(*) Carlos Brickmann –
A presidente Dilma tem as melhores intenções, mas nem sempre dão certo. E já se sabe de quem é a culpa do que não dá certo: é da maldita realidade.
No começo do ano passado, em rede nacional de rádio e TV, Dilma anunciou a realização de seu sonho: redução da conta de luz em 18%, para pessoas físicas, e 32% para pessoas jurídicas. Passou-se um ano e pouco e o Governo (não Dilma, nem em rede nacional de TV) anuncia que o sonho acabou. O Tesouro terá de entregar R$ 21 bilhões às distribuidoras de eletricidade. Como é do couro que sai a correia, prepare seu couro: você, caro leitor, vai pagar a conta de luz com um bom aumento. E pagar ainda mais impostos para cobrir o buraco da energia.
Lamentavelmente, o mundo real se recusa a seguir as ordens da presidente, por mais que sejam dadas aos gritos. O fato é que, para qualquer pessoa, a mudança de preços é decisiva para definir seu comportamento: se a luz está mais barata, por que ficar regulando micharia? Luz acesa, que a conta baixou!
É o que ocorreu com os juros: Dilma decidiu que estavam altos e tinham de baixar (aliás, não estava sozinha: muitos empresários e economistas estavam de seu lado. Mas havia um fator que Dilma não podia ignorar: o ministro da Fazenda, Guido Mantega, concordava com ela. Se Mantega estava a favor, alguma coisa devia estar errada). Estava: os juros que a presidente mandara baixar na marra já voltaram às alturas. E ajudaram a manter a inflação acima do esperado.
Choque de gestão? Sim: para Dilma, para nós, foi um choque de alta tensão.
Na trilha da propina
Ninguém imaginaria que empresas envolvidas em pagamento de propina e formação de cartel num Estado se comportem como modelos de correção em concorrências fora do Estado. O Cade, do Governo Federal, aponta indícios de fraude dessas empresas em estatais federais, CBTU e Trensurb. Se as concorrências não foram combinadas, então há coincidências notáveis.
Ou seja, não há ingênuos no Estado nem na União, nem partidos por definição livres de propina.
Investigar tudo
É preciso investigar as estatais federais. Mas sem esquecer as fraudes apontadas em São Paulo, iniciadas no Governo Mário Covas, PSDB, e mantidas nos Governos tucanos que se seguiram. E não é caso de investigar apenas o segundo escalão, com a solitária exceção de Robson Marinho, que foi chefe da Casa Civil de Covas e teve a má sorte de ser alvo da Promotoria suíça: é preciso olhar o Governo inteiro, pesquisando cada secretário que tenha contribuído, por ação ou omissão, para efetivar contratos sob suspeita.
Não se pode permitir que o escândalo federal encubra o estadual, e mais tarde seja encoberto por outro escândalo.
Desculpas: Afif tem razão
Esta coluna citou, entre os ministros que deixaram Brasília nas asas da FAB nas vésperas do Carnaval, o ministro da Micro e Pequena Empresa, Guilherme Afif. Mas o ministro apenas manteve sua rotina de trabalho: todas as sextas atende em seu gabinete paulistano, haja ou não Carnaval. Diante do erro cometido por este colunista, Afif enviou o seguinte bilhete:
“Sobre a nota do uso do jato da FAB na véspera do carnaval, sob o título Quem te viu, quem te vê, seguem alguns esclarecimentos: retornei a São Paulo na quinta, dia 27, em voo compartilhado com a ministra da Cultura, Marta Suplicy, às 17h45. Na sexta cumpri agenda no escritório da Presidência em São Paulo, inclusive com entrevistas à revista Época e ao jornal Brasil Econômico, seguidas de reunião com equipe interna da Secretaria da Micro e Pequena Empresa.”
Tucanos contra gordos
O primeiro-ministro Winston Churchill, que comandou a Inglaterra na vitória da Segunda Guerra Mundial, era gordo. O ministro Delfim Netto, que levou o Brasil às maiores taxas de crescimento da História, é gordo. O general Ariel Sharon, fundamental na vitória de Israel na Guerra do Yom Kippur, era gordo. O professor Henry Kissinger, Prêmio Nobel da Paz, ex-secretário de Estado americano, disputado pelas melhores universidades do mundo, é gordo.
Mas ser gordo, em São Paulo, é defeito que impede a nomeação de professores aprovados em concurso. A socióloga Bruna Giordjiani de Arruda foi impedida de assumir o emprego de professora. Segundo a explicação, tem “obesidade mórbida, do ponto de vista legal”. Não é apta ao cargo público estadual. Enfim, teme-se que, com obesidade mórbida, a professora esteja mais sujeita a doenças, que vão gerar despesas de tratamento e provocarão faltas. Melhor deixar os alunos sem aulas.
Só ela? E os outros?
E fumantes, podem ser aceitos pelos cruzados da saúde? Pessoas com histórico de parentes cardíacos também serão atingidas pelo veto? Que tal um exame genético minucioso para garantir a eugenia do funcionalismo? Deve haver mil explicações cheias de termos científicos só compreensíveis para iniciados, mas a verdade é que estão discriminando pessoas competentes por não se adequarem à verdade oficial sobre o que é ou não saudável e bonito. O ex-secretário da Saúde, Gonzalo Vecina, de ótimo desempenho, seria vetado? O governador Geraldo Alckmin, quando quiser ser entrevistado, rejeitará o programa do Jô Soares?
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.