Esposa do vice-presidente da Camargo Corrêa pode ser chamada para depor na CPMI da Petrobras

mylene_leite_05Leite derramado – Quando, no início de 2009, o ucho.info fez as primeiras denúncias que culminaram com a Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, o editor conhecia com largueza os detalhes do esquema de corrupção operado pelo finado José Janene e por seu compadre, o doleiro Alberto Youssef, e que funcionava em algumas diretorias da Petrobras. Na ocasião, o editor do site, que sempre afirmou ser o esquema desmontado pela Lava-Jato uma reticência criminosa e majorada do Mensalão do PT, não demorou a noticiar que empreiteiras seriam alcançadas, cedo ou tarde, por uma eventual investigação.

Com a deflagração da Operação Lava-Jato, em março passado, e o fim da ciranda de corrupção que ficou conhecida como “Petrolão”, as empreiteiras surgiram a reboque na cena de um crime que já é considerado como o maior da história nacional em sua modalidade. Poderosas e com estreitas ligações com o Poder Executivo, as empreiteiras tentaram escapar do olho do furacão a bordo da tese da leniência. A ideia, esculpida por caros e badalados criminalistas de São Paulo, acabou não prosperando, pois a PF e o Ministério Público Federal tinham muito mais informações a respeito do caso do que imaginavam os envolvidos.

No momento em que a proposta de leniência foi apresentada por um pool de empreiteiras, em Curitiba, as autoridades que trabalham na Lava-Jato já se debruçavam sobre detalhes de outros crimes cometidos na estrutura do “Petrolâo”. O que levou à recusa por parte da PF e do MPF. Pelo menos duas empresas de fachada foram abertas para receber dinheiro do esquema criminoso, uma registrada no nome da esposa de Eduardo Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa, e outra na da mulher de Paulo Augusto Santos da Silva, diretor de Óleo e Gás da empreiteira.

Brasileira de origem cubana e ex-secretária de uma multinacional, Mylene Ribeiro Quian Leite recebeu, por meio de empresa registrada em seu nome (Paiva Ribeiro Gerenciamento, Arquitetura e Paisagismo), R$ 1 milhão do esquema, dinheiro depositado pela Sanko Sider, também encalacrada na Operação Lava-Jato, de acordo com as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. O envolvimento de Mylene Quian no carrossel de corrupção que rodava na Petrobras, segundo depoimento do dono da Sanko, se deu no rastro da ganância de Eduardo Leite, com quem está casada desde 1992 e tem duas filhas.

Pano quente

A Sanko Sider forneceu tubos ao Consórcio Nacional Camargo Corrêa (CNCC) nas obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Detalhes sobre a transação entre a Sanko e os executivos da Camargo Corrêa foram revelados por um dos donos da Sanko, Márcio Bonilho, quando interrogado pela Justiça Federal, em 20 de outubro passado, em uma das ações penais decorrentes da Operação Lava-Jato.

A Sanko e a empreiteira negam ter cometido qualquer irregularidade. Já os advogados dos executivos da Camargo Corrêa (Eduardo Leite e Paulo Augusto Santos da Silva) negam que os clientes receberam comissões, mas alegam que as empresas das respectivas mulheres prestaram serviços à Sanko.

No contraponto, Carlos Alberto Pereira da Costa, um dos “laranjas” de Alberto Youssef e que fez acordo de delação premiada, Eduardo Leite era o principal contato do doleiro na Camargo Corrêa. Youssef, de acordo com o MPF, controlava uma espécie de conta corrente usada pela empreiteira para pagar suborno.

O renomado criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, que defende Eduardo Leite, garante que a empresa “Paiva Ribeiro” à esposa do executivo e ao seu cunhado, profissionais que supostamente possuem qualificação técnica para fornecer serviços à Sanko. “A empresa existe há mais de dez anos, com larga folha de serviços prestados”, destaca o advogado.

Mariz de Oliveira afirma que “houve uma remuneração pré-combinada entre a Paiva Ribeiro e a Sanko, constante de contrato na área de arquitetura e design de interiores, e os serviços foram efetivamente realizados. Não há que se colocar dúvida em relação à legitimidade dessa prestação”.

O também criminalista Pierpaolo Bottini, advogado de Paulo Augusto Santos da Silva, afirma que a mulher do seu cliente é engenheira e que sua empresa elaborou parecer técnico para a Sanko. “O valor foi pago pela Sanko em decorrência de serviços efetivamente prestados”, afirma. “Pedimos acesso ao autos para conhecer o contexto das afirmações e temos convicção de que tudo será devidamente esclarecido”, disse Bottini.

Ostentação e CPMI

Eduardo Leite e Mylene Quian até recentemente jamais se preocuparam com os desdobramentos do escândalo de corrupção, a ponto de, em julho passado, quando a Lava-Jato começava a levantar fervura, a esposa do vice-presidente da Camargo Corrêa ter arrumado tempo para aproveitar alguns dias na praia. O casal sempre levou uma vida abastada, com contínuas manifestações de riqueza desmedida, situação que chamava a atenção até mesmo de pessoas próximas.

Em seu perfil na rede social Facebook, Mylene Quian disponibiliza algumas fotos que registram o estilo de vida nababesco que ainda leva com a família. Em junho de 2009, meses depois de o ucho.info iniciar as denúncias que desaguaram na Operação Lava-Jato, a “esposa-cúmplice” fez questão de ser fotografada ao lado de uma imagem da falecida atriz norte-americana Farrah Fawcett, exposta no badalado e caro Hotel Waldorf Astoria, em Nova York.

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Mylene pode até alegar que desconhecia a manobra arquitetada pelo marido e que de fato sua empresa prestou serviço à Sanko Sider, mas será difícil convencer as autoridades com uma desculpa que carece de consistência. Marcada pelo glamour e pela ostentação, a vida do casal agora é uma espécie de furacão que mescla pesadelo e tensão, principalmente depois das muitas denúncias de envolvimento no retumbante escândalo de corrupção.

O fato de Mylene Quian ter sido flagrada em um dos capítulos do Petrolão, mesmo que pequeno, faz crescer a possibilidade de Eduardo Leite aderir à delação premiada, como forma de poupar a mãe de suas filhas do constrangimento de depoimentos perante a Justiça e uma eventual condenação, se comprovada sua culpa. Isso pode estar tirando o sono dos acionistas da Camargo Corrêa, que há anos se livraram de outra operação da Polícia Federal, a Castelo de Areia, cujas investigações foram bisonhamente anuladas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Fora isso, Mylene Quian não está livre de ser chamada para uma sessão do tipo “olho no olho” com os procuradores da República que trabalham na Operação Lava-Jato e com o juiz federal Sérgio Fernando Moro, um dos maiores especialistas brasileiros em combate à lavagem de dinheiro e à evasão de divisas. Mylene também corre o risco de ser convocada para depor na CPMI da Petrobras, com direito a transmissão televisiva.

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