(*) Carlos Brickmann –
Os Dez Mandamentos da Lei de Deus são severos, rígidos; e nem eles proíbem a mentira. O estadista britânico Winston Churchill dizia que a verdade é tão preciosa que precisa ser protegida por uma muralha de mentiras. A mentira, vemos, tem muitas vantagens; mas tem o poder de destruir quem acredita nela.
Todos assistimos à campanha eleitoral, todos assistimos hoje à desconstrução, pela presidente Dilma, daquilo que a candidata Dilma afirmava. Não tem grande importância: o importante é que a presidente tenha reconhecido, ao escolher sua equipe econômica, a necessidade de gastar menos do que o Governo arrecada, de evitar manobras criativas com a aritmética, de fingir que a inflação e as contas externas estão sob controle, que tudo vai bem e no melhor dos mundos.
Independentemente das promessas de campanha, Joaquim Levy é um bom nome para a Fazenda? Este colunista não tem a menor ideia: sabe que fez uma carreira sólida, que ocupa alto cargo num grande banco, mas se é capaz de formular uma política econômica é algo a ser visto no futuro. É coisa nova para ele.
Há quem ache que o ministro da Fazenda, de fato, será a presidente Dilma. Aí não vai dar certo: da mesma forma que nenhum presidente terá uma boa política econômica com ministros compreensivos como Guido Mantega, nenhum bom ministro aguentará ficar levando pitos, ouvindo gritos e cumprindo ordens.
Dizer uma coisa na propaganda e fazer outra, OK – desde que se faça o que é preciso. O que não pode ocorrer a um governo é acreditar na própria propaganda.
A palavra e o fato
Levy não é o que Dilma prometeu. E alguém tinha acreditado na promessa?
Fluxo de tráfego
Dizem que o líder chinês Deng Xiao-ping, que iniciou a modernização do país, ia de carona num carro dirigido por seu sucessor já indicado, Jiang Zen-min. Em determinado local, a estrada se bifurcava, e Jiang perguntou a Deng qual o caminho a seguir. Deng respondeu: “Dê sinal à esquerda e vire à direita”.
A história é ótima, embora (e talvez por isso) jamais tenha acontecido. Mas vai ao fundo da questão: o problema não é ser direita, esquerda ou centro, mas saber como fazer com que o dinheiro do Governo – e, portanto, da população que arca com as despesas – seja suficiente para pagar as contas, impulsionar o crescimento do país, oferecer uma rede de proteção eficiente a quem dela necessite. Que o Governo combata a inflação, acerte as contas externas, bote o país em dia.
Talvez assim dê para entender a frase incompreensível do deputado Gilberto Kassab, sobre seu partido: não é de direita, nem de centro, nem de esquerda.
Manda primeiro, conversa depois
Boa parte da resistência do PT à escolha de Joaquim Levy para a Fazenda e de Kátia Abreu, a líder dos ruralistas, para a Agricultura, deve-se à forma como foram escolhidos e anunciados. Não houve sequer aquela reunião formal, em que o comando partidário recebe a decisão consumada mas tem a chance de dizer que foi consultado e se prepara para justificar a escolha. Primeiro houve o anúncio, e o partido que se estressasse para explicar decisões que o surpreenderam; e, pior ainda, que tentasse conter as manifestações de inconformismo, sem ter tido o tempo de acertar as coisas com as bases.
Dilma pode até trazer ideias novas para o novo Governo, mas a maneira de implementá-las é a mesma de sempre.
Aqui e lá fora
Acredita que a Operação Lava-Jato e a Operação Juízo Final são um tsunami político? Pois não são: tsunami mesmo são as investigações americanas sobre a Petrobras, que a empresa acaba de confirmar. A SEC, equivalente americana à CVM, investiga a Petrobras para saber se os investidores que compraram seus recibos de depósito (ADR) na Bolsa de Nova York foram ou não prejudicados. E o Departamento de Justiça a investiga por denúncias de corrupção, de acordo com a Lei de Atos de Corrupção no Exterior.
Quem cuida do caso é a procuradora-geral assistente do Departamento de Justiça, Leslie Caldwell. A Petrobras contratou dois escritórios de advocacia, o brasileiro Trench, Rossi & Watanabe e o americano Gibson, Dunn & Crutcher, especializados nas leis americanas anticorrupção, que preparam uma auditoria das contas e práticas comerciais da empresa, para demonstrar que estão de acordo com as leis dos Estados Unidos. Foi uma legislação desse tipo, na Europa, que levou a multinacional alemã Siemens a contar ao menos parte do que sabia do cartel dos trens em São Paulo.
Gente sim, empresa não
Para os EUA, quem deve ser punido é a pessoa que agiu fora da lei, não a empresa. É importante, diz Leslie Caldwell, que o funcionário saiba, ao transgredir a lei, que corre o risco de ir para a prisão, e perdendo o que tiver acumulado.
Mas a festa continua
Está na coluna do ótimo Aziz Ahmed, em O Povo, do Rio: “Um avião da FAB sai no final do mês para Marrocos, levando uma comitiva de 28 pessoas da Secretaria de Direitos Humanos para participar do 2º Fórum Internacional de Direitos Humanos. No comando do tour, a titular da Secretaria, Ideli Salvatti.”
Participar do Fórum é importante. Mas levando 28 pessoas por nossa conta?
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.