Se você…

(*) Lígia Fleury –

ligia_fleury_04Às voltas com as mesmas questões que envolvem a educação das crianças e jovens; não as mesmas questões de sempre, mas as de algumas décadas. Pode ou não pode? Lição de casa ajuda ou sobrecarrega? Tem horário para dormir? Pode ser malcriado? Com que idade se aprende a arrumar a cama? Pode jogar vídeo game todos os dias? Internet liberada?

Embora para muitos as respostas sejam óbvias quando se trata de limite, tenho percebido que há mais inversão de valores e de papeis do que se imagina. São crianças mandando nas casas, são adolescentes ditando as regras, são pais com medo dos filhos. E não se trata de um espaço em particular; vemos isso em todas as regiões do Brasil, em diversos locais do planeta.

Enquanto em alguns lugares, o respeito é o valor mais bem trabalhado desde o seio materno, em outros ele fica refém da não possibilidade do adulto em fazê-lo existir, em significar sua importância.

Criança que é atendida imediatamente após a manha, aprende rápido como ter o comando; criança que reclama que tem lição de casa e os pais endossam a queixa, aprende muito rápido que ela decide o que quer e o que não quer fazer, com o aval dos pais, o que é pior.

Quando falamos em formar seres autônomos, sabemos que autonomia se aprende, se adquire, que não nascemos autônomos. A vida nos cobra autonomia, mas autonomia está diretamente ligada à responsabilidade e responsabilidade tem a ver consigo próprio, com o outro, com o espaço social, a divisão do público e o cuidado com o privado. Adultos que não colocam limites para as crianças, certamente não as ajudam a crescer nestes aspectos.

Criança não sabe dizer quais as conseqüências do tudo pode para sua vida futura; não têm como prever a confusão social quando se confunde liberdade com libertinagem. O adulto sabe, porque já viveu algumas etapas, faz leitura de mundo e tem, ou deveria ter, consciência de regras que devem ser respeitadas para uma qualidade de vida em sociedade.

Criança pode escolher o sabor do sorvete, mas não pode decidir se irá saboreá-lo antes ou depois das refeições. Horário para fazer refeições, para ir e voltar dos compromissos, dormir ou brincar precisam ser estipulados e dosados pelos adultos, além de cobrados.

Quando um aluno em idade escolar chega atrasado à escola, a culpa é sempre do adulto responsável, seja porque “não consegue tirá-la da cama”- sim, por mais absurdo que pareça, isto é mais comum do que se imagina; seja porque “ tinha trânsito” – conhece-se a distância, então saia mais cedo; ou porque “foi a uma festa ontem e dormiu tarde” – escola em primeiro lugar, se quer ir à festa, arque com as conseqüências e encare o horário do dia seguinte.

Adultos sabem disto e devem explicar às crianças os motivos. Lição de casa é importante para o hábito do estudo diário, a parte que cabe fazer em casa; precisa ser dosada pela escola e respeitada pela família.

Organizar o material escolar e arrumar a cama ou os brinquedos é uma atitude de extrema importância para o desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade; cada um cuida do que lhe pertence e isso se aprende ainda pequeno. Se você fizer lição, ganhará… se você arrumar seu quarto, ganhará…

Não, não é assim que funciona. Não se recompensa pelas obrigações. Direitos adquiridos para deveres cumpridos.

O mais sensato é sempre ensinar os deveres e partilhar os direitos. Criança não manda. Criança aprende e ensina. Adulto orienta e determina limites, sem medo. Então, se você fizer suas tarefas, se você souber respeitar a todos, se você souber brincar com seus amigos e se você souber reconhecer o amor de sua família e a importância de seus professores em sua vida…você estará com as portas abertas para uma vida regrada, de aprendizado e de alegria, uma vida digna.

Não é isso que queremos para nossos pequenos? Então, façamos nossa parte, sem medo.

São crianças precisando de limites para crescerem. Se você quiser um mundo melhor, dê o seu melhor exemplo para elas; se você cuidar, elas saberão cuidar de si e do mundo.

(*) Lígia Fleury é psicopedagoga, palestrante, assessora pedagógica educacional, colunista em jornais de Santa Catarina e autora do blog educacaolharcomligiafleury.blogspot.com.

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