Lenha na fogueira – A Câmara dos Deputados cancelou, na noite desta quarta-feira (8), a sessão extraordinária que votaria a Medida Provisória 595 (MP dos Portos). A decisão foi tomada após o deputado federal Anthony Garotinho (PR-RJ) afirmar que a votação da MP dos Portos estava sob suspeição. A declaração de Garotinho provou um imediato embate com o deputado Eduardo Cunha, também do Rio de Janeiro e líder do PMDB na Casa. As acusações feitas pelo ex-governador fluminense revoltaram os parlamentares.
Na tribuna do plenário, Anthony Garotinho disse que o texto foi transformado na “MP dos Porcos”, em alusão a suposta compra de alguns parlamentares. Adversário político de Eduardo Cunha, o parlamentar do PR afirmou que uma sugestão de mudança no texto da MP apresentada pelo peemedebista era a “emenda Tio Patinhas”. “Isso não pode ser transformado em show do milhão, para tudo na vida tem limites”, disse Garotinho.
Ele declarou que o texto do PMDB “está cheirando mal”. “É podre.” “Todos os que estão presentes neste plenário, talvez salvo honrosas exceções, sabem muito bem o que está acontecendo nesta noite. E, para tudo na vida, há limites. Neste momento, por discordar da forma pouco republicana – eu diria nada republicana – que esse assunto dos portos está sendo tratado”.
O discurso contundente de Garotinho acabou levando o líder do PMDB à irritação. “Acuse, mas mostre o que está acontecendo”, disse Cunha. “Eu tenho coragem suficiente para qualquer embate, qualquer que seja. Ainda mais com pessoas que nós conhecemos o passado e que não têm credibilidade para falar de ninguém”, afirmou o peemedebista.
O deputado Humberto Souto (MD-MG) foi o primeiro a cobrar explicações de Garotinho sobre as graves acusações. O parlamentar destacou a gravidade da denúncia e disse que não concordaria em votar uma proposta que coloca o Congresso em suspeição. “Garotinho precisa dar explicações sobre isso e mostrar o que está errado. Não podemos votar aqui algo suspeito, que pode ter práticas de corrupção. Peço que o deputado aponte para nós as sujeiras que disse saber”, cobrou.
Já o líder da Mobilização Democrática, Rubens Bueno (PR) afirmou que as acusações de Garotinho colocam todos os parlamentares sob suspeita. Para ele, a fala do deputado foi irresponsável já que não demonstrou as provas da acusação que fez em plenário. Bueno defendeu que a Câmara acione a Comissão de Ética para investigar a denúncia e punir possíveis corruptos ou o deputado Garotinho por fazer falsas denúncias. O presidente do partido, deputado Roberto Freire (SP), e demais parlamentares da bancada adiantaram que assinarão o pedido de investigação para apurar a acusação.
MP dos Portos
A MP dos Portos prevê a exploração direta e indireta dos portos e instalações portuárias, e trata também das atividades desempenhadas por seus operadores. Pela proposta, a autorização de operação de portos e terminais pode ser prorrogada indefinidamente, ao contrário do procedimento de concessões, que exige concorrência pública. A MP é considerada polêmica por revogar boa parte da legislação do setor portuário, incluindo a Lei de Modernização dos Portos (8.630/93), e por estabelecer novo marco regulatório para a área.
Dedo indicador
Com a polêmica instalada no plenário da Câmara dos Deputados, Anthony Garotinho retornou à tribuna para mais acusações e ameaças, referindo-se a Eduardo Cunha como “um deputado” e dizendo estar disposto a enfrentar o Conselho de Ética.
“Terei o maior prazer em dizer na Comissão de Ética o que sei sobre esta sessão. Se quiser, pode instaurar [o processo]. O deputado deveria primeiro cuidar dos seus problemas, que não são poucos, ao invés de usar a tribuna desta casa para fazer acusações levianas”, declarou.
Líder do PSB, o deputado Beto Albuquerque (RS) questionou a postura de Garotinho e cobrou explicações. Ele chamou o colega de “deputado patético”. “Eu lamento muito ter que presenciar uma sessão patética como esta, provocada por um deputado patético, que não respeita ninguém e se acha superior”.
Garotinho não se intimidou e rebateu a acusação: “Se a carapuça serviu…”
Presidente da Câmara dos Deputados, o peemedebista potiguar Eduardo Alves classificou a noite como uma das mais “constrangedoras” das últimas quatro décadas. “Uma exposição que o plenário da Casa não merece.”
Serpentário político
Anthony Garotinho não é estreante na política e muito menos um querubim barroco. Sabe o que fala e tem um arsenal de informações que chega a assustar. Se os indignados decidirem partir com vontade para cima de Garotinho, a Câmara dos Deputados corre o risco de uma definitiva implosão moral, pois como sempre afirmamos a política brasileira é um imundo e largo balcão de negócios.
Depois que o Mensalão do PT, o maior escândalo de corrupção da história nacional, veio à tona, a forma de fazer o escambo político foi modificada. Fora o loteamento dos ministérios, o governo deixou de lado a compra no atacado e adotou a negociação no varejo. Resumindo, Garotinho não apresentou provas, mas os que têm telhado de vidro começarão a enfrentar a partir de hoje seguidas noites de insônia.