(*) Carlos Brickmann –
Estamos no único país do mundo onde existe jabuticaba, onde vivem ararinhas azuis, onde há micos-leões-dourados e pessoas empenhadas em extingui-los. Onde as cidades foram construídas perto de grandes fontes de água e as poluíram, para ir buscar água boa, a alto custo, em lugares distantes – e nem sempre encontrá-la. É o único país do mundo em que mãe é insulto e suadouro é crime.
Dilma, dizem as notícias de Brasília, aguarda a manifestação do Ministério Público (que vai demorar um pouco por causa das férias, e porque o procurador-geral está na Disneyworld, porque as pessoas presas e os processos em andamento podem esperar): Henrique Alves e Aguinaldo Ribeiro, se não forem denunciados no processo do Petrolão, podem ser ministros. É o único país do mundo em que o sujeito, se não for para o banco dos réus, vai para o Governo.
É o único país do mundo em que se nomeia uma autoridade e é preciso demiti-la menos de 24 horas depois, quando se descobre que está habituada a violar exatamente as normas da organização que foi escolhida para dirigir. O diretor do Detran do Distrito Federal, Antônio Fúcio de Mendonça Neto, foi nomeado na sexta, dia 2, pelo governador Rodrigo Rollemberg, do PSB; e caiu no sábado, dia 3. Devia mais de R$ 50 mil de multas de trânsito. Para livrar-se da conta, move na Justiça um processo contra o Detran. Simplificando, se continuasse no cargo, Mendonça Neto estaria processando o mesmo Detran que estaria dirigindo.
Como disse o poeta Olavo Bilac, imita na grandeza a terra em que nasceste.
Um seio de mãe…
No Governo Federal existe a Abin, Agência Brasileira de Inteligência, que tem ótimas condições de levantar passado e presente de candidatos a altos cargos. Diz seu site que “a Abin presta assessoramento à Presidência da República assegurando-lhe o conhecimento de fatos e situações relacionados ao bem-estar da sociedade e ao desenvolvimento e segurança do país”.
Poderia informar com precisão, por exemplo, que o ministro dos Esportes, George Hilton, não tem lá muita ideia do Estado em que tem sede o Flamengo. Ou que o ministro da Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo, não gosta de ciência e tecnologia. Mas para que servem as informações, se o objetivo não é funcionar, mas agradar partidos?
…a transbordar carinhos
O governador Rodrigo Rollemberg não tem Abin. Mas prometeu nomear técnicos. E deveria conhecer Mendonça Neto, seu companheiro de partido, e saber que a única relação que tem com o trânsito é ser multado e não pagar.
O jogo como ele é 1
Conta-se que certa vez o presidente Getúlio Vargas recebeu um político que lhe fez uma série de ponderações. Despediu-se dizendo: “Tu tens razão”. Em seguida, veio um adversário do político anterior, dizendo exatamente o oposto. Getúlio despediu-se: “Tu tens razão”. A filha do presidente, Alzira, chegadíssima ao pai, reclamou: “Cada um disse o contrário do outro e tu deste razão aos dois!” Getúlio, tranquilo: “Pois não é que tu também tens razão?”
O novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, joga nesse time. Elogiou a política econômica de Fernando Henrique, elogiou a política econômica de Lula, elogiou o ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci.
Só esqueceu de elogiar seu antecessor, Guido Mantega – mas disposição para agradar a todos tem limites, não?
O jogo como ele é 2
Desde que deixou o PMDB pelo PT, em 1979, Eduardo Suplicy foi o mais fiel dos petistas. Nunca recebeu nenhum cargo, nunca se queixou. O PT o encarou do mesmo jeito que seus adversários: um tipo pitoresco, para não ser levado a sério. E o próprio Suplicy contribuiu para isso, cantando no Senado, vestindo cueca vermelha por cima do terno para imitar o Superman.
Mas tem uma tese importante, que nunca foi bem estudada no Brasil por ter sido proposta por ele: a renda mínima. Inspirada no imposto de renda negativo do economista Milton Friedman, monetarista e um dos principais conselheiros do presidente americano Ronald Reagan, a Renda Mínima poderia, a custo menor, oferecer mais benefícios que a Bolsa Família.
Pois bem: numa das últimas sessões de 2014, o Senado aprovou o projeto da Renda Mínima, que aguardava votação há 15 anos. E? Numa última homenagem ao companheiro fiel, Dilma vetou o projeto. Em vez de socorrer os aliados feridos, o PT de Dilma ajuda a degolá-los.
Sem fantasia
As notícias sobre uma grave doença do ex-presidente Lula, que estaria se tratando em segredo, nada têm que as sustente. Não há citação de fonte; e não se explica como é que, considerando-se que se trata de uma moléstia devastadora, mortal na maioria dos casos, o doente não apresente sintomas clássicos como emagrecimento, cansaço extremo, postura recurvada.
Mais: ninguém se trata em segredo num hospital. O trabalho de dezenas de pessoas é essencial – radiologistas, médicos, instrumentadores, enfermeiros, anestesias, auxiliares de anestesia, operadores de equipamentos. Com tanta gente não há segredo que resista.
Tudo indica que as notícias pessimistas não sejam verdadeiras. E este é também – e é o correto – o desejo de quem não se deixa subjugar por ódios políticos.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.