Tiro no pé – É impossível compreender como determinados veículos de comunicação do País fazem jornalismo. Idolatrados pelos incautos que desconhecem as entranhas do noticiário nacional, esses órgãos de imprensa se ancoram na chamada “exclusividade” para dar à notícia uma aura de verdade e ineditismo, sem que isso se confirme com o passar das horas.
Na noite de quinta-feira (16), o jornal “O Estado de S. Paulo” noticiou, com a aludida “exclusividade”, que Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo, recebera uma fortuna da empresa “Controlar”, responsável pelo serviço de inspeção veicular na capital paulista. A denúncia, vazada por alguém que tem acesso ao inquérito que apura o escândalo da Máfia do ISS, naufragou na sequência.
O naufrágio do furo de reportagem se deu porque, horas antes de a notícia ser publicada, a Justiça havia inocentado Kassab em ação penal proposta pelo Ministério Público Estadual para apurar suposta violação ao artigo 92 da Lei de Licitações, atribuindo ao ex-prefeito “concessão de vantagem indevida” à Controlar. Na sentença proferida pelo juiz Luiz Raphael Nardy Lencioni Valdez, da 7.ª Vara Criminal da Capital, o empresário Ivan Pio de Azevedo, dono da Controlar.
Todo esse enredo surgiu de declarações órfãs de provas prestadas ao Ministério Público Estadual. O ucho.info não tem procuração para defender Gilberto Kassab, mas é inaceitável que um veículo com trajetória secular, como é o “Estadão”, cometa um equívoco dessa natureza. O imbróglio que se formou na esteira da denúncia e da notícia não significa que esse ou aquele político tenha sido subornado pela Controlar, mas até o momento não existem provas do suposto crime.
Noticiar um fato com base na teoria do “ouvi dizer” é no mínimo suicídio profissional. O “Estadão” é um veículo que conta com a simpatia dos leitores e da opinião púbica, o que deve fazer com que a gafe jornalística caia no esquecimento em questão de dias. Não é a primeira vez que o jornalão paulista comete erro desse naipe. O editor do ucho.info foi alvo de erro imperdoável por parte do “Estadão”, que confiou em um dos então correspondentes internacionais, cujo currículo fala por si só.
O tal jornalista perdeu o bonde da história no caso do Dossiê Cayman e acabou inventando uma falácia para prejudicar o editor do site, que à época tinha informações e documentos sobre o escândalo que chacoalhou o governo de Fernando Henrique Cardoso. Nem mesmo diante de provas incontestáveis, que exibiam a falsidade das matérias esculpidas pelo correspondente com o cinzel da mentira, o “Estadão” deixou de publicá-las. Sem se importar com as graves consequências do equívoco inconteste. Ou seja, prevaleceu a necessidade por manchetes.
No contraponto, os políticos brasileiros precisam deixar a hipocrisia de lado, pois é mais do que sabido que política não se faz sem dinheiro de sobra. E como o vil metal não dá em árvore, de algum lugar ele há de surgir. O extrato dessa confusão deixa claro que não se pode aceitar que matérias acusatórias sejam desprovidas de provas ou que não levem ao leitor as devidas e verdadeiras informações. Por outro lado, também é inaceitável esse ininterrupto desfile de políticos na passarela da probidade.
Uma campanha para a prefeitura de São Paulo, com boa chance de sucesso, custa aproximadamente R$ 100 milhões. Ninguém investe, pelo menos no Brasil, enormes quantias em candidatura política sem a possibilidade de contrapartida, mesmo que o seja estratosférico o grau de patriotismo ou de diletantismo do aquinhoado investidor. Nas últimas décadas, o único ser humano que, em cargo público, tirou dinheiro do próprio foi o empresário Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York.
Essa teoria, da “política com muito dinheiro” vale também para o escândalo da Siemens, que reúne acusadores e acusados com culpa no cartório e que se escondem debaixo de um frágil e extenso telhado de vidro. Apenas a título de informação, uma campanha presidencial capaz de levar o candidato ao Palácio do Planalto custa perto de R$ 1 bilhão. Cada um conclua o que quiser.