Desafetas como irmãs siamesas, esquerda e direita usam a imprensa para encenar uma ópera bufa

    (*) Ucho Haddad –

    Fugindo dos seguidos escândalos de corrupção e tráfico de influência que há longas décadas dão o tom da política brasileira, as manchetes internacionais da semana que passou bambearam sobre um velho e conhecido tema: a tentativa oportunista da esquerda de torpedear a direita e vice-versa.

    O primeiro assunto que deu aos esquerdistas a chance de apedrejar a direita foi o escândalo dos grampos telefônicos envolvendo o finado “News of the World”, jornal sensacionalista britânico que integrava o império de Rupert Murdoch, magnata das comunicações. Na esteira do imbróglio surgiu o nome do primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron, cujo ex-porta-voz, Andy Coulson, foi preso sob a acusação de envolvimento no caso que culminou com o fechamento do jornal. Ex-editor do “News of the World”, Coulson, que durante longo depoimento negou ter conhecimento da bisbilhotagem realizada por jornalistas do tabloide inglês, foi liberado horas depois mediante o pagamento de fiança.

    Na terra em que os súditos vivem prensados entre a sisudez do liberalismo conceitual e o conto de fadas que uma realeza preguiçosa e aproveitadora protagoniza há séculos, sobrou assunto para que os esquerdistas empunhassem o estandarte da ética e cobrassem providências em relação à imprensa local, quiçá essa manifestação proselitista não se espalhe rapidamente pela Terra, contemplando as ditaduras de esquerda que surgiram na última década e fincaram pé principalmente na América Latina. Até porque, controlar a imprensa é o primeiro dos sonhos de consumo de qualquer ditador gauche, a começar pelos mais mambembes deles.

    No Brasil, país que em tese vive sob o regime democrático, o que aconteceu na Terra da Rainha não é novidade, como de maneira alguma pode ser considerado exclusividade da direita. Na verdade, a esquerda verde-loura é “useira e vezeira” desse tipo de ação, pois do contrário muitos dos escândalos que surgiram nos últimos anos jamais teriam chegado ao conhecimento público. Por certo surgirão incautos querendo saber por quais razões a esquerda patrocinaria um autoflagelo, mas a resposta é muito simples e rápida. Mesmo que para muitos pareça um reles jogo de palavras, o poder é podre. O poder se alimenta da própria podridão. E a riqueza que flui em seus escaninhos é que alvoroça a cobiça de nove entre dez seres humanos, que facilmente deixam de lado a ideologia e a moral por causa de tostões imundos. Tudo no melhor estilo “Cavalo de Tróia” tupiniquim, procedimento que sob a ótica burlesca é conhecido também como “fogo amigo”.

    O segundo episódio da semana que serviu como tônico para o discurso esquerdista contra a direita surgiu na pacata Noruega, onde um tresloucado, Anders Behring Breivik, assumiu a autoria de dois atentados, que na última sexta-feira, 22 de julho, deixou 92 mortos e 97 feridos, por enquanto, em Oslo e em ilha próxima à capital norueguesa. Breivik, que segundo seu advogado acredita na necessidade dos dois atentados, mesmo reconhecendo a atrocidade dos seus atos, foi rotulado pela imprensa como integrante da extrema-direita norueguesa. Um ato simplista e galhofeiro dos veículos de comunicação, que abrem flanco para o ufanismo criminoso da esquerda festiva, que sempre abusa do discurso fácil e rebuscado, eternamente patrocinado pelo ócio contemplativo.

    O que se tenta na Europa, mais uma vez, com o episódio norueguês é reforçar a tese boquirrota de que é necessário combater a lufada islâmica que sopra sobre o Velho Continente. Trata-se de uma bobagem desmedida por parte da esquerda, que busca implantar em terras europeias o que foi aniquilado com queda do Muro de Berlim: a esquerdização cultural, como forma de ressuscitar por lá o que por aqui, na América Latina, consome-se aos bolhões. O modelo utópico e criminoso da ditadura civil. Em outras palavras, é burra e fanfarrista a tentativa da esquerda de debruçar sobre Breivik a cangalha da direita.

    O erro crasso está em mostrar ao mundo, de maneira vergonhosamente obtusa, que o criminoso norueguês Anders Bhering Breivik é um adepto confesso do sionismo cristão, quando para a imprensa local ele é um ativo defensor dos ideais nazistas. Ortodoxia, em qualquer segmento, é algo assustador. De nada adianta essa troca transversa de acusações, pois o que o homem mais precisa é buscar o equilíbrio do pensamento e consequentemente de suas ações. Por questões outras, não desconhecidas, a busca pelo poder proporciona essa briga que é propulsada por discursos antagônicos e desconexos.

    A exemplo do que ocorre diariamente em qualquer parte do planeta, Anders Bhering Breivik, um psicopata no auge da crise, buscou fama ao praticar atos criminosos. E como estratégia de defesa usará ideais políticos como escudo para se proteger das sentenças condenatórias, quando a pena maior e única deveria ser a residência fixa e permanente em um hospício qualquer da Noruega.

    No contraponto, até porque na esquerda e na direita não há quem seja imbatível o tempo todo, o discurso ganha o caminho inverso quando o assunto é o plano de Barack Obama para aumentar o teto da dívida norte-americana. Democrata e primeiro negro a chegar à Casa Branca, Obama é visto pela direita ianque como um esquerdista que alcançou o poder no vácuo dos discursos até então sufocados do sindicalismo local. E a retomada do poder é a principal meta do cardápio dos republicanos.

    Até agora, Barack Obama não vislumbrou no seu caminho rumo à reeleição qualquer adversário capaz de derrotá-lo. Por conta dessa notada ausência de um nome à altura, os republicanos decidiram endurecer o jogo no Congresso ianque, dificultando ao máximo a aprovação do plano que servirá como antídoto para a peçonha que eles próprios produziram em tempos pretéritos. Basta voltar no tempo e buscar o nascedouro da crise que ora coloca a Terra do Tio Sam diante de inusitado e histórico aperreio econômico.

    Inviabilizar a solução para a crise dos Estados Unidos, o que produzirá efeitos devastadores que singrarão os mares com destreza torpe para aniquilar economias e gerações, será mais um capítulo dessa batalha burra e milenar que a esquerda e a direita travam sem cessar, sempre ao som macabro de um aboio fantasmagórico que dissemina soluções teóricas que nunca alcançam a seara da realidade.

    A sabedoria popular garante que na vida há coisas e fatos que são correlatos, conexos. No campo da filosofia é possível afirmar, entre borbulhas discursivas e sem devaneios, que são interdependentes. Traduzindo para o bom e velho idioma da nossa descontrolada Terra de Macunaíma, a esquerda e a direita se merecem, ao mesmo tempo em que uma não sobrevive sem a outra e vice-versa. E o mundo que se cuide, pois essa trova salivante e interminável será capaz de riscar a Humanidade do mapa.