(*) Fabiano Marques de Paula –
Criadas por meio de lei, sob a forma de autarquia especial ou outro ente da administração indireta, as agências reguladoras foram concebidas com o intuito de fiscalizar e regular a atividade de inúmeros setores da economia; eliminar a exclusividade, do Estado, na exploração dos serviços públicos, e introduzir o regime de competição, modificando a função do Estado de provedor a regulador de serviços. A medida garantiria maior concorrência e transparência dos atos e da política setorial, garantindo uma moderna e eficiente infraestrutura na sociedade em geral.
No entanto, não é o que se depreende das notícias veiculadas na imprensa, que apontam serem os serviços regulados, os problemas mais demandados pelos consumidores; denotando a ineficiência de sua atuação.
É fundamental, que o poder público exija mais qualidade do serviço, que participe de forma eficaz e efetiva no processo regulatório, que garanta a transparência das medidas e das decisões, enfim, que se torne instrumento de garantia do interesses e dos direitos difusos, conciliando a esfera privada, com o interesse público, individual e de toda coletividade.
As vésperas de completar o 50º aniversário da declaração dos direitos fundamentais do consumidor, por John Kennedy, que são: direito à segurança, informação, opção e o direito a ser ouvido; vivemos quase um retrocesso, pois muito embora o direito do consumidor seja internacional e institucionalmente reconhecido, nos parece que o direito à informação e o de ser ouvido, pelo menos por parte das agências reguladoras, é ofuscado, porque não dizer, tolhido. A massificação do consumo agravou o distanciamento da informação suficiente.
As agências devem abrir o debate, garantir a participação da sociedade civil nas discussões dos assuntos, garantir clareza, transparência e publicidade de todos os seus atos e ações, propiciando maior segurança e participação no processo regulatório; o que não ocorre atualmente vez que estas se restringem a colocar as questões de forma técnica e com prazos exíguos para contribuição.
Parte deste papel é exercido pelo Legislativo, com a promulgação de leis, das quais cito: a Lei do SAC, que possibilitou atendimento mais célere e eficaz aos consumidores, a Lei do Bloqueio de Telemarketing que viabilizou cessar os abusos cometidos por estas empresas, a Lei da Entrega, que garantiu atendimento mais digno e respeitoso ao cidadão consumidor; e pelos órgãos de defesa do consumidor e entidades civis, com a interposição de inúmeras ações civis públicas, para garantia dos direitos previstos na Lei nº. 8.078/90.
É cediço que, embora tenham ocorrido avanços na defesa e na tutela dos consumidores, ainda existem muitos desafios a serem enfrentados.
As agências devem exercer o papel de aproximar, de dialogar entre pólos tão distintos, possibilitar que o cidadão consumidor seja ouvido e compreenda, não apenas seu papel, como também o das agências na promoção de sua defesa e do equilíbrio no mercado de consumo.
Cito aqui, importante papel a ser desempenhado pelo Poder Legislativo, como de, por exemplo, acompanhar através de uma comissão paritária, as atividades das agências reguladoras. Deve o Estado ser o instrumento efetivo da garantia dos direitos da coletividade, ordenando as atividades econômicas em direção ao respeito aos direitos básicos do consumidor.
O artigo 170 da Constituição Federal estabelece que a atividade econômica deve observar, entre outros, o princípio de defesa do consumidor; este não dirigido somente ao Estado mas, principalmente, aos agentes econômicos.
Faço aqui um importante recorte no papel do consumidor no mercado de consumo, visto que, há mais de 20 anos, as relações ganharam outra dimensão, o consumidor consciente de seus direitos, passou a ser mais exigente e a pleitear produtos e serviços com segurança e qualidade.
O código, nas palavras de Ricardo Morishita, “é uma lei da vida. Ele não é uma lei da teoria. É uma lei que empresta dignidade a cada ato de milhões de brasileiros, todos os dias. E foi um pacto extraordinário, com o qual se disse, principalmente para o mercado, que o lucro deveria ser decorrência da competência; que o lucro deveria ser resultado do trabalho e não do engano, da má-fé, da deslealdade ou da falta de transparência. É portanto, um eco de civilidade da sociedade brasileira”.
O desafio que se coloca é a capacidade de ver as pessoas em toda sua dimensão ontológica e não como simples e abstratos pólos da relação jurídica, tão pouco como objetos manipuláveis pelos interesses econômicos.
Se a democracia depende da economia, a economia depende do consumidor.
(*) Fabiano Marques de Paula, advogado, é superintendente do Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo (Ipm-SP), autarquia vinculada à Secretaria da Justiça.