradeiros gênios da raça, defendem o atropelamento da Carta Magna apenas para saciar a sede pelo revanchismo ideológico, como se o País pudesse existir como um ringue ladeado pelo retrocesso e obscurantismo. Deliram sobre teses jurídicas que, atentando contra o texto constitucional, buscam impor à sociedade o pensamento obtuso e radical da “direita xucra” (o termo é da lavra do jornalista Reinaldo Azevedo).

Não há possibilidade de um povo existir como nação sem aceitar um conjunto legal, mesmo a sociedade sendo mutante, como de fato é, mas a Constituição atual, como lembrou o ministro decano Celso de Mello em seu voto, a Constituição atual não é obra do acaso nem arremedo de Carta para favorecer corruptos, mas fruto de longos debates e estudos durante a Assembleia Nacional Constituinte e tendo como um dos pilares a dissecação da história brasileira.

Direitistas, bolsonaristas, lavajatistas e outros quetais, após a decisão do STF, agora trabalham para emendar a Constituição como forma de garantir a prisão após sentença condenatória de segundo grau, como se possível fosse ignorar os direitos e garantias fundamentais do cidadão, tão bem explicitados de forma clara no texto constitucional, em cláusula pétrea.

Apesar da costumeira intifada dos descontentes, que insistem em atacar o UCHO.INFO de forma rasteira e covarde, inclusive apelando a fatos mentirosos, como tornou-se regra na república bananeira comandada por Jair Bolsonaro, a este portal não cabe defender corruptos e transgressores da lei, mas, sim, exigir respeito ao Estado Democrático e à Constituição.

Faz-se necessário ressaltar que não temos apreço ou simpatia por corruptos, pois se assim fosse não teríamos denunciado o esquema de corrupção que corroeu os cofres da Petrobras, assim como tantos outros, enfrentando consequências graves e das mais diversas.


A Constituição Federal tem defeitos, reconhecemos, os quais podem e devem ser corrigidos desde que cláusulas pétreas não sejam violadas apenas para contemplar a sanha persecutória de alguns, os quais erroneamente dizem ser “extensa maioria”, declaração que não traduz a realidade.

Para que o almejado pelos insanos seja possível, o caminho adequado é uma nova Carta Magna, algo descartado pelos radicais que miram justiça a qualquer preço, sem se preocupar com os direitos do cidadão. Em qualquer país democrático e responsável as garantias fundamentais são respeitadas incondicionalmente, pois só assim, ao fim e ao cabo, é possível fazer justiça, quando necessário.

Falar em impunidade no rastro da decisão do Supremo é prova inconteste de ignorância por parte daqueles que se esforçam para não enxergar a legalidade, até porque essa cegueira de ocasião é conveniente. Com 845,5 mil presos em todo o País, invocar tal tese configura leviandade, já que 4.895 detidos poderão ser beneficiados pelo novo entendimento da Corte. Mesmo assim, os casos serão analisados isoladamente, cabendo a decisão final ao juiz responsável pela execução da pena.

Dos 4.895 presos que poderão requerer o restabelecimento da liberdade, apenas 38 réus condenados no escopo da Operação Lava-Jato passaram a ter esse direito a partir da noite de quinta-feira (7), o que representa 0,08% do total. Contudo, é preciso destacar que nem todos serão contemplados pelo novo entendimento do Supremo. Se a comparação tiver como base o total de presos em todo o Brasil, esse percentual cai para 0,004%. Ou seja, não há impunidade, pelo contrário.

A questão que fermenta o debate colérico que está posto é o revanchismo ideológico cultivado por uma parcela da sociedade, que alega defender o combate à corrupção, que, como já ressaltamos, deve ser combatida com a aplicação da legislação vigente, o engajamento político e a constante vigilância da classe política por parte dos cidadãos. Sem essa receita não há combate à corrupção.

Aliás, se combate à corrupção fosse o desejo primeiro da população, o caso envolvendo Fabrício Queiroz e Flávio Bolsonaro não estaria parado à espera que a polemica seja deixada para as calendas. Mais uma vez afirmamos que em jogo está uma queda de braços pelo poder, entre direita e esquerda, sem que o Estado Democrático seja levado em conta.

A Constituição Federal de 1988, como mencionado anteriormente, tem falhas, é verdade, mas se ruim está com a Carta, pior sem ela. Para quem experimentou a tragédia decorrente da ditadura militar, retroceder é algo impensável quando o assunto é democracia. Em suma, é o que temos para hoje, lembrando que uma nação não muda à base do pé de cabra.