Ex-senador Osmar Dias quebra o silêncio e diz que crise surgiu antes de Dilma Rousseff

Ouvir mais – Após dezesseis anos no Senado Federal, o paranaense Osmar Dias diz estar feliz com a distância momentânea da política. Atualmente, Dias é vice-presidente de agronegócios do Banco do Brasil. A sua diretoria controla 42% de todo crédito oferecido pelo banco. São mais de R$ 140 bilhões divididos entre 5 milhões de clientes.

Desde a derrota nas eleições para o governo do Paraná, em outubro de 2010, Osmar Dias não concedeu entrevistas sobre a campanha. Quebrou o silêncio para o repórter André Gonçalves, do jornal “Gazeta do Povo”. Elogiou a presidente Dilma Rousseff, mas disse que ela precisa ouvir mais opiniões externas. Sobre a gestão Beto Richa (PSDB), o ex-senador foi mais além. “Tenho visto o Beto falar muito mal do governo passado. Mas isso não é suficiente para ele cumprir os compromissos que assumiu”.

Quando senador, o senhor costumava citar uma colocação do seu pai de que o filho havia abandonado a “melhor profissão do mundo” (agricultor) para dedicar-se à “pior” (político). Essa nova tarefa no BB é uma volta às origens?

Aqui eu posso ver os resultados do trabalho com mais rapidez e clareza. No Legislativo, você trabalha anos a fio para elaborar e aprovar um projeto e os resultados muitas vezes não são dimensionados pela sociedade. No banco, quando você participa de uma decisão sabe que ela está influenciando na vida de milhares de pessoas e vê o resultado. Para mim, tem sido uma nova escola de vida. Quando cito meu pai é com muito orgulho porque ele falava da agricultura com prazer, nobreza. Mas acho que ele até errou quando me aconselhou a não entrar na política. Hoje eu avalio que cumpri minha missão no Senado com a maior correção possível.

Tem sido possível conciliar o trabalho no BB com a política?

Eu não tenho me dedicado à política. Tenho me dedicado apenas aos assuntos da agricultura brasileira, aos assuntos do banco. Não tenho participado nem das reuniões do partido. Tenho procurado delegar minhas posições aos outros colegas do PDT, que podem fazê-lo com mais tempo que eu. Até porque o estatuto do BB é bastante rigoroso com relação a isso. Eu sou de cumprir as regras do local em que trabalho.

Tem feito bem ao senhor essa distância da política?

Muito bem. Estou bastante aliviado. Creio que era um direito que eu tinha depois de tanta luta na política, trabalhando de uma forma que talvez não seja a mais tradicional. A convencional é a política de favores, que eu nunca fiz. Eu precisava de um tempo para pensar, para refletir a respeito do meu passado e também sobre o futuro.

Como o senhor avalia o governo Dilma?

Se você olhar os projetos que a presidente lançou e os que estão em desenvolvimento percebe que são ideias que aperfeiçoam tudo o que foi feito no governo Lula, quando houve um avanço significativo na área social e na distribuição de renda do país. Se fosse apenas isso o destaque na mídia, a gente chegaria à conclusão de que é um governo excelente. Só que esses feitos têm sido prejudicados pela crise financeira internacional e pela crise política. Só que essa crise política não é de agora e a presidente tem tomado atitudes enérgicas. Eu confio que uma limpeza será feita. Isso precisa ser feito de forma impiedosa. Não dá para ser complacente com a corrupção. Mas ela está agindo dentro da forma que é possível fazer.

É possível levar essa faxina adiante?

Ela vai precisar de muito apoio da sociedade, que precisa ficar em cima do Congresso. E o governo precisa do apoio do Legislativo. Isso é uma coisa séria, não é só um argumento para evitar CPI. É uma questão de estabilidade, de governabilidade. O que não pode haver é a troca de favores dos partidos no sentido de não permitir a investigação. Estamos passando por uma crise de honestidade. Precisamos ter em mente que não há corrupção sem corruptor. É preciso haver conscientização dos eleitores. A generalização de que todos os políticos são desonestos ajuda exatamente os desonestos. Esse é um erro muito grave. Hoje eu não sou congressista e posso dizer de fora que lá tem muita gente séria. A mídia deveria dar mais crédito a essas pessoas, porque caso contrário não vale à pena ser político.

Para o senhor ainda vale à pena?

Vale. Só o crivo pelo qual eu tive de passar para ser admitido na minha função aqui no banco já prova que eu sempre fiz as coisas direito. Não é todo político que cumpriria as exigências formais para estar aqui. Mas vai valer mais à pena quando a sociedade começar a apartar os bons e os maus políticos.

E a questão do loteamento político do governo?

