Aplicativos enviam mensagens de pessoas que já faleceram

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Receber vídeo ou mensagem de um familiar morto há anos já é possível. SafeBeyond, Cake, Last Will and Testament e Everest, os chamados “aplicativos de morte”, prometem guardar as últimas vontades e até enviar mensagens de quem já morreu para os vivos.

Obviamente, os arquivos são escritos ainda em vida, armazenados e enviados aos destinatários, ou “herdeiros”, quando a morte é confirmada pelo administrador, que é alguém nomeado pelo usuário.

Se bem elaborado, o efeito será muito parecido com o que vemos no filme “P.S. Eu Te Amo”, de 2007.

Nos “aplicativos de morte”, você pode armazenar desejos, informações particulares, contas em banco e redes sociais e até versões digitais de documentos.

De acordo com Leonardo Zanatta, advogado especialista em direito digital, como esses aplicativos são desenvolvidos fora do Brasil, os atos de última vontade não possuem validade jurídica em território nacional. “Para ter validade jurídica, tem que ser reconhecido pela legislação brasileira”, explica Zanatta.

“Os aplicativos podem servir como vetor, como demonstração de interesse, mas para fim de testamento legal, reconhecido, podendo ser usado em juízo pelos interessados, ascendentes ou descendentes, eles não têm validade”, continua o advogado.

No caso de contas em banco, com o número do CPF é possível levantar as atividades do parente morto. Afirmar que é doador de órgãos apenas pelo aplicativo também não possui validade jurídica. “É só um mecanismo facilitador”, afirma Zanatta.

Mesmo que fossem desenvolvidos no Brasil, os aplicativos deveriam estar em conformidade com a lei para ter validade.

Dentre os “aplicativos de morte”, o SafeBeyond possui versão gratuita para Android e ‎iOS. O app está em inglês, mas é simples de usar e a barreira da língua não será um grande problema. Ele funciona sem entrar em contradição com a lei, diferentemente, por exemplo, do Last Will and Testament, que funciona em iOS e Android, que tem validade em algumas partes do Reino Unido.


A versão gratuita oferece 1Gb de armazenamento, que pode parecer pouco se você quiser deixar todos os recados em vídeo. É possível, contudo, economizar seu espaço armazenando os vídeos em outro lugar e enviando para seu “herdeiro” apenas o link com login e senha, se necessário.

O aplicativo traz quatro tipos de mensagens: datas, eventos, localização e redes sociais. Elas podem ser armazenadas em texto, link, foto, áudio ou vídeo.

Datas são referentes a aniversários e feriados, como Natal. As de eventos são predefinidas para casamentos ou formatura. As mensagens armazenadas em localização são disparadas quando o “herdeiro” chega em determinado local, como uma viagem para o Caribe. Já os recados da área de redes sociais são a sua despedida do mundo.

O aplicativo trabalha com uma questão emocional, no qual o sujeito que envia a mensagem já está morto, mas participa de alguma forma da vida dos que ficaram.

Mas há polêmica: esses recados são positivos ou só aumentariam a tristeza dos familiares e amigos? “Depende”, diz Ana Luiza Mano, psicóloga do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). “Quando falamos de pessoas, a resposta mais sensata é ‘depende’”.

“Em muitos casos seria benéfico, no sentido de ter um contato final com a pessoa que de alguma forma programou aquilo”, explica a psicóloga. “Por outro lado, se a mensagem for de um suicídio, pessoas que se matam e filmam, seria um pouco mais traumático”.

Ana Luiza lembra que há diversas fases de luto e que eles podem se alternar. O primeiro Dia das Mães depois da morte, o primeiro aniversário, o primeiro Réveillon, são datas em que a tristeza e a saudade ganham força.

Caso a opção seja por usar um “aplicativo de morte”, é imprescindível lembrar que está falando com quem convive com o luto e pode estar fragilizado. Quem não gostaria de parabenizar a filha que entrou na faculdade ou dar o último adeus à pessoa amada? Na era digital, temos a impressão de “criar um corpo maior, que se estende e se prolonga. Um pouco imortal, mesmo que seja simbólico”.

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