Médico da Unifesp afirma que São Paulo deve ter “boom” de microcefalia em 2016

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É fato que São Paulo figurará – assim como ocorreu este ano em relação à Dengue – entre os Estados campões de casos suspeitos de microcefalia associada ao Zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti.

O vírus já se encontra circulante entre os paulistas e com a temporada de chuvas de verão à vista a metade de 2016 deve registrar um aumento de casos suspeitos.

Essa previsão é do neuropediatra Marcelo Masruha, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que examinou a primeira suspeita de microcefalia causada pelo Zika, em novembro, no Estado. O bebê do sexo masculino nasceu no Hospital Jesus, Maria e José, em Guarulhos (SP). Uma tomografia feita no dia 24 de novembro indicou perímetro cefálico de 28 cm – quando o padrão é pelo menos 33 cm.

Marcelo Masruha, que preside a Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil, disse acreditar que há uma tendência de aumento dos casos, uma vez que, com chuva e água parada, aumentam as chances de proliferação do mosquito, transmissor também da dengue e do chikungunya.

“Há uma tendência de haver um aumento de casos no verão, e, ainda assim, muitos só vão aparecer na metade de 2016”, alertou. Evitar a gravidez neste momento, até com esse prognóstico, seria recomendável – uma vez que o risco é maior nos três primeiros meses de gestação? “Isso é muito individual, mas penso que as pretendentes deveriam, sim, adiar um pouco a gravidez, e ver como o vírus se comporta – sempre há um risco”, ressaltou.

“O que me parece é que vão surgir ainda muitos outros casos, porque o Aedes está também em São Paulo – é só uma questão de tempo. Não dá mais para recomendar apenas às gestantes paulistas que não viajem por ora a Estados do Nordeste – o vírus já chegou a São Paulo, e as recomendações agora são as mesmas que às outras gestantes”, disse o médico.

Sobre o primeiro suspeito, Masruha afirmou que a mãe do bebê relatou ter apresentado, nos primeiros três meses da gestação, quadro clínico compatível com uma dengue leve – manchas pelo corpo, febre e conjuntivite leves e dores corpo. A descrição dos sintomas, somada aos resultados da tomografia, levou o médico a considerar alta a probabilidade de a microcefalia, nesse caso, se confirmar tendo o Zika vírus como causa secundária.


“É importante entender que o fato de o teste genético dar negativo para o RNA do vírus não descarta a doença, já que o Zika só é detectado no sangue nos cinco primeiros dias após a infecção – no caso de recém-nascidos, eles nascem meses após a infecção, o que dificulta a comprovação mesmo com a realização de teste genético”, afirmou Masruha.

O neuropediatra tem uma perspectiva pessimista em relação aos pacientes com microcefalia que precisem de atendimento na rede pública, no futuro, pois, segundo ele, há um déficit de atendimento frente à demanda de casos.

Entre os sintomas a serem tratados, de graus leves a graves, estão dificuldades motoras, de linguagem e de visão, além do risco de deficiência intelectual. Em casos mais sérios, por exemplo, a criança apresenta dificuldades para sustentar a cabeça, para sentar e para caminhar – o que passa por avaliação com o correr do tempo.

“Essas crianças têm que ser submetidas a terapias de reabilitação e só o tempo dirá se elas deram certo. O que aflige é saber que a rede pública hoje não tem a menor estrutura para absorver a demanda existente e a que virá – como presidente da SBNI, afirmo que o sistema público não está preparado para receber crianças com deficiências, de modo que temos uma dificuldade enorme para conseguir essas terapias. Quem dá muito suporte acabam sendo as ONGs e Oscips, como Apaes e AACD”, destacou.

Conforme Masruha, outro aspecto a ser acompanhado no futuro próximo, ainda sobre a reabilitação desses pacientes, é o que diz respeito à condição social dessas famílias.

“Preocupa muito o futuro sobre a microcefalia. Imagine milhares de crianças com um quadro neurológico desses, de uma vez, sem conseguir assistência? Além do impacto gigantesco no sistema de saúde, muitas dessas mães que poderiam estar trabalhando terão de deixar seus empregos para dar atenção a essas crianças. É um custo gigantesco para o país”, advertiu.

Ao questionado sobre o protocolo que o Ministério da Saúde lançou recentemente de atenção à saúde para microcefalia causada pelo Zika vírus, Masruha foi enfático: “No papel, está tá ótimo. A questão é sair do papel. As famílias conseguirão consultas e terapia, de forma regular, para essas crianças?”, finalizou.

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