Muita calma – A Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, foi deflagrada cinco após as denúncias feitas pelo empresário Hermes Magnus e pelo editor do UCHO.INFO, jornalista Ucho Haddad. Nesse período, as autoridades colecionaram um sem fim de provas sobre o maior escândalo de corrupção da história brasileira, a ponto de ter levado à prisão duas dezenas de executivos das principais empreiteiras do País, até então intocáveis.
É fato que todo acusado tem o direito de saber a acusação que lhe imputam antes de responder a qualquer pergunta das autoridades competentes, até porque ninguém é obrigado a produzir provas contra si, mas não se pode esquecer que mentir durante as inquirições da Operação Lava-Jato é um tremendo equívoco.
Certos estão os advogados que orientaram seus clientes a permanecerem em silêncio – ou falar o mínimo possível – até que o acesso ao inquérito seja liberado, mas o melhor a se fazer no escopo da Lava-Jato é colaborar com os investigadores. A essa altura, depois que provas foram carreadas ao inquérito, negar o inegável só complicará a situação dos acusados, alguns dos quais podem permanecer atrás das grades por muito tempo.
Muitos negaram conhecer Alberto Youssef ou ter mantido qualquer contato com o doleiro, mas registros da portaria do prédio onde funcionava o bunker denunciaram todos aqueles que lá estiveram. Um dos que negaram conhecer Youssef esteve em seu escritório mais de trinta vezes. Declarações mentirosas desse naipe servem apenas para postergar uma eventual decisão em favor dos que se encontram presos na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.
Outro erro primário que vem sendo cometido por alguns acusados é afirmar que as propinas foram pagas ao então deputado federal José Janene (PP-PR), o “Xeique do Mensalão”, morto em 2010. A estratégia de transferir a culpa para alguém que não mais pode se defender é utópica, pois os policiais federais e os procuradores da República têm informações detalhadas sobre o funcionamento do esquema criminoso de Janene, que tinha como braço direito o doleiro Youssef, seu compadre. Inclusive dados sobre as movimentações financeiras do grupo no exterior já estão com as autoridades.
Nas últimas horas, desde que os executivos de empreiteiras e os operadores do esquema de corrupção foram presos na Operação Juízo Final, deflagrada na última sexta-feira (14), os mais badalados criminalistas do País passaram a defender seus clientes fora dos autos do inquérito, como se isso produzisse algum resultado. O UCHO.INFO já criticou essa conduta obtusa, mas os advogados parecem insistir na estratégia.
“Leitoso”, o falso inocente
Para reforçar esse plano, que tem todos os ingredientes para fracassar, frases contundentes, de autoria dos advogados, têm aparecido na imprensa com certa frequência. Defensor de Eduardo Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa, o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira disse que seu cliente é inocente e vítima de um processo de caça às bruxas que se instalou no País.
Mariz de Oliveira, como já destacou o site em matérias anteriores, é dono de considerável trajetória no Direito, mas Eduardo Leite não foi preso porque era assíduo frequentador da igreja mais próxima. Leite acabou na carceragem da PF, em Curitiba, por causa do seu envolvimento com a ciranda de corrupção que funcionava na Petrobras. Que o advogado atue para minimizar o calvário do cliente é compreensível, mas é preciso manter a coerência.
A conversa fiada de Sérgio Mendes
Um dos 23 presos na Operação Juízo Final, Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente executivo da empreiteira Mendes Junior, confirmou ter pago R$ 8 milhões às empresas do doleiro Alberto Youssef. O advogado Marcelo Leonardo, que defende Cunha Mendes, disse que seu cliente foi extorquido pelo doleiro e por Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras.
Extorsão é crime e a tese ultrapassa as fronteiras da sandice. Na condição de vice-presidente de uma das maiores empreiteiras brasileiras, Sérgio Cunha Mendes tem conhecimento suficiente para identificar o lícito do ilícito. E só aceita extorsão e permanece calado aquele que está a levar vantagem em alguma situação criminosa.
“Fernando Baiano” e a necessidade de mudança
Responsável pela defesa de Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, o criminalista Mário Oliveira Filho, um dos grandes nomes do Direito Penal no País, não comete um equívoco ao dizer que é impossível fazer obra pública no Brasil sem o pagamento de propina. “O empresário, se porventura faz alguma composição ilícita com político para pagar alguma coisa, se ele não fizer isso não tem obra. Pode pegar qualquer empreiterinha e prefeitura do interior do país. Se não fizer acerto [com políticos], não coloca um paralelepípedo no chão”, afirmou Oliveira Filho.
Conspiração contra o Estado
Quando um cidadão deseja levar adiante o seu negócio, é preciso respeitar as leis e defender os interesses do País, acima de tudo. No Brasil, o famoso e folclórico jeitinho tornou-se regra suprema, o que transformou o território verde-louro em morada da impunidade. Auferir lucro não é crime, mas é importante que isso se dê à sombra da legalidade.
Quando um empresário aceita participar de algum esquema criminoso está ciente de que mais adiante as garras da lei alcançá-lo-ão, não sem antes estar conspirando contra o Estado. A legislação norte-americana pune o crime de conspiração contra o Estado de forma exemplar, incluindo no rol de criminosos os que sabem de um ilícito e não o denunciam.
Considerações finais
O criminalista Mário Oliveira Filho não faz uma leitura errônea da realidade brasileira. Contudo, é preciso que o Brasil seja passado a limpo com a máxima urgência, pois é impossível continuar convivendo com um modelo político que faz inveja aos mais experientes mafiosos. No momento que o dirigente de uma grande empresa, que por certo tem corpo jurídico próprio, aceita esse tipo de situação fora da lei passa a fazer parte de uma quadrilha. E como quadrilheiro deve ser tratado.
Como temos afirmado, a Operação Lava-Jato ainda está em seus primeiros capítulos, o que significa que muita lama ainda há de surgir adiante. De igual modo, ainda é cedo para que os presos na Operação Juízo Final comecem a contar detalhes do esquema criminoso que saqueou os cofres da Petrobras. Muito além do pagamento de propina por parte das empreiteiras, há os crimes de formação de cartel, superfaturamento de contratos e formação de quadrilha.
O direito à ampla defesa é claramente contemplado pela Constituição Federal e será respeitado, assim como ninguém será julgado e condenado por um tribunal de exceção, mas é preciso que os criminosos, mesmo que de colarinho branco, paguem por seus erros. Afinal, a Carta Magna é sábia ao definir que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Isso significa que, perante a lei, o assaltante de banco e um dos que saquearam os cofres da Petrobras devem ser tratados de forma isonômica.