De: Ucho Haddad – Para: Dilma Rousseff – Assunto: Ficção palaciana e devaneios da vovozinha

    (*) Ucho Haddad –

    ucho_25Como sempre lembro, a formalidade será deixada à beira para garantir a fluidez deste colóquio redacional. Dilma, nas muitas vezes em que lhe escrevi, claro deixei que a educação recebida dos meus pais teve o cavalheirismo como meta. E assim tenho procurado ser, um cavalheiro, apesar de vez por outra cometer algum tropeço. Tudo natural, pois sou um reles mortal e passível de erros. Entre as muitas lições que tive na casa dos meus pais, Dilma, uma delas foi o respeito a determinadas datas. Hoje, por exemplo, 31 de dezembro, é um dia que sempre nos entregamos à reflexão. Pensei até em deixar você curtir o mar da Bahia em paz, sob as bênçãos de todos os santos, mas diante das suas sandices não resisti. E cá estou a lhe escrever mais alguns desaforos. Até porque, prefiro que você se incomode, não eu.

    Dilma, a minha admiração por você é crescente. Não por causa da sua atuação como governante de um país que é uma verdadeira barafunda, mas por sua capacidade de representação. Jamais encontrei alguém com tanto talento para interpretar textos rabiscados por escribas contratados para esculpir a mentira com o cinzel da enganação. Dilma, em cena você é tão ousada, que não há como a grande massa ignara deixar de acreditar em suas palavras.

    Sem esquecer que o poder é doce, você invade os lares em pleno domingo para balbuciar bobagens, como se o Brasil fosse o paraíso de Gênesis, o jardim do Éden. Dilma, nove em cada dez brasileiros estão à procura desse lugar onde você e a “companheirada” moram. Sei que você tornou-se uma celebridade e não quer ser aporrinhada, mas pelo menos nos deixe o endereço do país que aparece nas propagandas do seu desgoverno, que de tantos efeitos especiais já fazem de Steven Spielberg um ultrapassado.

    Quer dizer, Dilma, que o ano de 2013 está terminando melhor do que começou? Como porta-voz de milhões de brasileiros, quero que você indique onde encontrou esses dados estapafúrdios que seus marqueteiros enxertaram no discurso presidencial do Ano Novo. A inflação continua dando um baile na “companheirada” da área econômica e você acredita que está tudo maravilhoso, como no país de Alice. O salário do trabalhador é uma vergonha monumental, mas você, Dilma, crê que sete notas de R$ 100 e duas de R$ 10 representam uma enorme conquista da classe trabalhadora. Dilma, por certo você, do alto da sua importância, não sabe o que acontece no cotidiano, mas um pastel, que tem mais vento do que recheio (como o seu governo), custa R$ 4. Dilma, tome a dica a seguir como regra: quando o salário mínimo é pouco para quem recebe e muito para quem paga, algo de extremamente grave e preocupante acontece na economia.

    Contudo, você teve a ousadia de afirmar que por causa da melhoria de vida (sic) o brasileiro “pega duro no batente todos os dias”. Dilma, você e o alcaguete dos milicos conseguiram a proeza de arruinar a economia brasileira em apenas uma década, mas batem no peito como se esse legado fosse algo magistral, como “nunca antes na história deste país”. Como se Lula, o lobista dedo-duro, fosse a versão tropical de Messias e você, o Aladim de saias. Sempre lembrando que no seu armário há muito mais calças compridas do que no meu. Mas isso é um detalhe que em nada melhora a sua incompetência, porque você não honra as calças que veste.

    Dilma, fico a pensar como é possível alguém mentir de forma tão deslavada e ainda conseguir elevados índices de aprovação popular. Se soubesse que pesquisa de opinião era um negócio da China, certamente não teria enveredado pelo jornalismo. Já teria feito alguns contratos com o seu governo e transformado a vida num eldorado, desvencilhado-me, assim, dos percalços que o jornalismo sério e verdadeiro impõe.

    É um direito seu achar que estou sendo duro ao criticá-la, mas não há como ser diferente com alguém que faz da mitomania o cardápio do cotidiano. Trago aqui mais um absurdo que constou do seu pronunciamento de final de ano.

    “Neste ano de 2013 continuamos nossa luta vigorosa em defesa do emprego e da valorização do salário do trabalhador. Uma luta plenamente vitoriosa, pois alcançamos o menor índice de desemprego da história. Estamos com uma das menores taxas de desemprego do mundo, continuamos nossa luta constante contra a carestia. Nela, tivemos alguns problemas localizados, mas chegamos a um ponto de equilíbrio que garante a tranquilidade do planejamento das famílias e das empresas”.

    Só mesmo alguém desajustado pode acreditar que foi vigorosa a luta de um governo para que o salário mínimo chegasse a pífios R$ 724. Considerando que há nesse circo chamado Brasil milhões de palhaços que pagam as contas dos governantes, você por questões óbvias não se preocupa com o que acontece no dia a dia daqueles que saem às ruas e se deparam com uma inflação – a verdadeira, a real – na casa de 20%.

