Boca fechada – Ao concluir o inquérito sobre o cartel metroferroviário que funcionou durante uma década em São Paulo (1998-2008), a Polícia Federal indiciou 33 investigados por corrupção ativa e passiva, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, formação de cartel e crime licitatório. O inquérito chegou à Justiça Federal na última segunda-feira (1) e até agora as autoridades conseguiram bloquear R$ 60 milhões dos acusados.
Da lista de indiciados constam empresários e executivos de multinacionais, servidores públicos e doleiros, todos acusados de participar do esquema criminoso que permitia que as empresas conseguissem contratos com o Metrô de São Paulo e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
De acordo com a PF, as duas estatais “foram usadas, foram vítimas” do conluio das empresas do setor. O relatório final da investigação evidencia que entre os indiciados estão João Roberto Zaniboni, que trabalhou na CPTM entre 1999 e 2003, e o consultor Arthur Teixeira, acusado de ser lobista e pagador de propinas.
Eleito senador pelo PSDB, o ex-governador José Serra, que depôs na condição de investigado, não foi indiciado, uma vez que a PF não encontrou conexão do tucano com o cartel, nem mesmo qualquer evidência que ligasse o político a crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O nome de Serra surgiu em meio ao escândalo no vácuo do depoimento de Nelson Marchetti, ex-executivo da Siemens. Marchetti afirmou aos policiais que o ex-governador teria advertido, em 2008, para que a empresa alemã não acionasse a Justiça para contestar a contratação da espanhola CAF, que negociou com a CPTM 384 carros ferroviários.
De carona no acordo de leniência firmado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), em 2013, a Siemens revelou que o cartel agiu durante pelo menos uma década, ou seja, nos governos dos tucanos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin.
Soltando a voz
Com base no acordo de delação premiada, a Polícia Federal, em outubro de 2013, tomou depoimentos de dois ex-diretores da Siemens. O delator Everton Rheinheimer disse que alguns deputados foram beneficiados pelas propinas pagas pelo cartel. Por conta do foro privilegiado de alguns dos acusados, os autos foram remetidos ao Supremo Tribunal Federal, a quem compete julgar os que gozam da prerrogativa por exercício da função.
A PF identificou movimentação financeira suspeita nas contas bancárias dos suspeitos, que acabaram indiciados nos crimes acima citados. A delação de Everton Rheinheimer foi confirmada pelas provas carreadas ao inquérito.
Silêncio estranho
Tão logo o escândalo do cartel metroferroviário surgiu no noticiário nacional, a postura do governo paulista foi negar os fatos, alegando que tudo não passava de jogo rasteiro do PT para tentar abocanhar o governo do mais rico e importante estado da federação.
Na sequência, o governador Geraldo Alckmin, em cerimônia no Palácio dos Bandeirantes, anunciou a criação de uma comissão externa independente para investigar o caso, mas até agora nenhuma informação consistente foi obtida do colegiado.
Vale destacar que independentemente da legenda ou da corrente ideológica, política não se faz sem dinheiro em qualquer parte do planeta. No Brasil, onde a corrupção é quase um traço cultural da nação, a política transformou-se em uma espécie de criminosa e dourada cornucópia que alimenta o bolso de criminosos com mandato ou indicados para cargos de confiança.
Em suma, Alckmin continua devendo uma explicação ao povo paulista, pois é fácil criticar os adversários políticos no âmbito federal enquanto o próprio é uma balburdia. A prevalecer essa tese esdrúxula, o Brasil jamais será passado a limpo, algo que deveria ter acontecido há décadas.