Segundo o Banco Central, no ano passado a dívida dos brasileiros no rotativo do cartão de crédito cresceu bastante. O saldo dessa modalidade subiu 21,2% em 2015 e atingiu R$ 34,5 bilhões.
O ritmo de crescimento é praticamente o dobro do verificado no ano anterior, quando avançou 11,4%. Conforme o BC, o aumento pode ser explicado pela intensificação do uso do rotativo e a incorporação de juros – que atingiram o patamar recorde de 431,4% ao ano.
O uso do rotativo ocorre quando o consumidor não paga o valor integral da fatura. Se quitar alguma quantia entre o pagamento mínimo exigido e o total, o consumidor não é considerado inadimplente, mas fica sujeito a uma taxa altíssima de juros. O valor que restou é computado como um crédito novo, ou concessão. E, essa concessão do rotativo está crescendo a um ritmo bem menor, de 1,6%.
Esses dados não permitem quantificar o número de pessoas inadimplentes no cartão. Contudo, o descolamento entre o aumento da dívida (saldo) e a concessão indica que o juro recorde está criando um contingente de superendividados no país.
“Se o consumidor carregar a dívida do rotativo por muito tempo, e não trocá-la por outra mais barata, acaba ficando com um débito impossível de se pagar”, revela Marianne Hanson, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Desta forma, a inadimplência do rotativo é a maior entre todas as linhas de crédito disponíveis no País: 40,3%.
“A falta de conhecimento de outras opções acaba fazendo com que a pessoa opte pelo refinanciamento do rotativo”, ressalta Eduardo Tambellini, sócio da consultoria GoOn, especializada na gestão de risco de crédito.
Para escapar dessa espiral de juros, o consumidor pode procurar, no próprio banco, linhas de crédito mais baratas. O consignado, que desconta o valor das parcelas diretamente na folha de pagamento, cobra 28,8% ao ano pelo dinheiro emprestado, por exemplo.
Um levantamento da CNC mostra que, em janeiro, o cartão de crédito foi apontado como a principal dívida por 78,6% das famílias, o maior porcentual desde o início da pesquisa, em 2010. “Essa percepção dos consumidores se deve à preocupação com os juros”, diz Marianne.
A economista lembra ainda que a popularização do cartão de crédito tornou o instrumento um meio de pagamento e de bancarização, principalmente entre a camada mais pobre da população. “Observamos nos últimos anos uma redução da participação de outros meios, como os carnês e o cheque pré-datado”, anota Marianne.
Entre aqueles que recebem até 10 salários mínimos, o cartão é apontado como principal dívida por 80%, enquanto na camada superior, com renda de mais de 10 salários mínimos, o porcentual cai para 72,2%.
Contudo, a especialista alerta que os consumidores que escolhem essa alternativa para contas do dia a dia são potenciais tomadores de crédito no rotativo em momentos como o atual, de aumento de inflação, queda de rendimento e disparada do desemprego. “Os saldos do cartão de crédito à vista, em que não há incidência de juros, e os do parcelado ainda são maiores do que o rotativo”, afirma Marianne.
Os especialistas lembram que os consumidores devem evitar a aparente facilidade do rotativo. “As faturas destacam a possibilidade do pagamento mínimo, em geral 15% a 20% do total, sem explicações para o consumidor sobre as implicações dessa escolha”, afirma Hessia Costilla, economista da associação de consumidores Proteste.
Vale destacar que o forte aumento dos juros motivou a Proteste a encampar uma iniciativa para reduzir as taxas cobradas pelos bancos. Em dezembro, a entidade enviou um ofício ao BC sugerindo um teto para o juro do rotativo. Pela proposta, os bancos poderiam cobrar, no máximo, o dobro da taxa do Certificado de Depósitos Interfinanceiros (CDI).
“Um mercado de livre concorrência funciona melhor do que um em que as taxas são reguladas. Mas, em situações emergenciais como esta, limitar o juro do rotativo pode ser uma solução”, afirma Hessia. Ela cita exemplos internacionais, como o de Portugal, que adotou medida semelhante e obteve sucesso na redução dos juros.
O consumidor que paga pelo menos 15% da fatura do cartão não é considerado inadimplente, porém o saldo remanescente constitui crédito rotativo e fica sujeito à cobrança de juros altíssimos.
A operação está em atraso somente quando o pagamento é inferior a 15% da fatura ou se o pagamento parcelado deixa de ser cumprido. Para fins estatísticos, a inadimplência corresponde a atrasos superiores ao prazo de 90 dias.