Demorou, mas aconteceu. A Polícia Federal colocou as mãos em Ricardo Murad, cunhado da ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e ex-secretário de Saúde. Na terça-feira, a PF informou que solicitou à Justiça a prisão preventiva de Murad, que horas antes fora conduzido de forma coercitiva para depor.
Alvo da Operação “Sermão aos Peixes”, Murad é suspeito de participação em esquema criminoso que desviou pelo menos R$ 1,2 bilhão dos recursos do Fundo Nacional de Saúde, destinados ao sistema de saúde pública do pobre estado do Maranhão.
“Já pedimos a prisão dele (Murad) no primeiro momento e insistimos nesse pedido. Cabe à Justiça decidir. Existe o pedido. A avaliação cabe ao Judiciário”, informou o delegado Sandro Jansen, coordenador do Núcleo de Operações da PF no Maranhão.
Durante o cumprimento de mandato de condução coercitiva e de busca e apreensão, policiais apreenderam na casa de Ricardo Murad vinte quadros, obras de arte e um veículo Toyota SW4. De acordo com as investigações, Murad exercia o papel de “mentor e comandante de organização criminosa” que desviou recursos destinados à saúde.
O delegado da PF responsável pela operação informou que a Justiça Federal expediu 12 mandados de prisão preventiva, 26 de condução coercitiva e 56 de buscas. A Justiça também decretou o sequestro de bens dos investigados e bloqueio de contas de empresas no montante de R$ 100 milhões e de pessoas físicas, inclusive Ricardo Murad, no total de R$ 10 milhões.
Segundo Sandro Jansen, dos R$ 2 bilhões destinados ao estado nordestino, a gestão de Murad na Secretaria da Saúde teria desviado 60% do montante. Parte do dinheiro desviado teria financiado campanhas eleitorais. “A hipótese não está descartada”, informou a PF. É nesse exato ponto que encontra-se o calcanhar de Aquiles do grupo político da Praia do Calhau, reduto da família Sarney.
O caso está sendo investigado pela Polícia Federal desde 2012, mas só agora foi desencadeada a operação “porque é uma Polícia que respeita regras”. De acordo com Jansen, a operação “é um trabalho lento, um trabalho de formiguinha, sob pena de praticar uma injustiça contra quem não tem envolvimento”.
Como sempre acontece nesse país dominado pela corrupção, Ricardo Murad, por meio de sua assessoria, informou que falaria sobre a “Sermão aos Peixes”, operação policial da qual é alvo. OS advogados do ex-secretário destacou que cunhado de Roseana [ ele é irmão de Jorge Murad] desconhece o conteúdo da investigação.
A Operação “Sermão aos Peixes” mobilizou 200 agentes e vários delegados da Polícia Federal, ao mesmo tempo em que fez José Sarney se movimentar nos bastidores para que os tentáculos da operação não alcançassem a filha, que jê é alvo da Operação Lava-Jato. Resta saber se Sarney, o velho caudilho, conseguirá evitar o pior, já que Ricardo Murad não dedica fidelidade canina a Roseana, pelo contrário. Afinal, o histórico da relação de ambos fala por si.
Sermão aos Peixes
O nome da operação da Polícia Federal é uma alusão ao “Sermão de Santo Antonio aos Peixes”, documento decorrente da imaginação, oratória e sátira do Padre Antonio Vieira, que toma vários peixes como símbolos dos vícios dos homens.
Com uma construção literária e argumentação notáveis, o sermão pretende louvar algumas virtudes humanas e, principalmente, censurar com severidade os vícios dos colonos. O sermão foi pregado três dias antes de o Padre Antonio Vieira embarcar, sem avisar, para Portugal. Todo o sermão é uma alegoria, porque os peixes são uma metáfora dos homens.
O primeiro capítulo do sermão é um prólogo aos homens. Padre Antonio Vieira serve-se do conceito “Vos estis sal terrae” (“Vós sois o sal da Terra”) para iniciar o sermão. Segundo Cristo, os pregadores eram o “sal da terra” porque, tal como o sal impede que os alimentos se corrompam, também os pregadores tinham a missão de impedir a corrupção na Terra.