(*) Ucho Haddad –
Quando fui apresentado oficialmente ao futebol, não aquele que com os amigos de infância jogava nos campinhos de terra próximos de casa, tentei compreender o que ao longo dos anos caminhou na direção do incompreensível. Trilha idêntica seguiu o torcedor, que por questões diversas sempre se portou como verdadeira Amélia diante das apresentações do time do coração. A situação piora ainda mais quando entra em campo a seleção brasileira, que em tempos mais inocentes transformou-se em uma espécie de patrimônio nacional.
Certa vez, o polêmico Nelson Rodrigues disse que “a seleção é a pátria de chuteiras”. Até a adolescência concordei literalmente com Nelson Rodrigues, mas as imagens da Copa de 70, que ainda povoam a minha memória, me obrigaram (e ainda me obrigam) a concluir que patriotismo no Brasil é conversa fiada. Quando muito, alguns brasileiros, preguiçosos como sempre, se lançam ao patriotismo sem sair do sofá da sala. E esse tipo de manifestação de amor à pátria é algo semelhante a uma dessas meteóricas e canibais paixões de lupanar.
No embalo desse cenário degradante que o futebol proporciona aos apaixonados pelo esporte mais popular do planeta, muitos são os jornalistas e comentaristas esportivos que na coxia torcem contra a seleção brasileira. E o fazem camufladamente, à boca pequena. Sem medo das críticas, torcer contra o onze canarinho é algo que faço de forma escancarada e consciente. É verdade que muitos questionam tal postura, mas confesso que não encontrei na árvore genealógica da família nenhum ascendente com aptidões circenses.
Desde o tropeço da seleção brasileira na Copa América, na Argentina, tentei por diversas vezes escrever um artigo sobre o tema, mas preferi acompanhar a disputa pelo título da competição, entre Uruguai e Paraguai, para, antes de qualquer palavra, não ser leviano com aqueles que se acham os maiorais e acreditam que qualquer penteado diferente é sinônimo de bom futebol. O que não significa que os gênios da bola não podem dar às próprias cabeleiras esculturas ousadas.
Como sempre acontece, parte da imprensa brasileira se dedica a enaltecer uma equipe que oferece ao torcedor angústias e decepções. E tudo isso acontece porque há muito dinheiro em jogo. Nem de longe esses mercadores da notícia conhecem a dura realidade dos brasileiros, em sua maioria ludibriados pelas armadilhas midiáticas. Enquanto os jogadores erraram a cobrança de quatro pênaltis diante do goleiro paraguaio, o técnico Mano Menezes arrumava uma desculpa para o fiasco. Após chamar para si a responsabilidade pela péssima campanha na Copa América, Mano creditou ao gramado os erros dos seus comandados. Para reforçar a farsa, o técnico disse que o time evoluiu.
Mano Menezes, treinador cuja trajetória revela sua competência, pode dizer o que bem quiser, mas o torcedor brasileiro não pensa de maneira tão simplista. No domingo (17 de julho) em que o Brasil caiu diante da muralha paraguaia, presenciei a angústia de alguns torcedores da seleção. Em pé, sentados sobre banquetas, encostados no balcão, andando sem parar por causa do nervosismo. Postados diante de um televisor ligado em um dos muitos bares mequetrefes de beira de estrada que existem pelo Brasil afora, aqueles humildes apaixonados pelo futebol sofriam diante do fraco desempenho da seleção. Algo que mais uma vez não me surpreendeu, pois quem veste a camisa da seleção só pensa nos dividendos financeiros da convocação.
A vitória do Uruguai sobre a seleção paraguaia, o que lhe rendeu o 15º título da Copa América, confirmou os prognósticos, mas deixou uma lição importante aos brasileiros. Oscar Tabárez, treinador da “Celeste Olímpica”, é o comandante de um projeto que, além do futebol, cuida da formação dos atletas que vestem a camisa da atual melhor equipe da América do Sul. Cada um dos jogadores aprende como se comportar principalmente fora de campo, o que os da seleção verde-loura simplesmente desconhecem.
Se tivesse conhecido aquela gente que comigo dividiu alguns instantes naquele boteco em estrada do interior paulista ou, então, assistido à apresentação dos uruguaios no Estádio Monumental de Núñez, em Buenos Aires, Nelson Rodrigues por certo não teria se lançado à ousadia de afirmar que a seleção brasileira é a pátria de chuteiras. E é por isso, com a devida licença de Nelson Rodrigues, que torço contra a seleção. E daí?