Tensão no ar – A possibilidade de novas manifestações durante a Copa do Mundo indica que profissionais de mídia poderão novamente ficar em situação de risco, alerta o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ). No relatório “Halftime for the Brazilian Press” (Segundo tempo para a imprensa brasileira), divulgado na terça-feira (6), a organização questiona “se a justiça vai prevalecer sobre a censura e a violência” e se o País será capaz de garantir a segurança dos profissionais, caso situações de violência contra jornalistas sejam registradas.
“É preciso pensar em coisas extraordinárias para momentos extraordinários. Não só os governos, mas também os jornalistas. Também temos que olhar de outra maneira para a nossa participação e nos perguntar coisas que nunca nos perguntávamos”, alertou María Teresa Ronderos, diretora do CPJ, durante a apresentação do relatório em evento sobre liberdade de imprensa realizado na capital federal.
Após detalhamento das mortes de 12 profissionais de mídia assassinados por motivos ligados diretamente ao trabalho, o CPJ listou recomendações ao País. Entre as sugestões está a de treinar as forças policiais para garantir que os jornalistas possam cobrir manifestações nas semanas que antecederem a Copa do Mundo e durante o evento, sem medo de ataques ou represálias. Também o programa de proteção a testemunhas deveria ser ampliado, passando a incluir jornalistas perseguidos por causa do seu trabalho.
Avanço lento
Com uma “mídia nacional vibrante e vigorosa”, o Brasil ainda é dominado pela impunidade quando o assunto é crimes contra a imprensa, destaca o CPJ, que entregou o relatório nas mãos da presidente Dilma Rousseff e dos ministros da Justiça, dos Direitos Humanos e da Comunicação. Também estão previstas reuniões com representantes dos poderes Legislativo e Judiciário.
De acordo com Carlos Lauria, coordenador do Programa das Américas do CPJ, a presidente da República se comprometeu a “continuar com investigações que produzam resultados desse tipo, para que os responsáveis por crimes contra jornalistas recebam castigos e para que haja menos impunidade”.
Na avaliação do CPJ, o Brasil vem dando sinais de que está preocupado com a questão da violência contra profissionais de mídia. “Nos últimos meses, tivemos condenações em quatro casos, alguns antigos, outros mais recentes, algo que não é comum, já que 85% dos casos de assassinato de jornalistas registrados no mundo não são resolvidos”, lembra o coordenador. “O avanço da Justiça tem sido muito lento, mas resultados significativos têm sido produzidos.”
Para Lauria, o fato de as autoridades brasileiras estarem abertas ao diálogo já representa um avanço. “O que importa é que o governo tomou nota desses temas. É uma clara indicação, na opinião do CPJ, de que não só o governo, mas os outros poderes de Estado são sensíveis a essas questões, que evidentemente estão produzindo problemas para o exercício do jornalismo no Brasil”, avalia.
Novas práticas jornalísticas
Com o objetivo de preparar os profissionais para eventuais protestos durante a Copa, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também está finalizando um manual de boas práticas jornalísticas para grandes eventos. “Talvez seja o momento de se recriar a forma de exercer o jornalismo, e nesse ponto o manual pretende dar uma colaboração”, explicou Clarinha Glock, pesquisadora da Abraji e responsável pelo documento.
Segundo Glock, o momento atual pode ser comparado ao de 2002, quando o jornalista Tim Lopes, da TV Globo, foi assassinado ao fazer reportagem investigativa em favela carioca. A morte do cinegrafista Santiago Andrade, da Rede Bandeirantes, durante protesto no Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano, também foi um momento definitivo.
“O que se vê, especialmente com a morte de Santiago Andrade, é que estamos em um momento novo. Provavelmente vai ser outro marco, porque as empresas estão pensando no tipo de jornalismo que está sendo feito”, diz a pesquisadora.
Índice de impunidade
Anualmente, o CPJ divulga um ranking de países em que a impunidade de crimes contra a mídia é mais frequente, baseado no número de assassinatos não resolvidos de jornalistas em relação à população de cada país.
Na lista deste ano, o Brasil aparece na 11ª posição (uma posição abaixo da de 2013), atrás de Iraque, Somália, Filipinas, Sri Lanka, Síria, Afeganistão, México, Colômbia, Paquistão e Rússia.
O levantamento concluiu que 96% das vítimas são jornalistas nacionais, e a maioria se dedicava à cobertura de política, corrupção e guerra em seus respectivos países. Na maior parte dos casos, os assassinatos são antecedidos de ameaças. (Com informações da Deutsche Welle)