Alguns elementos para o entendimento do chamado cadastro positivo dos consumidores

(*) Rizzatto Nunes

rizzatto_nunes_05Como é sabido, a Lei n. 12.414, de 9 de junho de 2011, introduziu no sistema jurídico consumerista o chamado cadastro positivo, para disciplinar a formação e consulta a bancos de dados que contenham informações dos pagamentos dos consumidores (pessoas físicas e jurídicas e entes despersonalizados [i]) para formar um histórico de crédito individual.

A norma definiu uma série de itens fundamentais para o funcionamento e entendimento do cadastro, a saber: o banco de dados, o gestor, o cadastrado, a fonte, o consulente, a anotação, o histórico de crédito, e as informações a serem arquivadas.

Os bancos de dados podem armazenar informações de adimplemento do consumidor cadastrado visando formar o histórico de crédito dele. A regra estabeleceu as características das informações, que são basicamente as mesmas que estão dispostas no § 1º do art. 43 do CDC. Elas devem ser objetivas, claras, verdadeiras e de fácil compreensão e hão de possibilitar a feitura da avaliação da situação econômica do cadastrado.

Visando dar consistência às regras estabelecidas, a lei fixou a obrigação do gestor de, quando solicitado, fornecer ao cadastrado:

a) todas as informações sobre ele constantes de seus arquivos, no momento da solicitação;

b) a indicação das fontes relativas às informações de que trata a letra anterior, incluindo endereço e telefone para contato;

c) a indicação dos gestores de bancos de dados com os quais as informações foram compartilhadas;

d) a indicação de todos os consulentes que tiveram acesso a qualquer informação sobre ele nos 6 (seis) meses anteriores à solicitação; e

e) uma cópia de texto contendo sumário dos seus direitos, definidos em lei ou em normas infralegais pertinentes à sua relação com bancos de dados, bem como a lista dos órgãos governamentais aos quais poderá ele recorrer, caso considere que esses direitos foram infringidos.

Além disso, proíbe expressamente que o gestor estabeleça política, crie regras ou realize operações que impeçam, limitem ou dificultem o acesso do cadastrado às informações arquivadas.

Diz também a lei que as informações disponibilizadas nos bancos de dados somente poderão ser utilizadas para a realização de análise de risco de crédito do cadastrado, para subsidiar a concessão ou extensão de crédito e a realização de venda a prazo ou, ainda, outras transações comerciais e empresariais que impliquem risco financeiro ao consulente.

Por fim, diz que cabe ao gestor manter sistemas seguros de consulta por telefone ou por meio eletrônico, para dar aos consulentes as informações de adimplemento do cadastrado.

Quanto à fonte, estão fixadas uma série de obrigações. A fonte deve:

a) manter os registros adequados para demonstrar que a pessoa física, jurídica ou ente despersonalizado autorizou o envio e a anotação de informações em bancos de dados;

b) comunicar os gestores de bancos de dados acerca de eventual exclusão ou revogação de autorização do cadastrado;

c) verificar e confirmar, ou corrigir, em prazo não superior a 2 (dois) dias úteis, informação impugnada, sempre que solicitado por gestor de banco de dados ou diretamente pelo cadastrado;

d) atualizar e corrigir informações enviadas aos gestores, em prazo não superior a 7 (sete) dias;

e) manter os registros adequados para verificar informações enviadas aos gestores; e

f) fornecer informações sobre o cadastrado, em bases não discriminatórias, a todos os gestores que as solicitarem, no mesmo formato e contendo as mesmas informações fornecidas a outros bancos de dados.

Além disso, a lei proíbe expressamente que a fonte estabeleça política, regras ou realize operações que impeçam, limitem ou dificultem a transmissão a banco de dados de informações de cadastrados que tenham autorizado a anotação de seus dados.

Sobre o compartilhamento das informações arquivadas, o mesmo só é permitido se autorizado expressamente pelo cadastrado, por meio de assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada. O gestor que receber informações por meio de compartilhamento equipara-se ao outro gestor, isto é, ao que anotou originariamente a informação, inclusive quanto à responsabilidade, que é, no caso, solidária por eventuais prejuízos causados e ao dever de receber e processar impugnações e realizar retificações.

Já o gestor originário é responsável por manter atualizados os dados cadastrais nos demais bancos de dados, bem como por informar a solicitação de cancelamento do cadastro, sem quaisquer ônus para o cadastrado. O cancelamento do cadastro feito pelo gestor originário implica o cancelamento do cadastro em todos os bancos de dados que compartilharam informações. Desse modo, todos os bancos de dados ficam obrigados a proceder, individualmente, ao respectivo cancelamento.

O gestor deve assegurar a identificação da pessoa que promover qualquer inscrição ou atualização de dados relacionados com o cadastrado, registrando a data desta ocorrência, bem como a identificação exata da fonte, do nome do agente que a efetuou e do equipamento ou terminal a partir do qual foi processada a ocorrência.

É proibido ao gestor exigir exclusividade das fontes.

Ademais, anoto que, desde que autorizados pelo cadastrado, os prestadores de serviços continuados de água, esgoto, eletricidade, gás e telecomunicações, dentre outros, poderão fornecer aos bancos de dados, informação sobre o adimplemento de suas obrigações financeiras. No entanto, ficou vedada, expressamente, a anotação de informação sobre serviço de telefonia móvel na modalidade pós-paga.

E, quando solicitado pelo cliente, as instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil fornecerão aos bancos de dados indicados as informações relativas às suas operações de crédito. Essas informações somente podem compreender o histórico das operações de empréstimo e de financiamento realizadas.

Por fim, anoto que o banco de dados, a fonte e o consulente são responsáveis objetiva e solidariamente pelos danos materiais e morais que causarem ao cadastrado.

[i] O legislador esqueceu do ente despersonalizado, mas, evidentemente, ele também tem os mesmos direitos à proteção legal.

(*) Luiz Antônio Rizzatto Nunes é professor de Direito, Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP); Livre-Docente em Direito do Consumidor pela PUC-SP e Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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