    Sua incompetência é tamanha, que o pronunciamento oficial trouxe a informação falaciosa de que o índice de emprego está equilibrado, o que permite às famílias planejar o futuro. Dilma, o pior cego é aquele que não quer enxergar. E nesse quesito você venceria com folga o prêmio “Sem Visão”. É impossível falar em equilíbrio de emprego quando se sabe que o Brasil alcançou o chamado “pleno emprego”. Quem está empregado torce para não ser demitido, quem está desempregado reza para ser contratado. Acontece, Dilma, que a mão de obra brasileira é vergonhosamente desqualificada. E nem mesmo um milagre dos bons mudaria esse cenário da noite para o dia. Mas você, mitômana convicta, afirma que a partir de agora, na esteira da genialidade que escorre pela rampa do Palácio do Planalto, as famílias brasileiras poderão ter a tranquilidade do planejamento. Dois terços da população desta louca Terra de Macunaíma recebem menos de dois salários mínimos mensais, mas você acredita que com R$ 1,3 mil é possível planejar alguma coisa. Quanta bobagem brota da sua escrivaninha, Dilma.

    Não bastasse, Dilma, você afirmou que “o governo teve uma ação firme, atuou nos gastos e garantiu o equilíbrio fiscal, atuou na redução de impostos e na diminuição da conta de luz. Nesses últimos casos enfrentando duras críticas daqueles que não se preocupam com o bolso da população brasileira”. Então quer dizer que o seu governo atuou firme nos gastos? Creio que você tem razão, pois a gastança, burra e utópica, é o maior dos absurdos, como “nunca antes na história deste país”. Vocês, palacianos soberbos, gastam mal e ainda pensam que estão a fazer o bem, o correto.

    O Brasil anda de lado em termos econômicos há alguns anos, mas a sua arrogância não se dobra diante da realidade. E você vem com a conversa fiada de que a “guerra psicológica” pode “inibir investimentos”. Tudo bem, Dilma, você adora faltar com a verdade e quer que o mundo acredite nas suas palavras. O restante do planeta está a fazer a lição de casa e conseguindo sair da crise, mas a culpa do fiasco que você impõe ao País é provavelmente da “elite golpista”.

    O meu pai tinha uma receita dura para os ignorantes. Dizia ele: “Quando o sujeito é burro, peça a Deus que o mate e o diabo que o carregue”. Ao contrário, Dilma, não lhe desejo o mal, mas também não quero mais ser atropelado por essa catarata mitômana que é acionada quando a situação está crítica e nada justifica o caos em que o Brasil mergulhou. Há quem diga que mitomania é caso de hospício, medicamento tarja preta, mas creio que você é um “case” para humoristas, porque só à base de gargalhadas é possível deglutir suas insanas e indigestas declarações. Cheguei à conclusão que é mais fácil ganhar sozinho o prêmio da Megasena da Virada do que um petista reconhecer que está errado. E você, por questões conhecidas, não é diferente. Além de ser um bilhete corrido e não premiado.

    Dilma, que você é incompetente o mundo já sabe, mas aquela guerrilheira que na clandestinidade encarnou a companheira de armas Estela – Wanda, Luiza ou Patrícia – simplesmente se acovardou. Uma das suas subordinadas instala a poucos metros do seu gabinete um pedófilo serial e você se cala, como se conviver com criminosos hediondos fosse algo normal. Outra subordinada usa um helicóptero da Polícia Rodoviária Federal para fazer campanha e você simplesmente emudece. Escândalos de corrupção são frequentes no seu governo, mas você prefere o silêncio obsequioso.

    Aos brasileiros pouco resta diante dessa panaceia em que se transformou o Brasil, por obra e graça do apedeuta que lhe fincou na presidência, pois você foi eleita não apenas por vias democráticas, mas no vácuo de uma massa ignorante que se dá por feliz com um carnê vencido e um cartão qualquer de esmola social. Paciência!

    Antes de finalizar este colóquio, deixo uma pergunta que todo brasileiro adoraria fazer. Você, Dilma, moraria em um país cuja governante maior não tem competência para ser uma reles vovozinha, que como qualquer outra deveria saber os cuidados básicos para com o neto? Se colocar o neto na cadeirinha automotiva não foi possível, provavelmente porque tal ação exige um esforço desmedido, sem contar que leva a uma lambança de igual tamanho, imagine o que você é capaz de fazer sentada diante da principal escrivaninha palaciana.

    Sendo assim, Dilma, desejo-lhe saúde no ano que vai nascer, pois a paz certamente não baterá à sua porta, uma vez que o picadeiro verde-louro está irrequieto. E que a incompetência de sempre seja sua companheira fiel e dileta no ano perdido que desponta, porque arrancadas as primeiras páginas do calendário teremos diante dos olhos a realidade de um país irresponsável, com direito a Carnaval, Copa do Mundo e eleições. Uma eterna ficção, que você como boa embromadora deve estar esfregando as mãos. É a tal da teoria medieval do “panis et circenses”.

    Prepare-se, Dilma, porque aqui o chumbo será grosso e pesado, mesmo que em forma de letras. Até porque, como disse certa feita o grande Darcy Ribeiro, “só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca”. Do contrário, consulte uma das suas ministras de plantão, sempre de nariz em pé, literalmente, e que nos últimos tempos vem se revelando uma censora de mão cheia.

    (*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, cronista esportivo, escritor e poeta.