No Brasil, onde a sensação de impunidade reina absoluta, políticos caem nas próprias armadilhas, como se não soubesse do risco. Mesmo que com atraso, a campanha à reeleição de Carlos Alberto Richa, o Beto Richa (PSDB), governador do Paraná, foi alçada à mira do Superior Tribunal de Justiça (STJ) por causa da compra de placas de madeira com dinheiro desviado da Receita estadual. A informação consta da deleção premiada de Luiz Antônio de Sousa, investigado na Operação Publicano.
O ministro João Otávio Noronha, do STJ, autorizou, em 11 de março passado, a abertura de inquérito contra Beto Richa no escopo da Publicano, que apura cobrança de propina por parte de fiscais da Receita paranaense. Parte do dinheiro imundo teria irrigado o caixa da campanha de Richa em 2014.
De acordo com as investigações, os integrantes do esquema cobravam propina para anular débitos milionários de empresas com o Fisco do Paraná. A vice-procuradora-geral da República, Ella Wiecko, requereu ao STJ a instauração de inquérito contra o governador do Paraná por lavagem de dinheiro, corrupção passiva e falsidade ideológica para fins eleitorais.
No acordo de colaboração premiada, Luiz Antônio de Sousa revelou um suposto “sistema de divisão de propina estabelecido na Receita Estadual paranaense”. O auditor “revelou que houve direcionamento de parte dos valores ilícitos captados por auditores fiscais para a campanha eleitoral de 2014 do então candidato à reeleição ao governo do Estado do Paraná, Carlos Alberto Richa, por intermédio de colaboradores ligados ao seu comitê de campanha, em especial Luiz Abi Antoun, pessoa com a qual teria relação de parentesco”, segundo o pedido de abertura de inquérito da Procuradoria-Geral da República.
Sousa citou o coordenador da Região Metropolitana de Londrina, da Secretaria do Desenvolvimento Urbano do Paraná, Victor Hugo Boselli Dantas e o ex-inspetor geral da Receita Estadual do Paraná, Márcio de Albuquerque Lima. Segundo o delator, Dantas ligou para ele e pediu que comprasse 300 chapas de madeira, que deveriam ser entregues no comitê de Richa, “localizado em frente ao Terminal Urbano de Londrina, próximo à Leste-Oeste com a Rua Bahia (onde antigamente eram instalados armazéns de café)”.
“O declarante comprou 200 chapas de MDF na empresa Compefort, tendo pago aproximadamente R$ 10 mil, não se recordando se tirou as notas em seu próprio nome (Luiz Antônio) ou em nome da sua empresa Masterinvest; que adquiriu também 100 chapas de MDF na empresa Complond, pagando cerca de R$ 5 mil”, relatou o delator.
“Marcio Albuquerque disse que depois acertaria com o depoente os cerca de R$ 15 mil tirados de seu bolso; Que a partir de agosto de 2014, o depoente repassava a propina arrecadada em Londrina para Marcio, em Curitiba, e ficou acordado que esses R$ 15 mil gastos pelo declarante com compras de chapas de MDF seriam compensados (retidos) nos repasses de propina que seriam efetuados para Curitiba; que o declarante acredita que Victor Hugo Boselli Dantas sabia de que forma o material (MDF) foi pago, ou seja, efetivamente com dinheiro de propina, pois, apesar de Victor Hugo ter feito o pedido de compra ao declarante, não pediu qualquer nota posteriormente.”
Ao pedido de instauração de inquérito, subscrito pela vice-procuradora Ella Wiecko, foi anexada a Nota Fiscal Eletrônica número 52969, emitida em 29 de julho de 2014, em nome de Luiz Antônio de Souza. De acordo com a Procuradoria-Geral da República, o papel “revela que parte dos compensados de madeira adquiridos, supostamente a pedido de Márcio de Albuquerque Lima e de Vítor Hugo Boselli Dantas, teria sido entregue na Avenida Arcebisco Dom Geraldo Fernandes, Londrina/PR”.
“A conta do Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB, Diretório Municipal de Londrina/PR, na rede social Facebook, divulgou, em setembro de 2014, convite no qual cita como endereço do “Comitê Beto Richa Londrina” o mesmo indicado na Nota Fiscal Eletrônica n. 52969, para entrega dos compensados de madeira adquiridos por Luiz Antônio de Souza, ou seja, Avenida Arcebisco Dom Geraldo Fernandes, 1320, Centro, Londrina-PR”, informa o documento da Procuradoria Geral da República.
Beto Richa, como sempre, nega qualquer irregularidade em sua campanha à reeleição, mas pessoa próxima ao governador paranaense disse ao editor do UCHO.INFO que o tucano não apenas sabia do esquema, como foi avisado em diversas ocasiões sobre o perigo que representava a ação criminosa que tinha lugar na Receita paranaense.
No momento em que as investigações alcançarem níveis mais elevados da estrutura criminosa, muitas figuras supostamente insuspeitas serão desmascaradas em questão de minutos. Não é novidade para quem frequenta o Palácio Iguaçu o caso de um colaborador de Richa que recebeu propina no valor de R$ 100 mil, valor deixado em um envelope pelo corruptor no banheiro do gabinete do corrupto.