Chefe da Casa Civil licencia-se do cargo após amigo de Michel Temer afirmar que atuou como “mula”

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Ninguém submete-se a uma cirurgia de próstata por masoquismo explícito, mas a licença do ministro Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, pode ser por dor de barriga política. Coincidências existem em toda parte, exceto na Esplanada dos Ministérios, que há décadas transformou-se em catapulta de escândalos de corrupção e crimes correlatos.

Padilha é velho conhecido no meio político, sendo que alguns mais ácidos até fazem um trocadilho com o sobrenome do principal assessor do presidente Michel Temer, que começa a ver seu governo desmoronar. Isso porque a prometida “ponte para o futuro” vem se transformando lenta e continuamente em pinguela na direção da obscuridade do passado.

O anúncio da licença de Eliseu Padilha acontece horas depois da divulgação d e trechos do depoimento de José Yunes no âmbito da Operação Lava-Jato. Amigo de quase cinco décadas do presidente da República, Yunes até outro dia ocupava cargo de assessor especial no Palácio do Planalto, mas acabou “descendo a rampa” após ter o nome citado por um dos delatores do grupo Odebrecht. Essa conjunção de fatores escandalosos fermentou a receita palaciana e pode ter consequências imprevisíveis.

De igual modo, a saída temporária – pode ser perene – de Padilha acontece horas depois de a Polícia Federal deflagrar a Operação Blackout, 38ª fase da Operação Lava-Jato, em que os alvos foram dois operadores financeiros supostamente do PMDB: Jorge Luz e Bruno Luz (pai e filho, respectivamente), que estão no exterior. As investigações mostram que a dupla repassou ao PMDB US$ 40 milhões em propina, sendo que a maior parte do dinheiro foi destinado a senadores da legenda.


José Yunes, por sua vez, disse à força-tarefa da Lava-Jato que recebeu em seu escritório de advocacia, em São Paulo, um envelope a pedido de Padilha. O amigo do presidente Michel Temer afirmou às autoridades que não abriu o envelope enviado pelo doleiro Lúcio Bolonha Funaro, mas que no episódio em questão atuou como “mula” de Padilha.

Em depoimento de colaboração premiada, Claudio Melo Filho, ex-executivo da Odebrecht, afirmou que Yunes recebeu em seu escritório R$ 4 milhões em espécie, como parte de pagamento de propina (RS 10 milhões) ao PMDB. José Yunes, por sua vez, também em depoimento, detalhou o episódio, relatando que desconhecia o conteúdo do envelope, mas apenas atendeu ao pedido de receber a encomenda.

Nesse ponto é preciso voltar aos tempos de colégio, mais precisamente às aulas de Física, que entre tantas teorias traz a de que dois corpos não ocupam o mesmo espaço. Pois bem, é difícil saber quem está a mentir nesse imbróglio, mas um envelope grande o suficiente para abrigar R$ 4 milhões, em dinheiro vivo, é de fazer inveja a alguns superlativos objetos de Itu. Dinheiro vivo, no submundo do caixa 2, significa uma nota debaixo da outra. Como no Brasil a cédula de maior valor é a de R$ 100, Yunes teria recebido 40 mil cédulas.

Não se trata de defender José Yunes, Eliseu Padilha ou Cláudio Melo Filho, mas alguém está a faltar com a verdade, enganando as autoridades que investigam os crimes cometidos à sombra do Petrolão, o maior e mais ousado esquema de corrupção de que se tem notícia. Melo Filho em tese não pode mentir, Yunes não tem foro privilegiado e Padilha por enquanto está blindado pelo cargo, ao qual pode não mais retornar. Em suma, o sol nasce para todos, mas no formato quadrado é para poucos.

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