Eu sou contra o critério de que os partidos que apoiaram a presidente na eleição precisam ter uma participação porcentual no governo. Esse critério é que dá margem a esse tipo de comportamento de alguns partidos.

Mas o partido do senhor também se beneficiou do loteamento, não?

Eu não estou aqui pelo meu partido. Se fosse pelo PDT, eu nem estaria. O meu partido tem um ministério [do Trabalho], mas no meu entendimento é um erro.

Então o senhor não faz parte da “cota” partidária, é isso?

Não. Eu não aceitaria estar aqui se não fosse pelo conhecimento que eu tenho da agricultura. Se eu tivesse a mínima impressão de que estou no cargo meramente por uma questão política, compensatória, eu não estaria aqui.

E é possível “deslotear” o governo?

É possível. A oportunidade para começar é quando um partido faz uma nomeação equivocada. Se indicou errado, não pode indicar de novo. Quem foi eleito para comandar o país foi o presidente. O grande salto que a presidente Dilma poderia dar era escolher um conselho político para ajudá-la a escolher pessoas para governar o país com mais qualidade. Digo mais: ela deveria formar um grupo de pessoas que não fosse ao palácio só para fazer média, para agradar. Mas que tivesse o direito de dizer para ela o que poderia ser feito de melhor que o que já está sendo feito. Ninguém pode prescindir de sugestões e críticas.

O senhor acha que as pessoas não conseguem chegar até ela?

Eu acho que o cargo de presidente cria uma dificuldade para as pessoas dizerem o que pensam para a presidente. Ainda mais pelo estilo da presidente Dilma. É um estilo que muitas vezes deixas as pessoas assim: “se eu falar, ela vai ficar brava”. Não importa se vai ficar brava. Às vezes a pessoa pode contribuir com uma crítica muito mais do que com uma bajulação. A presidente não precisa de bajulação. Ela poderia ter algumas pessoas graduadas, ainda que sem cargo no ministério, que pudessem ser chamadas para opinar e fazer críticas.

O senhor integrou a base dos governos FHC e Lula e criticou ambos. Falta esse tipo de postura?

Quando eu fiz críticas ao governo Fernando Henrique e estava no PSDB diziam que eu era incoerente. Incoerente é aceitar tudo como vaca de presépio. Quando eu critiquei o Lula, os jornais publicaram depois para questionar que ele estava me apoiando na eleição do ano passado. Mas será que os dois eram infalíveis, que não mereciam ser criticados? Eu não tinha o direito de falar o que eu pensava? Quando eu assinei a CPI da Corrupção [em 2001] e o Fernando Henrique me chamou no palácio para retirar a assinatura, ele estava certo? Agora [em 2011], quando a oposição quer a CPI, para que fazer um esforço imenso para não deixá-la acontecer? Se é para fazer limpeza, deixa a CPI investigar. Desde que seja séria, para investigar mesmo e não só para fazer barulho.

É parecida essa CPI proposta pela oposição para investigar o governo Dilma com a CPI da Corrupção de dez anos atrás, quando o senhor e o senador Alvaro Dias acabaram sendo forçados a deixar o PSDB?

É muito parecida. Até porque daquela vez não houve CPI. Em 2001, havia 32 assinaturas favoráveis à instalação, que era bem mais do que as 27 necessárias. Mas aí os senadores foram retirando os nomes e acabou estacionando em 26. Eu mantive a assinatura, o Alvaro também, precisamos sair do partido para não sermos expulsos, mas a investigação não saiu.

Qual avaliação o senhor faz do governo Beto Richa no Paraná?

Tenho visto o Beto falar muito mal do governo passado. Mas isso não é suficiente para ele cumprir os compromissos que assumiu durante a campanha. Só falar mal do governo passado não basta. Mas eu não quero aprofundar essa avaliação, porque outro dia uma colega sua falou que isso era mágoa de quem foi derrotado. Eu nunca me senti derrotado. Disputei uma eleição conhecendo todas as dificuldades que iria enfrentar. Quando eu falo, é porque eu tenho obrigação de falar o que eu penso. Embora ocupando um cargo aqui no BB, não deixei de ser paranaense. É preciso que a população tenha em mente as promessas que foram feitas e que ela também faça uma avaliação de quanto dessas promessas foram cumpridas. Eu não me esqueci de nenhuma delas.

Tem alguma que o senhor acha que já deveria ter sido cumprida nesse prazo de pouco mais de sete meses de governo?

Por exemplo: ele disse que no dia 2 de janeiro o salário dos professores iria aumentar 26%. Isso foi dito num debate para mim. Talvez eu tenha me esquecido de perguntar o ano. Vamos deixar só nesse.