(*) Lígia Fleury –
Que confusão! Política com torcida! Só poderia mesmo dar nisso… confusão geral!
Se tem algo que brasileiro sabe fazer é Carnaval! Falem o que quiser, mas disso ninguém duvida. Brasileiro tem gingado, tem samba no pé. Brasileiro trabalha o ano inteiro por uma fantasia que será usada em apenas quatro ou cinco dias do ano seguinte e jura que vale a pena. Brasileiro se endivida para sambar. E, na hora de mostrar ao mundo talvez a única coisa que sabemos fazer com excelência – tratando-se de povo enquanto nação, no todo e não na competência individual -, vem uma belga e acaba com nossa imagem um tanto já arruinada pelos nossos próprios erros. Será que precisamos dos estrangeiros ou da FIFA para cavar mais ainda nossa sepultura diante das câmeras que mostram ao mundo que país é esse?
Não sabemos votar. Não conseguimos varrer a corrupção do nosso solo verde, amarelo e azul, não conseguimos sequer garantir que nossas crianças sejam alfabetizadas, não temos competência para andarmos em segurança nas nossas ruas, não somos capazes de cuidar de nossos doentes… Será mesmo que precisávamos de uma belga para mostrar ao mundo que também não sabemos fazer nosso melhor, que seria dar um espetáculo no centro de um gramado justamente quando não seria com a bola no pé? Exatamente quando todos os holofotes estavam iluminando o nosso Brasil?
Repórteres usando capacetes para fazer seu trabalho. E saem feridos. Somente em guerra se vê este cenário. E isso não é uma guerra civil? Se vândalos atacam patrimônios e profissionais, o que aparece é a força policial usada em demasia? Ora, sem hipocrisia, povo! Cada um no seu papel! Senão, permaneceremos nesse mundo hipócrita em que se correr o bicho pega e se ficar o bicho come. Desçamos do muro, todos nós!
O povo sai para trabalhar sem saber se vai andar sabe-se lá quantos quilômetros porque, além de uma greve ilegal, o transporte público continua um caos?
Ontem, estive com um grupo de amigas em um local muito bem situado, repleto de estrangeiros, para um café da manhã. Ao pedir ao garçom, com toda educação que me trouxesse uma colher, ele teve a petulância de me dizer que havia colher no buffet, lá naquela mesa! Só me restou a vontade de lhe dizer, no momento da gorjeta, que o dinheiro estava no banco. E, lógico, relatei o fato ao responsável. A questão não está no fato de eu ser brasileira, pois no meu lugar poderia estar uma estrangeira. A questão é que todos devemos servir maravilhosamente bem e sermos servidos tão maravilhosamente bem quando somos consumidores. Que imagem estamos mostrando?
Brasileiro é acolhedor, alegre, prestativo. Somos tudo isso sim! Uns poucos milhares que estragam a nossa imagem não podem aparecer mais do que nós, que gostamos do nosso país, temos a honra de vestir as cores da nossa bandeira. Emoções como a do povo cantando o Hino Nacional deve ter mais repercussão na mídia do que aquele fiasco de abertura da Copa do Mundo ou dos marginais depredando nosso patrimônio.
É hora de um pouco de alegria para um povo sofrido de tantos roubos, de tanta corrupção. Por outro lado, foi um alívio ouvir um estádio inteiro contra a presidenta, absolutamente acovardada diante do mundo. Calou-se após um pronunciamento em cadeia nacional em que teve a coragem de dizer que o valor gasto com os estádios é muito menor do que a verba para a Educação. Até poderia ser verdade, caso não houvesse desvio! Eu a ouvi dizer também que a Copa seria, para os brasileiros, motivo de orgulho! Começamos bem, hein? Falou também sobre a Copa da Inclusão, da tolerância e do diálogo. Piada! Inclusão de quê? Brasileiros à frente em um projeto científico magnífico, o chute na bola pela força do pensamento, a Neurociência dando um espetáculo e o mundo nem percebeu! Qual a responsabilidade do país ao aceitar tanto descaso com quem determinou apenas aqueles míseros segundos de transmissão de tal conquista científica?
Sim! Estamos encrencados mesmo! Mas querem saber? Somos todos culpados por anos de omissão! Só que agora é o momento de recebermos bem os nossos visitantes estrangeiros, de cuidarmos deles com atenção e educação, porque não ganharemos nada além de piorar nossa imagem caso o caos aumente. Agora é bola no pé e na rede, com alma de brasileiro, carinho e acolhida de brasileiro.
Nossa revolta precisa transformar o país e isso será nas urnas. Um dia de cada vez. Agora é hora de muita vibração, de uma torcida não pela bola na rede, mas pelo gol que precisamos fazer contra a corrupção, contra a nossa imagem desgastada. Não é, de jeito nenhum, ferindo pessoas, atendendo mal os consumidores, impedindo o direito de ir e vir do cidadão que faremos do Brasil um país melhor. O caminho é a acolhida, a alegria, o servir com educação, atender com prontidão. Não porque estrangeiros estão nos vendo, mas porque precisamos disso para nós mesmos. Nós, brasileiros, precisamos cuidar de nós mesmos. Por que não?
(*) Lígia Fleury é psicopedagoga, palestrante, assessora pedagógica educacional, colunista em jornais de Santa Catarina e autora do blog educacaolharcomligiafleury.blogspot.com.