(*) Marli Gonçalves
Flap, flap, flap! O tempo voa. Passa, passa. Mas tem horas que a impressão clara é que pioramos, andamos para trás, ou que nada muda. Proponho que a gente pire, mas realize. Solte a franga, faça alguma revolução!
Ando meio de saco cheio de tudo isso aí. Isso aí, tudo isso aí que a gente ouve no rádio, vê dia após dia nos telejornais, lê nos jornais e na internet, e escuta da boca-a-boca da voz rouca de tanto gritar das ruas. Adianta? Não parece disco riscado?
Acho que anda na hora de voltar a fazer um movimento tipo louco, tipo tropicalista, Odara, para lá de Marrakesh, no nukes, Love and peace. Ou um novo iê-iê-iê. Novos beatniks, talvez. Ou uma Semana de 2010, “Os Polemistas”. Talvez se começássemos a escrever livros existencialistas, vestidos de parangolés. Naquela época, final dos 60, embora eu ainda fosse bem pequena, via que era tudo mais ágil, mais divertido, as coisas aconteciam mesmo que debaixo de porrada. O mundo inteiro andou, mal ou bem, mas andou. Ali na Rua Augusta, onde me criei, a história passava. TV Excelsior, Teatro Record, Medieval, Cine Marachá. Denner, Clodovil. Onde ela, a história, o tempo, passa hoje? Vai compor o quê? A Garota da Daslu? Ou “Como pode um presidente viver fora da realidade?/ Como pode um presidente vestir tantas fantasias? /Como poderemos viver?/ Como poderemos viver?/ Sem a sua,/ sem a sua,/ sem a sua consciência?”…
Agora o mundo só marcha, só roda. A gente fica velho, o tempo passa, e nada de novo, empolgante e verdadeiro acontece. Como diria meu querido Gabeira, nada muda para o povo que fica ali fumando o mesmo baseado, vendo o mesmo pôr-do-sol. Isso quando não se acaba logo, se enchendo de crack e álcool. Só isso, morrendo sem deixar nem história alguma, façanha, nem nenhuma obra de arte. Usaram o tempo para o nada.
Não era assim. Era divertido acompanhar a mudança (e o choque) de costumes, de moral, assistir a debates, até filmes suecos nos entretinham nos pequenos cineclubes. A loucura de Jimmy, de Janis, de Brian, Morrison. Os clássicos de Buñuel, Bergman, Louis Malle. A moda de Mary Quant, a magreza de Twiggy, Paco Rabanne e seus metais. Tudo isso está aí ainda! João, Jobim, Caetano, Gil, Roberto, Wanderléia, Erasmo, Ronnie Von, Jair, Beatles, Rolling Stones. Esses todos e marcas estão aí comemorando 50 e alguns anos de carreira. Tudo firminho. Só pode ser porque eles eram e são melhores do que o que se faz hoje. Tudo tão rápido, tão diferente, que quando a gente fica sabendo já está morrendo.
Quem aguenta ainda ouvir falar de Amy Winehouse? Como é mesmo o nome do “da bandana”, o… Axl Rose? E o que esses modernos fazem de diferente? Mostram seus Montes de Vênus. Muita tatuagem. Casam e descasam. Levam e dão porrada. Exibem o peito “másculo” ou o “cofrinho”, e saem e entram no armário com uma facilidade invejável. Será que pensam? Sabe que eu não sei, acho que não? Qual é o legado?
Há muitos tempos. Nem todos musicais, nem todos modernos. O tempo voa. O tempo anda. Passa. Precisamos de tempo para fazer. E o tempo que vai fazer é calor, frio, sol, chuva. Damos um tempo ou ficamos um tempo em nossas relações afetivas. Tomamos um tempo uns dos outros. Temos o tempo do futebol, o primeiro, o segundo, e os dos outros esportes, alguns com nomes mais sofisticados para o mesmo tempo. Há tempos e temporadas. De verão, de inverno, de moda, de férias, de caça; de sermos caçados. Ficamos um tempo. Crianças de colo, por exemplo, não têm a noção de tempo, e adultos podem perdê-la, quando portadores de certas doenças neurológicas e ou psiquiátricas.
Dá um tempo! A linda ampulheta vira e desvira, inclusive na mão da Morte. Tudo gira em torno dele, da Física das pelancas, das extremidades que crescem, à Religião. Do tempo que precisamos para curar nossos males e nossas angústias, assim como nossas crises. O tempo de secar a espinha do rosto, cicatrizar a alma, cicatrizar onde guardamos todos os nossos tempos vividos.
Tudo isso dito só para te desejar um Feliz Réveillon do segundo semestre. Chegou.
Para dar tempo de você programar seu tempo. E, quem sabe, encaixar uma revolução na agenda?
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo…
Oração ao Tempo, Caetano Veloso
São Paulo, perto do 31-junho-1-julho, 2009
Marli Gonçalves é jornalista com diploma e tudo. Saudosista, sim, mas do que foi bom para todo mundo. Do tempo em que diversidade também incluía as liberdades de pensamentos, e a possibilidade de nadar contra a corrente. E em que nada disso precisava ser discutido. Só vivido.