“Minha Casa, Minha Vida”: calote chega a 21,8% dos contratos na faixa de renda de até R$ 1,6 mil

casas_04Fazendo água – A queda na renda do trabalhador brasileiro e o aumento do desemprego, consequências da crise que assola o Brasil, refletem na elevação da inadimplência no programa “Minha Casa, Minha Vida”, maior programa habitacional do país.

Números do Ministério das Cidades demonstram que os atrasos acima de 90 dias, em março, atingiram 21,8% dos financiamentos concedidos na faixa 1 do programa, destinada às famílias com renda mensal de até R$ 1.600. Para efeito de comparação, em abril do ano passado eram 17,5%.

É importante destacar que o grupo da “faixa 1” paga prestações mensais entre R$ 25 e R$ 80 por um período de dez anos, correspondendo a cerca de 5% do valor do imóvel que vão receber – o valor não pago pelo mutuário é arcado pelo Tesouro Nacional.

Já nas “faixas 2 e 3” do programa, que inclui famílias com renda de até R$ 5 mil, não foi diferente, entretanto, nesses grupos a inadimplência subiu de 1,9% para 2,2% nesse intervalo. Apesar de bem inferior ao da “faixa 1”, o dado está acima da média do mercado, que no mesmo período caiu de 1,8% para 1,7%.As perdas nessas faixas são assumidas pelo banco que concedeu o empréstimo ao mutuário, como em qualquer financiamento imobiliário.

O aumento dos atrasos entre esses mutuários levou a CEF a suspender, em fevereiro, o programa “Minha Casa Melhor”, linha de crédito para compra de móveis e eletrodomésticos com prestações de pouco mais de R$ 100.

“As pessoas de menor renda são mais suscetíveis a mudanças na economia. Com o aumento do desemprego e a inflação elevada, a tendência é mais inadimplência até essas pessoas conseguirem ajustar o orçamento”, afirmou Flavio Amary, presidente em exercício do Secovi-SP.

Lauro Gonzalez, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da FGV, por sua vez, revela que o cenário econômico favorece a inadimplência, pois essas famílias gastam mais com água, luz e condomínio. Há ainda a perda de renda com a inflação e o desemprego.

O professor, que é autor de estudos sobre o programa, ressalta que o nível elevado de atrasos na faixa de menor renda é um problema persistente e que reflete falhas no programa.

Gonzalez ainda afirma que o fato de as pessoas não pagarem uma prestação relativamente baixa, no caso da “faixa 1”, comprova algo que é verificado pela experiência internacional em microfinanças. “Quando se cobra um valor muito inferior à capacidade de pagamento, a pessoa enxerga aquela obrigação como um compromisso menos importante”, afirma.

Segundo ele, as pessoas priorizam o pagamento de outras despesas. Há ainda o fato de que, até hoje, não foram retomados imóveis na “faixa 1” por falta de pagamento. “As pessoas têm pouco comprometimento com o pagamento e pouco incentivo para fazê-lo.”

Ou seja, em um momento de aperto da renda o programa entra na lista de despesas a serem cortadas.

Gonzalez afirma que a nova fase do programa, prometida pelo governo para 2015, deveria considerar o aumento do comprometimento de renda com as prestações por parte dos que podem contribuir mais (quase 80% das pessoas estão adimplentes), em conjunto com medidas que estimulem o pagamento em dia, para que isso não se reverta em mais atrasos.

O presidente do Secovi-SP diz que a alta inadimplência na faixa de menor renda, mesmo em momentos melhores para a economia, já era esperada. Segundo ele, a nova fase do programa deve manter a política de altos subsídios pelo governo para cumprir o objetivo de reduzir o déficit habitacional nessas famílias. (Por Danielle Cabral Távora)

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